CATHERINE
Paris, França.
Maio.
Beber chá verde no final de uma tarde de domingo nunca foi tão difícil. O líquido parecia entupir minha garganta um pouco mais a cada segundo, a cada palavra que eu lia daquela notícia através da tela do iPad da minha mãe. Era como, literalmente, tentar engolir uma realidade difícil de aceitar. Uma sensação no mínimo angustiante.
Bonjour, Paris
"Jovem dançarina da boate Plaisir morre vítima de um ataque cardíaco durante intervalo no trabalho.
Emma François, de 31 anos, se apresentava normalmente naquela noite até sentir fortes dores no peito, afirma o proprietário do local. Segundo ele, tudo aconteceu muito rápido, durante seu horário de descanso. A jovem foi levada às pressas para o hospital mais próximo já sem qualquer sinal vital. O incidente, que aconteceu no último sábado, foi descrito como uma fatalidade pelo médico responsável. 'Ela era muito nova, saudável e a dança era apenas uma de suas várias formas de exercício. É uma pena que casos desse tipo estejam acontecendo com tanta frequência com pessoas dessa idade', disse ele."
Eu li a notícia apenas uma vez, porque era o máximo que conseguiria suportar. Minha garganta ainda estava travada. O chá que eu tanto amava sequer tinha sabor. Minha única reação foi devolver o iPad para minha mãe, que me observava com atenção. Eu suspirei, pensando uma, duas, três vezes sobre o que dizer, sem conseguir encará-la de volta.
— Eu, ele, o médico, o proprietário da Plaisir, o jornalista que publicou a notícia e todos os políticos nojentos que estavam presentes naquele dia sabemos que não foi isso que aconteceu — contei à ela após o que parecia ser dois minutos de puro silêncio. — Não sei mais o que fazer, mãe. Está cada vez pior. Não posso compactuar com esse tipo de coisa. Essa foi a gota d'água.
— E o que você pretende fazer? — finalmente consegui olhá-la, mas a culpa estava me consumindo, por mais que soubesse que nada daquilo me envolvia diretamente.
— Sinceramente? Minha vontade é de fazer o certo, expor a verdade. Caramba, uma pessoa morreu por causa do Antoine. Isso é... Não sei como viveria fingido que não sei de nada. Não faz parte da minha índole, de quem eu sou.
— Você sabe que isso acabaria com a campanha dele para a presidência — não foi uma pergunta, mas eu assenti.
— Isso é o de menos. Esse país não merece ter alguém como Antoine como líder. Por outro lado, acabar com a campanha dele onze meses antes da eleição só iria me trazer mais dor de cabeça. Eu quero fazer o que deveria fazer, é claro, mas ao mesmo tempo sei das consequências que sofreria, e não são poucas.
— Acabar com a carreira dele significa romper o trato que fizeram, o que também envolve seu pai. Se estiver disposta a contrariá-lo... — minha mãe colocou a xícara em cima da mesinha e tocou meu joelho delicadamente. Quando eu a olhei, ela estava com um sorriso fraco no rosto. — Você tem que começar a pensar mais em si mesma, Catherine.
— Eu sei, mas parece que o máximo que posso fazer por mim nesse momento é pedir o divórcio, de novo.
— E ele não vai dar, de novo.
— Tem que ter alguma solução.
— Por mais que eu queira te ver livre disso, sei que o Jean não vai facilitar. Seu pai é cabeça dura e quando se junta com o Antoine não tem chantagem emocional no mundo que consiga pará-lo.
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Rêverie | ⚢
RomanceSophie Hayes tem três objetivos: construir seu império no mundo da moda, descobrir a identidade da mulher que há anos visita seus sonhos e ficar longe de romances. O último era o único que parecia alcançável e sob controle no momento, ou pelo menos...