E no princípio, quando a forma da terra já era tomada, as árvores já traziam em seu oscilar a fonte daquela, desconhecida por hora, que viria se tornar a vida. O mar já vinha com suas ondas, a derribar tão puros grãos sobre o chão, levando consigo em seu balançar. O céu, que a tão pouco criado fora, a brilhar, com compleição aquele que nomeou sol, era dia, o que nomeou luz, que deu o fim aquilo que nomeou trevas. Eram seis os dias contados, de toda sua obra, seu descanso estava por vir. Os caminhos sendo escritos por suas mãos sagradas, letra por letra, já estava traçado, e assinado, era fatídico. Foi então criado o homem, de Deus fazia sua imagem e semelhança, moldado do barro, para ser seu servo, que de grandezas desfrutará. Mas ele sentiu-se só. Era vazio. Tão oco quanto exatos seis dias posteriores. O ecoar de seu sofrimento percorria pelo paraíso.
Ele se compadeceu. Da costela daquele de mesmo aspecto, um fio foi arrancado. Sequer pode gritar de dor, pois essa tal por ele era desconhecida. Era bom. O arrancar de um pedaço de si, para ser concedido sua metade. Ele não estaria só. De si foi feita aquela que chamou mulher. Ele a olhou. Deleitando-se em suas curvas. Eram diferentes. Não só de corpo. Pode notar, não eram uma soma, um conjunto de um todo. Era única. Foi dele a ruína.
Desde o princípio se sucedeu. Não foi de demora alguma, seu desejo a sucumbiu. Levando junto aquele que permanecia em sua destra. O que havia de juntos o reino povoarem. O seduziu com as palavras. O deixando embriagado com seu aroma. Era venenosa, como a serpente, cuja possuía letal veneno, que se misturava com seu doce perfume. Dos homens a ruína. O começo, o meio e o fim. Os caminhos tortuosos, que em curvas, jamais um homem seria capaz de negar por lá passar. Era dito. Era feito. Já era fatal.Lembro-me bem dos concelhos de Padre Nelson, que em minha juventude pude ouvir, e os segui, com devoção, sem sequer uma vez falhar. “Longe deves se manter, das mundanas, pois sobre elas, paira o nefasto, o profano já as corroeu, não há mais salvação. Se sustente no longínquo caminho, remoto a perdição, onde se quer seus gritos sedentos o poderão perseguir.”
Eu já não era ingênuo, já me era tempo de ter conhecimento, sobre o bem, e sobre o mal. Poderia eu, os dezesseis, não ter entendido tais palavras. Mas agora, era de meu total condão. Finalmente eu as pude compreender. Desvendar seus mistérios.
A razão por trás da ameaça, que os homens afligiam, que os fazia o sentido perder. Prostrados, de quatro, como uma besta rendida, que passará de predador a presa, prestes a ser devorado. E o pior. Não havia temor. Havia gana, tal furor, que fervia a alma, que aumentava a libido, vontade de satisfazer o que tanto ansiavam, saciar o apetite. Ser mastigado entre os dentes. Por unhas arranhado. Ter seu sangue feito vinho, a ser engolido por tais lábios pecaminosos, que aplacaria sua sede, mas faria então mais querer, pois tal criatura, mulher, era insaciável, então da carne faria seu manjar, mas ainda não viria seu sustento. De mais necessitava.
Eu bem o sabia. Pois agora. Isso eu sentia. Em minha pele. Queimando, ardendo, me dilacerando, de dentro a fora.Sua garganta, que sequer um som emitia, me causava tormento. Eu ansiava por sua voz. Meus ouvidos já podiam prever o que de sua boca sairia. Mas a demora me martirizava, de dentro a fora, meu corpo já entrava em combustão, toda química pelos cientistas estudada trazia pouco conhecimento para o que acontecera com meu corpo, era desconhecido a todos peritos de todas as áreas, pois eu suava, sentia a descer por minha testa, apesar da ventania acompanhada de tempestade que de fora provinha, a se jogar contra a janela, como se buscasse amparo, como se nos perseguisse, se soubesse o que estava havendo comigo, e quisesse me salvar, pois eu sentia o quarto inteiro a vibrar, junto a meu corpo. Lubrificado por sacrilégio, sentia, cada centímetro de meu corpo, meu baixo ventre, ele pulsava, descompassado era como oscilava, da mesma forma que o coração, que apertado doía, eu me deixei queimar.
-Eu não posso esquecer, fingir-me de louca, que não lembro, e deixar para trás. Você me pôs como o demônio que havia de exorcizar! Perante toda Belo Horizonte, eu era Hilda Furacão, o Satanás a ser enclausurado, pelas mãos de um Santo. Me diga, Santo, por quê? Isto me convém saber! Se quer que aqui eu permaneça, para seu ego inflar, proteger a Camélia como sinônimo de toda sua benevolência, então antes diga a mim!-
A rouquidão ecoou. Quebrando meus pensamentos. Vidros dentro de meu ser se estilhaçaram, me rasgando, me deixando no chão. Me cegando. Cacos sobre os olhos. Eu sangrava. Lágrimas amargas. O fél mais puro. Me torturando. Qual razão a levava me destruir? Ela me matava. Suas palavras sobre mim caíam. Tão dolorosamente. De me mover eu não era capaz, pois cada uma de minhas juntas eram postas em chamas. De minhas veias jorrava, minha vida.
Sufoquei por fim. Em meus próprios devaneios. Assim era pela noite. Um louco. Ainda mais sem a lua, que a chuva não a permitia exercer sua função, ser bela, era esse seu dever, tal como ela. O “Sim!” engasgado em minha garganta, o grito que de mim ecoava, a percorrer pelas paredes, que a atravessariam, era mudo, mesmo premeditado, que surgiu antes mesmo de suas palavras chegarem a mim, já era pronta a resposta, sempre fora. Maldição! Eu sentia isso me esmagando, algo de mim se extinguia. Eu não sabia dizer o que era. A sanidade. Era a resposta mais plausível. Que continha todas respostas por trás de meus atos.
Eu já não mais beirava aquela tal insanidade. Por certeza não. Sequer perto a seu começo eu estava, aquela que a alma pesava. Não. Pois nela eu mergulhava. Submerso, de corpo e alma, despido, eu bebia da fonte da iniquidade, ela saciava minha sede, mas eu bebia mais e mais, pois era proveitoso, me banhava em desvaneios, e sequer me afogava em tamanha profanidade, da perversão fiz meu lar. A maldade estava me sucumbindo. Me devorando. Eu sentia. Estava chegando. Algo novo rompia em mim. Eu não estava mais em meu juízo. Algo se apoderava. Eu sentia!-Eu te juro, apesar se juras serem pecado, é minha promessa, te respondo com total verdade, não há nada a esconder de ti. A resposta que busca eu não tenho! Pois eu não sei. Eu não sou Santo. Eu pude realizar, não sou aquele que a chamou de Satanás, a tentar abrandar as perversões, não sou ele! Eu posso muito bem me lembrar das palavras proferidas, por voz tão semelhante a minha, posso recordar de suas respostas, posso recordar da cruz contra a ti, que você segurou, a forçando sobre meu peito. Lembro de tal temporal, semelhante ao de hoje, avassalador. Mas não lembro de ser eu! Do momento que seu sapato achei, que o vi, caindo de seu pé enquanto para longe você se afastava, sem sequer se dar pela ausência, eu não exitei! Eu o peguei! Foi então que pude ser eu! Pois em nenhum momento que vivi em toda minha existência, era eu de verdade. Eu nasci aquele dia, naquele segundo. Foi ali que me tornei quem sou hoje. Então não venha me fazer perguntas sobre quando eu sequer existia.-
Se na loucura eu já me submergia. Então, por qual razão eu evitaria de nela nadar? Eu queria por lá ser mergulhado. Queria ser afogado! Pelas mãos dela. Que minha cabeça ela segurasse, eu sequer por vida lutaria, apenas me deixaria ser afundado. O milagre estava ali. A me salvar. Então proveito seria tirado. Eu precisava. Era necessidade. Eu era um drogado, que em alucinações vivia. Mas ela era a minha epifania. Que os mistérios da origem da lucidez solucionava. Me causava abstinência, que poderia me matar. Mas eu queria. Me abster não seria possível. Eu estava viciado.
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Notas da autora:
Sinto que devo satisfação a vocês que acompanham a fic. Eu tento ao máximo postar com maior antecedência possível, mas recentemente está difícil manter a mesma frequência. Tentarei postar toda a semana, mas não diariamente como eu costumava fazer.
Gostaram do capítulo? Poucos diálogos, mas ele foi necessário para a percepção do Santo sobre ele mesmo. Espero que tenham conseguido compreender a proposta que pus na escrita.
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A meretriz - Hilda Furacão
FanfictionAlgo sombrio, mortífero, algo atroz pairava sobre sobre aquela mulher, foi o que me contaram... Algo desconhecido por todos, uma nova força maligna, ávida pelo sangue dos homens errantes, fracos, cuja almas da salvação divina necessitavam. Pois por...