Capítulo 17

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A dor não sente vontade alguma de meu corpo abdicar, ela faz dele sua morada, nele ela encontra seu abrigo, sendo o resultado de minha noite mal dormida, talvez fosse então punição por aqueles pensamentos, pondo em evidência, sem sequer uma discrição, era visível a todos olhos, era a cura da cegueira, para contemplarem a cessação, a minha senda, caso isso se meu coração em tua amargura e egoísmo, resolvesse por então meu corpo abdicar, se separando do resto, onde então eu viveria fadado a ser apenas um corpo.  A voz em minha mente, que já se revelava não ser silenciosa, pelo contrário, era barulhenta, gritos tão áspero que me ensurdeciam, um eco por toda extensão de meu corpo, tão ardente ouvir o som, tão cruel, que sequer pareciam que era eu a o emitir, o culpado, a sentença já viera mais rápido que eu poderia imaginar, eu era merecedor.

Qualquer agonia, todo sofrimento que os Céus a mim ordenassem como castigo eu deveria penar e pagar, mesmo que meu próprio sangue isso custasse. Tudo que de mim fosse tomado, eu deveria agradecer a misericórdia Dele de ainda me reconhecer como seu filho. Eu deveria dedicar cada suspiro meu a Ele, todo meu sangue, meus ossos e minha carne, agradecendo que, mesmo impuro, vil e profano, como era, não fui banido de ver a verdade. A pura e louvável verdade que apenas meu Deus me fazia ter conhecimento.

No chão frio e duro de pedras, como um prisioneiro miserável enclausurado, eu estava, com tão fino lençol sobre meu corpo, naquela madrugada chuvosa, fria e agourenta que agora se cessava, pouco a pouco, indo embora como se não estivesse, com ela, levando parte de minha alma, aquela cruel, que caía a horas consecutivas por Belo Horizonte, a se despedir, certa dor era gerada, melancólica que trazia consigo tamanha angústia, a se juntar com o aluir de minha alma, ela estava me fazer companhia em madrugada, como um fantasma que fica atrás da porta, que com o tempo, vira quase uma peça essêncial do cômodo, um luto viria com sua partida, pois juntamente de si, levaria ela, aquela, tão formosa quanto um Renoir, a pureza de cada pincelada, uma alma livre como cada gota de tinta sobre a tela, mas tão excêntrica quanto um Michelangelo, os mistérios espalhados por toda a capela sistina, trazendo pensamentos para os adoradores da arte. Eu era um. Já não podia negar. Eram esses, os pensamentos os quais durante a penumbra tomaram para si toda minha mente. Me consumiram, como os vermes hão de fazer com todos que para o descanso eterno sejam enviados. Mais do que nunca de sua magnitude estava me tornando um devoto. Um pecador contra meu Deus. A arte era capaz de transformar um homem outrora são, tão certo de seus princípios, em apenas mais um dos lúdicos, um sedento por prazer, da mesma maneira que uma mulher. Já uma mulher que era a arte pura, ainda mais agrura para o ser, essas eram piores que qualquer demônio que no fogo habitavam. Eram como o Flautista de Hamelin, em um dia sagrado levando ao desaparecimento eterno a alma de inocentes, a fazer teu chamado, meus ouvidos a contemplar.. Uma sereia, capaz de enfeitiçar qualquer homem, o fazendo perder o juízo, afogar-se em pecado e achar que afoga-se no prazer. Minha mente então fervia. O desejo e a culpa virando apenas um. Por isso, não pude  ser delicado ao dizer:

— Levante! A noite está se despedindo, junto da chuva, sua hora é chegada. Você tem que ir, agora! Acorde!— Me pus de pé, antes mesmo de a frase terminar, para tocá-la. Minha mão em seus braços foram levadas, sentindo a pele quente ao meu toque, macia, dedos que eram meus se enroscando em teu corpo, no ápice, pus teu corpo, a ajudando a levantar.

Teus olhos se abriam, lentamente, avermelhados pelo teu sono, com tamanha dificuldade, desejando fechar-se, ele oscilava, a tentar levantá-los para mim. Os cilios espessos como a pesar.

—Já amanheceu?— A voz sonolenta me dissera, emaranhada em teu desejo de deixar teu corpo em repouso, eu podia ouvi-lá tentando conter um bocejo, teu corpo pendeu-se para trás, se pondo a despertar, cada centímetro de teu corpo, pude ver, pequena parte do pescoço descoberto, mesmo sobre a fraca luz que da janela nascia, a chegar do leste, emaranhada a escuridão da noite que estava para despedir-se. Seus braços se erguiam para cima, a alongar, pude ouvir o estalar de seu corpo, o som se tornava cativo aos meus ouvidos, de tal forma então, igualmente periculoso. O efeito que causava em mim era veneno legítimo, puro, viscoso, ardiloso, que rompia minhas entranhas.

Atordoava minha mente. Me levava ao Céu e depois me condenava diretamente ao Inferno. Eu a contemplava com terror em meus olhos, não por medo de si, mas por saber que minha alma estava sendo alterada. Por ter conhecimento de que depois dessa noite, eu deveria agir como um bom católico na quaresma, penitência, jejum...Qualquer coisa que me limpasse. Do que? Eu não saberia dizer. De mim mesmo, do que sentia, do quão humano eu me tornava, tão distante dos pensamentos do que outrora havia sido uma criança destinada a Santidade.

—Você precisa ir, agora, saia!

Nem por outro segundo poderia durar, mas mesmo dessa forma, já estava eternizado em mim. Eu temi. A pequena fração de meu todo, que de mim se escondia nos escombros da minha alma, a se mostrar presente, como furiosa, por tanto tempo contida, de tua jaula escura e fria ela desejava sair. Eu não temia Hilda Furacão. Era eu. A causa de meus delírios, eu já não podia me são, se por sequer algum dia eu então fui, ou apenas era bom em viver em mentiras, essas não tinham se mostrado tão difíceis de viver, até agora. Meu corpo doía, ele queimava, de dentro a fora. Era preciso, ela tinha que ir, naquele instante. Era como se, um minuto a mais, e seria irreversivél.

Tudo em minha mente se tornara desconexo. Nada mais fazia sentido. A dor tomava conta dos meus ossos. As palavras? Tão ríspidas direcionadas a mim, que eu jamais pude responder. Diálogo indecifrável, pois me perdi em mim. Foi o momento que eu deixará de ser eu. Ela partiu. Tão forte quanto sua chegada, foi sua saída. Tão irada. Sem a sua presença minha mente em alívio pode gozar, em teus gemidos sentiu a liberdade, onde pode ouvir-se ecoar dentro de minha cabeça “Para todo sempre”.

Mas ela mentia, eu já não podia confiar em meus próprios julgamentos, que se mostravam cada vez mais a falta de prudência. Eles não pareciam mais meus. A noite que em minha cabeça se tornou apenas uma memória dela irada, a partir, em meio a névoas. Não era nossa despedida. Eu precisava, me despedir.

O som da porta ecoou. Em uma batida tão pouco silenciosa, deixando a ira do furacão, a revolta temperada de teu coração. Ela partiu. Me deixando a imaginar que nunca mais a veria. O adeus que nunca seria dito a se engasgar em minha garganta, como um veneno, eu sucumbi. Ela se foi.

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Notas da autora:

Olá a todos que não desistiram da fanfic, mesmo com o atraso da atualização. Necessito da opinião sincera dos que ainda permanecem lendo.
Ainda estão gostando? Ainda sentem vontade de ler? Pois se a resposta for sim, vou cumprir minha promessa de atualizar com frequência, apesar de toda minha dificuldade, correria com vestibular, cursinho etc.

E se ainda estiverem esperanças em mim e em minha escrita, prometo que o próximo capítulo animará muito vocês rsrs. Especial de Carnaval atrasado vem.

A meretriz - Hilda Furacão Onde histórias criam vida. Descubra agora