Capítulo 9

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Capítulo nove:

Quando Anita se acalmou, ainda nos braços da escrivã, permaneceu por um tempo calada, não esperava reencontrar a mulher que destruiu sua vida, não queria vê-la novamente, não precisava eu sua concepção, suas mãos ainda trêmulas se agarravam ao casaco que Verônica vestia, entretanto com menos força, respirando fundo a delegada um pouco a contragosto - não que fosse admitir - se afasta da outra mulher, ainda de olhos fechados, mas mantendo suas mãos juntas.

–– Eu nunca imaginei encontrar ela novamente –– Anita fixa seu olhar nas mãos –– talvez quando eu cheguei naquele lugar eu tinha ainda uma pequena esperança de que ela se arrependeria, que pelo menos não fosse tão cruel a ponto de vender a própria filha, eu não era fácil, tenho noção disso, mas porra, foi só aparecer alguém oferecendo dinheiro que ela me vende? –– Verônica tem um lampejo dos olhos azuis marejados, fazendo-a sentir um aperto no coração.

–– Mesmo que você fosse a pessoa mais fácil do mundo, isso não daria a ela o direito de fazer isso com você, nunca daria Anita! Me arrependo de quando falei com ela não ter dado um tapa na cara daquela mulher! –– A escrivã consegue arrancar uma risada fraca da loira.

–– Você está brincando –– a delegada finalmente encara os olhos de Verônica –– você está brincando, não é Verô?

–– Não, nenhum pouco, é a mais pura verdade! –– Verônica observa fascinada como pode ser viciante a risada de Anita, fazendo com que ela abra a boca para perguntá-la de algo, porém antes de ser vocalizado a escrivã desiste.

–– Pode falar Verô.

–– É... você acha que, esquece, deixa pra lá.

–– Verônica, começou termina entendeu? –– A escrivã sente um arrepio lhe percorrer, fazia tanto tempo desde a última vez que escutou este tom de voz de ordem sendo usado por Anita que se desacostumou.

–– Você costuma pensar se existe ainda uma parte sua que guardou uma porcentagem da personalidade da Karina?

–– Eu não sei, sendo sincera eu voltei a pensar um pouco nessa parte da minha vida quando você disse saber meu nome, era a primeira vez em muito tempo em que eu não carregava sozinha essa parte da minha vida entende? Me tiraram tudo Verônica, tiraram meu direito de escolha, tiraram minha personalidade, foram podando partes de mim até eu me encaixar no que eles queriam –– o olhar de Anita permanecia encarando a rua pelo vidro do carro, perdido, fazendo cintilar o azul de seus olhos pelas lágrimas que insistiam em se formar, –– até não sobrar nada daquela menina que eu era, –– a primeira lágrima cai assim que a loira desvia seu olhar fixando-o nos castanhos de Verônica, fechando-os ao sentir as mãos macias da escrivã encostar em sua bochecha, passando os dedos pelas lágrimas que caiam. –– Se sobrou algo daquela menina talvez esteja tão enterrado que nem eu consiga revirar.

–– Como você era antes de tudo? Se não quiser responder tem todo o direito, nem sei por que tô te perguntando isso tudo, desculpa! –– Verônica abaixa os olhos respirando fundo, não queria pressionar Anita com tantas perguntas.

–– Não precisa pedir desculpas Verô ––Anita leva sua mão até a de Verônica, acariciando-a –– é sério! E... bom, eu sempre fui arisca, isso não tinha jeito, eu costumava gostar de ajudar uma senhora em específico que morava perto de mim, não lembro o nome dela, mas eu ficava ajudando ela a ir no mercado, em casa, tudo que me impedisse de voltar para aquele lugar com aquela mulher, eu era boa –– a loira ri fracamente –– não totalmente, eu ainda era muito grossa com as pessoas, mas eu era, ironicamente eu era.

–– Você é boa Anita, caso não fosse você não estaria aqui me ajudando.

–– Eu não estou te ajudando, não vá se achando escrivã. –– a delegada sorriu de lado.

Maybe there are colors in my lifeOnde histórias criam vida. Descubra agora