Shy

451 85 11
                                    

Kath estremeceu. Lin percebeu que ela não reagira ao toque dela em seu seio e a fitou pensativa. Ela estava pálida, com sombras escuras sob os olhos e o cabelo escuro molhado de suor. Aparentava de fato estar exausta, e não apenas pela dificuldade física do trabalho de parto e dar à luz, mas pelas horas de ansiedade que sofrerá.

No entanto, havia algo brilhando em seu rosto e em seus olhos enquanto contemplava o bebê, algo que permaneceu quando ela a fitou devagar.

— Conseguimos.

Murmurou Kath, e sorriu. Lin olhou para ela, viu o amor resplandecendo no rosto como um farol, e a atração que sentira por ela desde o início de súbito se solidificaram em seu interior com um doloroso aperto. Algo nela lhe fazia desejar abraçá-la, protegê-la de tudo o que havia colocado aquela cautela e desconfiança em seus olhos.

Queria que ela a  fitasse com o rosto transbordando de amor. Atordoada, ergueu-se. Enfim havia acontecido, quando menos esperava, quando havia deixado de procurar e com uma mulher que simplesmente tolerava a sua presença ali devido às circunstâncias.

Ela não tinha outras coisas em mente no momento. Lin podia afirmar que Kath Armstrong não queria nada com ninguém, qualquer pessoa.

Mas, mesmo assim, o cupido a flechou de modo inesperado, como sua mãe sempre lhe avisou que aconteceria. Ensinar Kath a amar não seria fácil, mas olhou para ela e para o bebê em seus braços e soube que não desistiria.




(...)



Kath não se recordava de ter se sentido tão exausta antes. Seu corpo pesava feito chumbo e a mente parecia flutuar, desconectada do mundo físico.

Somente o bebê nos braços parecia real. Estava vagamente consciente das coisas que Lin lhe fazia, da incrível segurança e delicadeza de suas mãos, mas era como se ela as estivesse fazendo em outra pessoa.

Até mesmo a picada dolorosa das suturas não a despertou, tampouco a massagem firme em seu ventre.

Simplesmente permaneceu deitada, cansada demais para se importar. Quando por fim se encontrava limpa, de camisola, e a roupa no colchão havia sido trocada, ela suspirou e adormeceu com a rapidez de uma luz sendo desligada.

Não fazia ideia de quanto tempo se passara antes de Lin acordá-la, sentá-la com cuidado e ampará-la com o corpo para que ela amamentasse o bebê.

A médica  literalmente estava sustentando a ela e à criança com seus braços. Kath apoiou a cabeça em seu ombro, sem forças para levantá-la.

— Sinto muito. Não consigo ficar sentada.
— Está tudo bem, querida.

Respondeu, a voz macia penetrando-lhe a mente e acalmando todas as suas preocupações.

— O trabalho foi árduo. Você merece descansar.
— O bebê está bem?
— Está comendo feito uma draga.

Respondeu, a risada ocultando a preocupação, e Kath voltou a dormir assim que ela a deitou de costas no colchão.

Nem sequer sentiu quando lhe tirou o bebê dos braços para lhe abotoar a camisola. Lin sentou-se por um longo tempo, embalando a menina nos braços, que estava perigosamente abaixo do peso, mas parecia forte para o tamanho. Respirava por conta própria e mamava que eram as duas maiores preocupações de Lin, mas ainda assim era muito pequena.

Estimou-lhe o peso em cerca de dois quilos, pequena demais para ser capaz de regular a própria temperatura, porque não contava com a gordura necessária no corpo.

Por esse motivo, agasalhou-a muito bem e pôs mais algumas toras de lenha na lareira, mantendo a temperatura em um ambiente mais quente do que o confortável. Seus tranquilos olhos cor de jabuticaba brilharam ao fitar o rosto minúsculo, dominado pelos enormes e vagos olhos mel da recém-nascida.

Prematuros tinham uma fisionomia indecifrável.

Em seus rostos de boneca faltava à gordura dos bebês fofinhos, o que revelava uma estrutura facial magra e frágil. Mesmo assim, podia afirmar que a menina seria bonita, com as feições da mãe e até o mesmo o cabelo vasto e escuro. Cada um de seus pequenos e frágeis pacientes lhe despertava carinho e preocupação, mas aquela pequena e obstinada lutadora lhe tocara a alma. Talvez porque, ao olhá-la, via a mãe nela, porque Kath era uma lutadora também.

Tinha de ser.

Passar por uma gravidez sozinha não era fácil, como era óbvio que ela o fizera. E quando entrara em trabalho de parto prematuro, em vez de permanecer ali, onde estaria mais segura, arriscou a própria vida em um esforço de chegar à clínica, onde o bebê poderia receber cuidados médicos.

Não podia deixar de se perguntar sobre a ausência do sr. Armstrong e, pela primeira vez na vida, sentiu o ciúme queimando-a por dentro, porque o homem desconhecido fora, pelo menos por algum tempo, o amor de Kath.

Lin também se perguntou o que havia acontecido para gerar aquela desconfiança nos olhos dela e erguer as barreiras em sua mente, que era óbvio que existiam. Podia senti-las.

Isso a fazia desejar abraçá-la, embalá-la e confortá-la, mas sabia que ela não receberia de bom grado a proximidade. O bebê guinchou, e ela olhou para baixo e notou que seus olhos estavam abertos e a menina lhe fitava com uma expressão intensamente concentrada para alguém com uma visão tão precária.

Ela riu e a apertou mais contra o peito.

— O que há querida? Com fome de novo?

Devido ao tamanho reduzido do seu estômago, ela necessitava de mamadas mais frequentes do que um recém-nascido normal. Lin olhou para Kath, que ainda dormia pesadamente.

Uma ideia começou a se formar em sua mente. Uma de suas características, que muitas vezes fizera sua mãe se sentir como se estivesse enfrentando uma força irresistível, em vez de uma criança, era a sua capacidade de estabelecer metas de longo prazo e não permitir que nada a desviasse do curso.

Quando queria algo, corria atrás. E queria Kath. Sentiu-se atraída por ela no instante em que a viu, uma atração provocada pela misteriosa, mas
inegável reação química, que fazia os animais se acasalarem e procriarem. Seres humanos não eram exceção, e sua libido era saudável. A gravidez de Kath não havia enfraquecido sua atração; pelo contrário, a aumentara de uma forma primitiva. Então, durante o trabalho de parto e nascimento, a atração mudou, transformou-se em uma força tão emocional quanto física. As duas haviam formado uma equipe, apesar das reservas de Kath.

O bebê se tornara dela também.

Era responsável por sua vida, seu bem-estar.

A menina saíra do corpo quente da mãe com a ajuda de suas mãos.

Ela a viu coroar, segurou-a, riu de seus berros furiosos e a colocou no seio da mãe para mamar.

Ela era, inegavelmente, sua. Seu objetivo era fazer a mãe do bebê ser sua também. Desejava que Kath a fitasse com o mesmo amor terno e feroz que olhara para a filha. Queria ser a appa do próximo filho que crescesse em seu ventre. Queria fazê-la rir, apagar a desconfiança em seus olhos, fazer seu rosto brilhar de felicidade.

Não havia mais dúvida: precisava se casar com ela. O bebê guinchou de novo, mais exigente dessa vez.

— Tudo bem, vamos acordar a mamãe.

Prometeu.

— Você me ajudará com meu plano, não é? Nós duas cuidaremos tão bem dela que a faremos esquecer que um dia foi infeliz.

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.
Hero For ChristmasOnde histórias criam vida. Descubra agora