Sentimentos Confusos

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"Se não dissesse que não era nada
Se eu tivesse dito que era você
Será que haveria um "nós"?
Além de um "eu e você"?"
(Rafa Moggi)

Diego~

"MAS QUE MERDA! AMAURY LORENZO, EU JURO QUE VOU TE DEIXAR AQUI." Gritei, enquanto estapeava a porta do seu quarto, a segunda-feira finalmente havia chego e eu odiava atrasos, por isso ontem, antes de finalmente pegar no sono, calculei mais ou menos a quantidade de horas que levaria para eu tomar um banho, me arrumar e fazer o café da manhã, não arriscaria deixar a
Amaury chegar perto da minha cozinha, já deixando minha roupa e meus materiais prontos também no dia anterior, claro que o mané do meu melhor amigo não fez nada disso e tinha o fato dele dormir como um urso ibernando, isso me irritava em graus elevadíssimos, eu tinha quase certeza que se socasse a madeira com mais força, receberíamos uma multa por excesso de barulho, o maior iria ter que pagar.
"Que inferno!" O rapaz disse, abrindo a porta do nada, com uma rapidez invejável, sua mão fechada em meu pulso, ainda no ar e pronto para formar um buraco na madeira da porta alheia se fosse necessário. Observei seus olhos inchados pelo sono e tentei me livrar do seu aperto, puxando meu braço para trás, o maior se aproveitou disso para me puxar também, porém contra seu peito quente, nossos corpos colando um no outro, estreitei os olhos.
"Tá nervosinho?" Ele perguntou com um sorriso sacana, que nunca era direcionado a mim, apenas as garotas que ele gostava de se esfregar por aí, salvo, claro, as circunstâncias onde ele queria me ver irritado, era um hobby, ele dizia que eu parecia um pinscher. "E cheiroso..." Ele sussurrou, sua respiração batendo em minha bochecha, o cheiro de hortelã vindo de seu hálito denunciava que o maior já havia levantado, sorri, Amaury murchando um pouco, ele sabia por minha expressão que havia perdido a brincadeira.
"Bom, você já pegou o estojo, só falta vestir uma roupa." Falei, me referindo a sua ereção matinal, que estava vergonhosamente encostada em meu estômago, pela diferença de altura e a falta de roupa, afinal, o rapaz tinha um Q de nudista, sempre de cueca ou sem camiseta por aí, ele me afastou, e cobriu o membro marcado no tecido com as mãos.
"Você não presta." Dei de ombros.
"Dez minutos pra você aparecer naquela cozinha, completamente pronto, ou eu vou voltar." Falei, dando as costas como se nada tivesse acontecido, sorri um pouco ao lembrar da expressão envergonhada no rosto do maior.
"Pipipi, popopo..." Ele sussurrou baixinho, fazendo uma voz fina e enjoada, resolvi ignorar, com fome de mais e medo de me atrasar, para continuar uma discussão à toa.

"Diego... Você sabe que é lindo e vai fazer seu feitiço nas pessoas nos primeiros cinco minutos naquela sala." Eu encarei nossas mãos juntas, o prédio da faculdade, grande e imponente a nossa frente, me deixando um pouco ansioso para o que viria, coisas novas que envolviam relações pessoais me deixavam nervoso. Minha família dizia que eu era uma borboleta social, mas era apenas uma camada pra esconder o medo que eu tinha de não conseguir fazer amizades e acabar ficando sozinho, meu coração um pouco acelerado de mais e minhas mãos suando, a única coisa que me confortava era saber que Amaury estaria lá comigo, para o que eu precisasse. "O que precisar, é só me chamar." Ele disse, em uma das várias vezes em que parecia poder ler minha mente, nós sorrimos e em seguida olhamos para o lado, onde as grandes portas da faculdade ficavam, juntos, realizando praticamente os mesmos movimentos, espelhando um ao outro, como reflexos em perfeita harmonia, fazíamos mais isso do que era comum se ver por aí.
Entramos no local, os dois com poses de quem estavam acostumados e habituados ao lugar, não dava pra perceber que surtavamos internamente e eu esperava que tivesse algum professor assistindo nossa maravilhosa atuação, vinte pontos para Amaury Lorenzo e Diego Martins, sorri com minha referência idiota a Harry Potter, notei Amaury me observar e ao ver que eu sorria para o nada, apenas voltar a viver sua vida normal, acostumado comigo perdido em meus próprios pensamentos e na imaginação aguçada, caminhamos rumo ao local onde a maioria dos adolescentes e jovens adultos se concentravam, os painéis com horários de aulas e suas salas, também havia algumas pessoas do corpo estudantil, distribuídas em mesas, sinalizando para que os calouros se aproximassem, caminhamos até uma delas, onde havia um garoto, parecendo dois ou três anos mais velho que nós, ele possuía um sorriso bonito e lábios finos, a barba estava impecavelmente feita e seus olhos castanhos estudava tudo com ar tedioso, o cabelo era raspado, havia um brinco em sua orelha e uma covinha chamosa em seu queixo, já a garota ao seu lado era magra e sorridente, ela não parecia fazer esforço nenhum para ser bonita, seus cabelos ondulados soltos pelos ombros, enquanto sua boca possuía um batom vermelho que, na minha concepção, poucas pessoas usariam e ficariam realmente bem como ela ficou, ela tagarelava sem parar, com uma outra garota baixinha e bonita, o corpo magro curvado para baixo e uma roupa engraçada, seus dentinhos de coelho a deixando com a expressão de uma criança sapeca, ela falava junto com sua aparente amiga, mas as duas pareciam se entender bem.
"Oi, oi." Falei assim que chegamos a mesa, sentindo os olhos das três pessoas ali, se voltarem para nós. As garotas passando os olhos rapidamente por mim, mas focando mesmo na beleza monumental que Amaury possuía, senti um repuxar estranho em meu estômago, algo incômodo se alojando no meu peito ao ver a forma como Amaury estudou as duas, principalmente a garota de cabelos ondulados, quando desisti de assistir aquela cena idiota em minha frente e desviei o olhar, vi que o rapaz mais velho me encarava de cima a baixo, corei com seu olhar, não estava acostumado com isso, na escola eu era olhado assim, mas não dava tanta moral, já que vi os garotos de lá passarem por todas suas fases constrangedoras, assim como eles viram as minhas.
"Olá." Ele foi o primeiro a dizer, estendendo a mão, eu sendo ágil em segurá-la. "Me chamo Rafael Gualandi, vocês são calouros?" Ele perguntou, todo simpático, me fazendo sorrir, as meninas prestando atenção em nós dois.
"Sim! Somos." Foi Amaury, quem tomou a frente, se fazendo presente na conversa, desviei o olhar para ele, tentando entender porque sua voz soou tão agressiva. Será que ele estava tão nervoso assim?
"Certo, meu nome é Thatiane, podem me chamar de Thati, Thati Lopes." A garota ondulada de batom vermelho se apresentou, ela sorriu simpática e eu a retribui, mesmo com a sensação estranha, não podia ser um babaca, apenas porque não gostava de... Dividir a atenção do meu melhor amigo, já deveria ter me acostumado nesses quatro anos de amizade, Amaury chamava atenção e gostava disso, não havia nada que eu pudesse fazer.
"Eu me chamo Tata... Talita Werneck, na verdade, mas Tata é mais legal." Ela disse tudo muito rápido, Amaury arregalando um pouco os olhos, revirei os meus, ele achava a minha dicção péssima, fico pensando o que achou da dela então.
"Somos calouros, queremos saber nossos horários." Comentei, sorrindo animado, doido para saber em que turma cairia e se Maury estaria comigo.
"Claro... Seus nomes?" Rafael perguntou, concentrado e consultando algumas listas dos alunos, eu o observei, extremamente bonito.
"Amaury Lorenzo e Diego Martins..." O rapaz mais alto, ao meu lado respondeu, apontando respectivamente para nós dois, conforme os nomes eram falados. Rafael procurou por alguns segundos, tirando as listas das pilhas e entregando uma pra mim e uma para o Maury, sem sequer nos olharmos, colocamos as listas uma ao lado da outra, suspirei triste ao perceber que durante a semana teria quatro aulas e apenas as de terça e quinta, seriam com ele, hoje mesmo, já iríamos nos separar, para as apresentações das turmas, ele tendo aula na sala 2 e eu na 5.
"Droga, sala 2..." Ele sussurrou. "Você vai ficar bem?" Ele disse, seu olhar preocupado, eu sabia que ele odiava me deixar em lugares desconhecidos, mesmo sabendo que eu me virava e fazia amizades mais facilmente que ele.
"Sim... Você?" Perguntei tocando seu braço, não percebendo os olhares curiosos que recebíamos dos jovens que nos ajudaram.
"Vou sim..." Ele se aproximou, seus lábios encostando em minha testa, enquanto sua mão livre, fazia um carinho doce em minha cintura. "Se precisar, estarei a uma mensagem de distância." Eu concordei sorrindo, olhei as pessoas, que ainda nos encaravam, fiquei sem graça de repente.
"Bom, vamos indo... Obrigado pela ajuda." Comentei com um sorriso amarelo, ainda envergonhado.
"Espera..." Rafael falou, ao que nos viramos para eles novamente, Amaury cruzando os braços e estudando o rapaz. "Qual é sua sala? Eu posso te ajudar..." Eu dei um sorriso, mordendo o canto da minha bochecha ao saber que o rapaz queria mais um tempo comigo e estava sendo extremamente gentil, eu não era idiota, conhecia os sinais de interesse, pelo olhar que ele me dava, ele não queria esconder isso.
"Sala 5..." Falei, um sorriso se espalhando pelo rosto bonito.
"Bom... Vamos então? Demos sorte de ter as mesmas aulas." Ele disse, se levantando, ele era um pouco mais baixo que o Amaury, talvez uns quatro ou cinco centímetros, mas seu corpo era lindo e bem desenhado, em umca camisa de malha branca e fina, que realçou bem seus músculos, segurei um sorrisinho.
"Bom, vamos então. Tchau Thati e Tata..." Falei, um sorriso em meus rosto. "Tchau amigo." Falei como quem não quer nada, Amaury me olhou, seus olhos se abrindo um pouco mais, uma careta em seu rosto, não entendi o porquê da expressão de quem comeu e não gostou, mas decidi fingir demência.
"Tchau, Diego." Foi sua resposta super azeda, eu fiz uma nota mental de perguntar o porquê o mais velho estava agindo de forma tão estranha, assim que chegássemos em nossa casa.
Caminhamos pelos corredores do local, indo até o segundo piso, Rafael parecia ser bem popular por ali, já que muita gente o cumprimentava, ele sorrindo para um ou outro, eu observava tudo com atenção, prestando o máximo possível nos lugares que o rapaz bonito me mostrava, tentando memorizar o local e quase chorando quando ele dizia algo que eu não conseguia decorar, por estar distraído, decidi não perguntar de novo, não queria parecer mal educado ou desinteressado no que ele dizia, vez ou outra minha mente voltava para Amaury e seu mal humor estranho.
"Então... Ficamos aqui." Ele disse apontando o local que mais parecia um estúdio de ballet, sorri animado. "As turmas são pequenas, por isso que temos bastantes turmas abertas, hoje tem uns dez alunos porque minha turma está com a sua." Eu concordei, quase pulando de animação, era meu sonho... Será que Amaury estava tão empolgado quanto eu? Será que sua turma também era pequena? E sua sala parecia um estúdio de dança? Suspirei, entrando com o pé direito, mamãe surtaria ao saber, ela odeia todas as minhas superstições e eu tenho muitas.
"Isso é incrivel." Ele concordou, a sala ainda vazia.
"O primeiro dia é meio louco pra todos, já já os outros chegam." Nós nos sentamos no chão, as nossas pernas cruzadas quase se tocando, coloquei minha mochila sobre meu colo. "Então, você e o Amaury namoram a muito tempo?" Ele perguntou, mechendo em seus próprios dedos, soltei uma risada nasalada.
"Isso é você me perguntando se sou solteiro?" Fui direto, o rapaz mais velho me olhando surpreso.
"Você é direto." Ele observou, dei de ombros. "Mas tem razão, então?" Continuou especulando, por um momento me senti mal em dizer a ele, como se fosse errado, mas era o que era.
"Melhores amigos, viemos juntos de São Paulo pra cá, somos quase uma família, ele por mim, eu por ele..." Sorri carinhoso ao lembrar do grandalhão, imbecil, que tinha boa parte do meu coração.
"Isso é bonito. Então aquele ciúmes foi fraterno?" Eu arregalei os olhos, surpreso, Rafael estava mesmo nos observando, ri de novo.
"Não, ele não tem ciúmes, estava apenas nervoso, é o jeito dele." Completei, convicto daquilo que dizia. "Ele vai estar normal amanhã." O rapaz sorriu.
"Parecia ciúmes pra mim." Insistiu, me fazendo revirar os olhos.
"Não era, ele é hetero também, caso isso te convensa." O rapaz mais alto deu uma risadinha, como se realmente tivesse se esforçando para acreditar em mim.
"Certo, certo. Posso investir então?" Eu arregalei os olhos, um pouco surpreso pela ousadia.
"Você é direto." Retruquei o que ele me disse, não tive tempo de responder, o professor entrando na sala com outros alunos da nossa turma.

"Hey!" Chamei assim que saí da sala, após as aulas daquele dia, nós possuíamos apenas meio período de aula. Rafa, me olhou, enquanto juntava suas coisas. "Você por um acaso sabe de alguém querendo empregar um jovem emancipado que faz artes cênicas?" Disparei tudo pra cima dele, quase tampando minha boca ao perceber que falei de mais, porém o jovem rapaz apenas soltou uma risada um tanto quanto engraçada.
"A Thati, a garota de hoje cedo, a família dela tem uma livraria, aqui ao lado do campus, porque não vê com ela?" Eu murchei um pouco ao ouvir o nome da garota.
"Claro... Vou ver sim... Obrigada!" Tentei me animar, não podia ficar escolhendo também, fora que eu mal conhecia a garota para agir assim, Gualandi se despediu de mim, eu fiquei na porta do prédio de artes, observando o campus lotado de pessoas saindo e chegando.
"Bu." Ouvi, quando braços envolveram minha cintura, aconchegando minhas costas contra um corpo grande e quente. "Como foi seu dia?" O rapaz perguntou, podia ouvir o sorriso em sua voz, seu estado de espírito, voltou ao normal.
"Foi ótimo! Tenho tanto pra te contar... E o seu?" Perguntei me virando, minhas mãos pousando em seus braços.
"Foi legal..." Ele disse. "Vamos pra casa, você deve estar com fome e temos que conversar sobre tudo o que aconteceu hoje." Eu concordei sorrindo, pegando em sua mão e me sentindo feliz por ir pra casa e dividir a vida com Amaury.

Rafaeeeeeel Rafaeeeeel...

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