CAPÍTULO 02

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Rayna estava dirigindo há mais ou menos três horas. O relógio indicava que eram onze horas e trinta e quatro minutos da manhã. Assim como os galhos das árvores, a estrada estava coberta de neve. O frio não era insuportável, mas ela sentia a sua presença toda vez que pegava no mapa e sentia os seus dedos dormentes. Ela passou a fazer aquilo por mais vezes do que podia contar.

A bússola apontava para o Leste, assim como Rayna desejava. Se lembrava da dificuldade que tinha de aprender aqueles pontos cardeais, dentre inúmeras formas de sobrevivência que seu pai a ensinou quando pequena. Ela se interessou mais rápido do que imaginava.

Olhou para o ponto fora da janela. Segundo o mapa, a mulher teria que abandonar a estrada e adentrar a floresta para chegar ao destino. Essa informação nova a deixou desconfiada. Sabia de inúmeros casos de assassinato que aconteciam naqueles lugares, quais as chances de sobreviver até chegar ao outro lado? Ela nem queria pensar.

Rayna estacionou o carro perto das árvores. Não queria deixá-lo ali, simplesmente, mas precisava ser feito.

- Não deixe ninguém dirigir você, uh? Ou sua mãe vai ficar chateada - disse a mulher, acariciando o volante. Abriu a mochila. Passou por lanternas, suprimentos, sprays de pimenta, até tirar no fundo o seu canivete e o colocar no bolso.

Estava com medo. Medo de estar entrando em uma enrascada. Ao mesmo tempo, ansiava por continuar. Se desse meia volta, castigaria a si mesma por sua covardia, todas as noites.

Quando abriu a porta do carro, estremeceu com vento cortando o seu sobretudo como uma rajada de mil agulhas. Ela envolveu os braços em volta de si.

- Vamos, Rayna, você procurou por isso

Olhou para o veículo uma última vez e adentrou a floresta.

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Quanto mais avançava, mais a mulher ficava insegura. Sempre que se sentia observada, olhava aos arredores com cuidado, mas não encontrava nada fora do normal. Estava sozinha em meio à tempestade de inverno, e rezava por isso. No meio do caminho, Rayna se deparou com um pedaço de tronco na neve. Agora o agarrava nas mãos como se dependesse da madeira pra viver - e realmente dependia.

Ela cronometrou o tempo assim que saiu do carro, também tomou cuidado de fazer marcações nas árvores com o canivete, apenas para ter certeza de que conseguiria voltar para a estrada.

- Eu acabei de passar por esta árvore - sussurrou - Se eu continuar assim, vou me perder neste lugar pra sempre

Continuou a caminhar, sentindo a neve esmagada debaixo de suas botas. Não podia desistir, não agora que estava tão perto. Quando chegou perto de um galho retorcido até o chão, viu uma sombra há alguns metros de distância.

Seu coração errou uma batida. Ela olhou ao redor rapidamente, mas sem se mover. Quando voltou para frente, suspirou de alívio quando percebeu que era apenas um poste de luz.

Ela atravessou o poste de metal correndo. Aquilo só significava que estava perto de uma civilização. Estava chegando perto. Finalmente estava. Sua respiração pesada impediu-a de escutar rosnados e galhos se partindo atrás de si. Quando enxergou o céu mais claro ao longe, se jogou para fora da floresta. Olhou para tŕas, ofegante. Não tinha nada, absolutamente nada.

A mulher olhou para frente de boca aberta. O castelo pairava atrás do vilarejo, em meio às neblinas. Poucas pessoas circulavam entre as casas de madeira, alienados com a visita inesperada. Lá de cima, parecia um vilarejo qualquer, mas ela se sentiu estranha. Era como se estivesse sendo puxada para algo grande e sombrio.

Deixa de ser imbecil, Rayna. Mova essas pernas

Descendo a montanha, chegou atrás de uma igreja. Assim que saiu, foi recebida por murmúrios e olhares de julgamento. Ela segurou a mochila com mais força, andando mais devagar. O vilarejo parecia preso nos anos 80, ou menos. Apenas cercas de madeira separavam as casas da trilha de pedras. Mulheres usavam vestidos que as cobriam dos pulsos ao pescoço. Uma verdadeira viagem do tempo para a antiga Europa.

The Lost SoulOnde histórias criam vida. Descubra agora