CAPÍTULO 05

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Rayna acariciava o pano de seu casaco laranja, tentando inútilmente conter o nervosismo. Assim que adentrou o portão, se encontrou em uma ravina macabra e cheia de neblina. As árvores estavam muito amontoadas, como se obrigasse a mulher a seguir em frente. Haviam bonecas aleatórias penduradas nos galhos, e ela se esforçou para não olhar para nenhuma delas.

Imaginou que o portão a levaria diretamente à Mansão Beneviento, mas estava enganada. Teria de percorrer um longo caminho, e cada passo a distanciava do seu verdadeiro objetivo, o que a guiou até aquele vilarejo. Aproveitando o silêncio, a mulher tentava encaixar os acontecimentos recentes com o seu pai. Era difícil, mas ela não queria desistir.

Passando pela ravina, viu duas pontes suspensas conectando-a para o outro lado da colina. A primeira levava para cima, a outra para mais embaixo.

Rayna segurou a respiração.

— Isso não me parece seguro — disse a si mesma. Na verdade, não saia de sua cabeça que a mulher não estava segura em nenhum lugar. No vilarejo, foi perseguida por aldeões agoniados. No castelo, foi cobiçada por mulheres meio-moscas e uma de quase três metros — ela realmente queria saber a sua altura de fato —. Até o momento, Dália foi a única pessoa na qual demonstrou algum tipo de confiança.

Aquilo motivou Rayna a continuar.

A mulher rodeou o lugar em busca de caminhos alternativas, mas nada. Parecia que a ponte fazia parte do seu tour particular.

— Muito bem, Rayna. Você consegue, é só não olhar para baixo

Ela segurou fortemente nas cordas de suspensão, esperando que, por algum milagre, conseguisse se pendurar caso a ponte caísse. Quando pisou pela terceira vez, um pedaço da madeira caiu no precipício. Seu grito ecoou no precipício.

— Ai, Deus. Ai, Deus. Tudo bem, você está bem

Rayna respirou fundo e continuou a andar, encarando uma árvore do outro lado — pensou que assim conseguiria andar menos apavorada —, até chegar ao final da ponte.

Viu? Não foi tão difícil

Ela tirou uma garrafa d'água da mochila e bebeu. Se conseguisse, a forasteira esperava recuperar os desenhos do pai, antes de ir embora do lugar. Agora que sabia onde ficava a residência de Heisenberg, pensou que poderia recuperá-los.

Rayna gostava de ser otimista quando precisava.

Caminhou reto até passar por um portão de metal aberto, e então uma casa pequena de madeira. Embora estivesse escuro demais, a única janela deixava Rayna ver o interior do lugar: cadeiras jogadas, escrivaninhas quebradas, e papéis por todos os lados.

Curioso, ela pensou, mas com certeza não era a casa de Beneviento.

Atrás da casa, pás e um arco de serra estavam jogados no chão. Ela segurou o arco nas mãos, Estava quebrado, e a sujeira denunciava o tempo prolongado de seu abandono. Quem morava ali, trabalhava com jardinagem.

Essa casa está inabitada há muito tempo, pensou Rayna.

Quanto mais avançava, mais a mulher entendia o porquê de Dália não ter passado do portão com ela. Era como estar em um filme de terror em que os diretores trabalharam dia e noite para entregar o cenário ideal e fazer os telespectadores desenvolverem traumas permanentes.

Ela pousou os dedos debaixo do sol. A mulher só descobriu que perdeu o relógio de pulso assim que entrou no portão, então tinha que saber as horas à moda antiga. Como o seu pai havia ensinado, quando ela era ainda adolescente.

— Você deve deslocar a mão para baixo, até chegar na linha do horizonte — disse ele, segurando os braços da garota de quartoze anos — Cada dedo significa quinze minutos, e os seus quatro uma hora

The Lost SoulOnde histórias criam vida. Descubra agora