capítulo 21: vislumbre

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Manjiro Sano

Abro os olhos lentamente, minha visão embaçada ainda está se ajustando à pouca luz que entra na cela da cadeia. Minha cabeça lateja e minha mente ainda está confusa, mas aos poucos a realidade se instala. Estou preso, junto com meus subordinados, em um lugar sombrio e claustrofóbico. Levanto-me com dificuldade, sentindo a rigidez em meus membros. Observo os outros ao meu redor, suas expressões refletindo a mesma frustração e preocupação que sinto. Lavo o meu rosto na pequena pia que fica no canto da cela, observo o reflexo do meu rosto cansado e as olheiras profundas. Eu estou horrível. Não só o meu rosto me incomoda, mas esse uniforme laranja também está horrível.

Pelo menos Ayla não está aqui. Ela está segura. Uma onda de alívio percorreu o meu ser só de pensar nisso, mas também uma inquietação por sua ausência.

Rindou permanece deitado na parte de cima do beliche, lendo um jornal trazido pelo carcereiro. Ran está deitado na parte debaixo do beliche, em um sono profundo e Sanzu está tentando cavar um túnel com a colher do almoço. Já estamos presos há uma semana. Passamos pelo tribunal e fomos condenados à prisão perpétua. Pelo menos, agora vou conseguir regular o meu sono.

— Estou entediado. — Rindou, deixou o jornal de lado, e tirou uma carteira de cigarro do bolso. — Alguém quer trocar figurinhas? Eu tenho uma do: você adoece.

— Eu já tenho essa, só que tá no hotel. — Me aconchego no colchão duro.

Ran se mexe na cama e se levanta, ele coça os olhos e solta um bocejo em seguida. Não sei como ele consegue dormir tão bem nesse lugar precário.

— O que vocês estão fazendo?. — Perguntou.

— Trocando figurinhas. — Rindou ergue a carteira de cigarro.

— Espera aí. — Ele também tira uma carteira do bolso. — Eu tenho uma do: Você sofre.

— Não quero essa, já sofro o suficiente. — Resmungo.

— Eu tenho uma rara. — Sanzu solta a colher e pega a carteira de cigarro. — Você brocha.

— Eu troco essa pela minha. Pode passar sem medo para mim, que aqui é imbrochável. — Sanzu joga o cigarro na minha direção.

— Dúvido que você seja mesmo imbrochável. — Rindou provoca.

— Pergunta para Ayla para você ver.

— Como é que é a história?. — Rindou se levanta da cama.

— Cheirinho de barraco. — Sanzu sussurra.

O som estridente do cassetete batendo nas barras da cela ecoa por todo o ambiente, chamando a nossa atenção. Meus olhos se fixam em Naoto, o delegado responsável por nossa prisão. Sua presença só aumenta nosso sentimento de impotência e raiva contida.

— Será que eu estou atrapalhando a reunião do clube das tangerinas? Está na hora de ir para o pátio tomar um pouco de sol.

Silenciosamente, seguimos Naoto pelos corredores sombrios da prisão, nossos passos ecoando no ambiente opressivo na medida que caminhamos. O sol lá fora brilha em contraste com a escuridão que nos cerca, e a ironia da situação não passa despercebida. Caminho até um banco para me sentar e me manter longe dos outros presos, não quero me envolver com esse tipo de gente, não agora. Tenho a minha vida toda para passar nesse lugar, minha paz é a minha prioridade.

De repente, todos os detentos se aglomeram em um só lugar, fazendo um círculo. Minha curiosidade fala mais alto e eu me vejo seguindo na direção da aglomeração. Chegando lá percebi imediatamente do que se tratava: Uma batalha de rima.

Não consigo esconder a minha surpresa quando vejo o Sanzu e o Rindou serem praticamente jogados no meio da roda, sendo obrigados a participar daquilo, para desafiar um ao outro em uma batalha. A tensão no ar é palpável, o ambiente está vibrando com expectativa e desafio.

— RIMAS EM 3, 2, 1

Rindou é o primeiro a começar.

— Cara, eu juro que não sei rimar. Mas se for para te humilhar, então não vou hesitar em tentar. Queria da sua aparência evitar falar, mas é tão maltratada que até o cego agradece por não enxergar. Mano, a tua cara não me satisfaz, você parece ter sido esculpido pelo satanás. Além de ser maltratado, ainda é viciado. Para de ficar gastando dinheiro com essas pílulas, e vai investir em uma rinoplastia. — Gritos de satisfação são ouvidos.

— RIMAS EM 3, 2, 1

— Falar que eu sou feio é fácil, quero ver você fazer o que eu faço. Sou o maior pegador do pedaço, pergunta para a sua mãe que ela acima embaixo. Ah não, sua mãe não pode falar agora, ela tá com a boca muito ocupada lambendo as minhas bola. Você fala como se todas te quisessem, e só para você estivessem cedendo, mas opa, juro que ouvi a Ayla na cama do Manjiro gemendo.

Tudo a acontece muito rápido. Meus olhos se arregalam e o meu coração dá um salto em meu peito quando testemunho o Rindou acertando um soco no nariz do Sanzu. O som do impacto ecoa pelo pátio da prisão, silenciando momentaneamente a roda de detentos. Meu corpo enrijece, incapaz de processar a rapidez com que a situação se desdobrou. Eu sei que o Haitani queria acertar aquele soco em mim, mas ele sabe que seria burrice me desafiar, então ele descontou no Haruchiyo por ter provocado.

A dor se espalha pelo rosto de Sanzu, seu corpo cambaleia para trás, sua mão está segurando o nariz que está sangrando. Os presos logo se agitam e começam a gritar, incentivando uma briga. Por um momento, penso que Sanzu vai revidar, mas ele só levanta a cabeça e começa a rir com o sangue escorrendo.

"[...] Ria Haruchiyo…."

Não estou mais vendo o Rindou ferindo o Sanzu, estou vendo a mim mesmo. Não estou mais vendo o sangue escorrer do seu nariz, estou vendo o sangue escorrer das laterais da sua boca. Não estou mais conseguindo ver o Haitani mais novo, estou tendo um vislumbre do meu eu do passado.

Meus punhos se fecham com força, minhas mãos tremendo de raiva. Minha face se contorce em uma expressão de fúria, meus olhos negros mudam para um tom branco. Sem pensar duas vezes, movo-me com uma velocidade surpreendente, meu corpo se lançando em direção a Rindou. Com um chute violento, acerto seu rosto, canalizando toda a minha raiva e frustração em um único golpe. O som do impacto ressoa no ar, e Rindou é jogado para trás, seu corpo caindo ao chão com um estrondo. O pátio da prisão se enche de um silêncio atordoado, os olhares dos detentos fixados em mim, em choque diante de minha explosão de violência.

Encaro Rindou no chão, com a minha respiração pesada e meu corpo trêmulo, uma onda de arrependimento começa a se formar dentro de mim. A realidade do que acabei de fazer se instala em minha mente, eu me dou conta de que perdi o controle sobre mim mesmo, outra vez.

Um presidiário se aproxima de mim e coloca a mão no meu ombro.

— Rapaz, você bateu no Rapaz. Ele só tava descontando a dor do chifre.


Continua....

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