capítulo 20

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Pauline e Simone pararam à porta do teatro. Uma atmosfera tensa pairava entre as duas. A discussão de quinze minutos atrás fora árida, desconfortável.

— Simone, não precisamos disso...

— Você torna tudo tão difícil.

— O quê?

— Um beijo numa rua vazia. Que mal faria?

— Uma mobilete passou logo em seguida. Você viu. Precisamos ser prudentes, ou então não seremos nada.

Simone soltou uma expiração, cansada. Com um movimento sutil do pescoço, falou:

— Vamos entrar.

Pauline assentiu, percebendo que não poderia falar nada que melhorasse a situação. As duas precisaram atravessar um corredor extenso e estreito, cheio de pinturas abstratas, rabiscos e fotografias de teores diversos. As luzes que o iluminavam, sortidas, tornavam o espaço apertado quente e colorido como um caleidoscópio.

O teatro em si era pequeno. Poucas cadeiras, palco limitado. À meia-luz, parecia mais uma saleta secreta. Nem mesmo contava com uma cortina. A plateia, selecionada a dedo, ostentava diferentes estilos, perfumes e penteados: heterogênea, exótica, instigante.

Sentaram-se lado a lado, pouco antes do blecaute. Uma sombra sólida postou-se no centro do palco como uma estátua de rocha.

Silêncio em suspensão. O toque enervante de um violino a imitar uma nota torta, desafinada. A luz central acende, revelando o rosto duro da atriz principal. As lágrimas escorriam pelo seu pescoço, cor de nanquim.

Veni, vidi, vici.

A luz central, antes cor de âmbar, adquiriu um tom carmim sanguíneo. O monólogo torrencial saía dos lábios da atriz, desesperado, contínuo; e Pauline começou a enxergá-la como Matilde: viúva, filhos mortos, órfã de pai e mãe. Sozinha no tempo e no espaço.

Em determinado momento, sentiu Simone sussurrar algo em sua orelha, mas não ouviu nem deu atenção. Atrás de seus olhos, Matilde surgia com sua beleza rústica e desamparada, bruxa de voz áspera e cabelos negros.

Ω

Não demorou muito até os convidados descobrirem o aparador de bebidas do padrasto de Deluc. Os mais velhos foram os primeiros a experimentar: vermute, rum importado, champanhe, absinto e outras variedades de desatilados e fermentados. Os charutos também não passaram despercebidos, sua fumaça densa empesteava a sala de jogos, onde rapazes brincavam de ser homens.

— Mila, acho que isso vai ser desastroso.

— Deluc, agora já era. — Ela deu um gole rápido em um pequeno cálice de vinho.

— O que vou dizer a meu padrasto?

— Você pode dizer... — ela se inclinou, oferecendo a ele um sorriso trôpego cor de uva — que chamou algumas meninas para a casa. Diga que ganhou dezenas, centenas de beijos!

Ela começou a rir, imitando gestos melosos e jogando beijos para o ar.

— Ah, Deluc, você é tão lindo! Maravilhoso! Um cavalheiro. E hilário! Ah, oh!

— Mila, pare com isso.

— Por quê? Você é meu Hércules, meu príncipe, meu...

— Mila, chega. Você tomou vinho demais.

Deluc tirou o cálice vazio de sua mão e o colocou em cima da mesa; a grande mesa de estudos que compartilharam juntos durante os dias de trabalho.

— Não seja tão sério, bobo.

Marion Le Foy para Garotos e Garotas Onde histórias criam vida. Descubra agora