Chapter 04| Uma ajuda inesperada

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Katherine Beaumont Rockefeller

"A IMPERATRIZ DO TRÁFICO SERÁ INOCENTADA COM O TEMPO?"

Meus olhos transbordantes passavam e repassavam pelo título daquela matéria repetidas vezes, me negando a reler o conteúdo. O horário já marcava as duas da madrugada de sábado para domingo, uma chuva moderada caía do lado de fora, com trovões altos e raios que rasgavam os céus, mas nenhum deles parecia tão devastador quanto a dor que apertava meu peito.

Meu rosto era regado pelas lágrimas, sentada na cama com o travesseiro que eu apertava com força em meus braços na tentativa de ter algum conforto. Minha respiração estava oscilante e meu peito dolorido pelos batimentos intensos do meu coração, dificultando o controle. Meu interior queimava, minha garganta tinha um nó tão intenso que chegava a doer.

Sinto que estou morrendo pra mim mesma, pra minha própria cabeça problemática.

Meu telefone vibra pela vigésima ou trigésima vez, ligações de Martín, papai, mamãe e meus irmãos, nenhuma delas atendida; eu não queria falar com nenhum deles, meu desejo era apenas lidar com meu próprio inferno sem receber olhares de pena dos outros.

O blog de Samuel "Verdadeira Notícia" havia revivido uma matéria sobre mim, me acusavam de matar um garoto, sobrinho de um político importante do Kansas, de overdose, Harry era seu nome.

Ele era meu amigo, tínhamos 17 ou 18 anos naquela época e quase namoramos. Éramos dois fodidos da cabeça que estavam começando a entender como o mundo realmente funcionava e as cobranças exageradas pela perfeição inexistente que eram despejadas em nossos ombros, nos entendíamos, sabíamos a dor um do outro. E para nos aliviar um pouco das crises de ansiedade e pânico recorremos as drogas. Primeiro as farmacêuticas, xanax e essas merdas, depois ele começou a ter acesso a drogas mais pesadas: pó, lsd, psilocibina, êxtase — essas eu nunca usei, apenas aproveitava a maconha quando ele trazia.

Um dia de inverno, próximo ao Natal a uns 2 ou 3 anos atrás, estávamos com 19 anos. Ele havia brigado feio com a mãe e pediu que eu me encontrasse com ele em um quarto de motel próximo a estrada. Quando cheguei ele já havia bebido quase meia garrafa de whisky e usado drogas, não se aguentava em pé e tampouco conseguia proferir uma frase com clareza. Soltava palavras soltas sobre como seus pais eram merdas e que não aguentava mais aquela vida. Lembro de ligar pra sua irmã mais velha naquela noite e falar sobre o estado dele, ela disse que o buscaria de manhã cedo no dia seguinte.

Então aguardei, o acolhi da melhor forma que consegui e tentei tirar as drogas de sua mão, impedir que ele ficasse pior. Quando ele dormiu eu aguardei mais uma ou duas horas antes de ir embora; aquele já era um cenário comum, ele acordaria com dores pelo corpo todo e com um humor terrível — por vezes já havia pedido que eu me retirasse para que ele não falasse coisas ruins para mim ou me tratasse mal.

Ele jogado naquela cama de motel foi a última vez que o vi com vida, apenas com uma calça jeans enquanto sua pele pálida deixava a mostra as tatuagens e cicatrizes que ele tinha, tal como seu rosto enfiado no travesseiro com os longos cabelos pretos bagunçados; infelizmente só um de nós acordou na manhã seguinte.

No óbito constava que overdose era a causa de sua morte, segundo os legistas ele havia consumido uma quantidade significativa de calmantes tarja preta antes de beber naquela noite, que só agravaram sua situação e seu corpo não aguentou.

O escândalo de sua morte foi gigante, mas quando vazaram vídeos das câmeras de segurança que me mostraram saindo daquele motel piorou tudo. Já haviam me flagrado fumando e bebendo com ele antes, nossa fama naquela época era ruim, toda a mídia sabia que saíamos juntos e o que fazíamos, mas ter sido a última a vê-lo com vida foi o estopim para criação de teorias, publicação de fake news e ameaças na internet. Por meses disseram que eu havia induzido sua morte por inveja, por raiva, que eu era sua assassina e só parou de vez depois de quase dois anos.

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