CAPITULO 1

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Todos nós estávamos sentados à mesa do jantar, uma hora e meia depois do intercambista chegar em nossa casa.

Minha mãe começou com essa história de receber gente de intercâmbio uns meses atrás, já que meu irmão quer fazer um intercâmbio futuramente. Se oferecermos a casa, pagamos menos pela viagem, então... a ideia pareceu boa.

"Como é Londres?" - Minha mãe pergunta para quebrar o silêncio.

Reviro os olhos.

"É muito bom, mas muito frio. Ouvi dizer que..."

"Você pode parar de falar, por favor? Seu sotaque irrita" - Digo.

"Abigail!" - Minha mãe chama minha atenção.

Mas estou pouco me fodendo, então levanto da mesa e me retiro, indo para o quarto.

Não fui com a cara de Lorenzo desde que ele pisou aqui e eu e meu irmão prometemos irrita-lo até ele implorar para mudar de família e uma mulher entrar no lugar dele. Já passei muita merda com homens nessa vida para ter que tolerar um qualquer dentro de casa.

O quarto dele é no fim do corredor do andar de cima, ficará em frente ao meu. O do meu irmão e do meus pais são no andar debaixo. Ao fim do corredor havia um banheiro que todos os adolescentes dessa casa iriam dividir agora, e depois as escadas.

Era difícil pra caralho aceitar que Lorenzo era um completo desconhecido e eu iria ter que dividir minha vida com ele agora.

Adormeci tão de repente que, quando abri os olhos, a luz da janela invadia meu quarto de um jeito desconfortável.

Levanto-me da cama e pego tudo que preciso para tomar um banho antes de ir para a aula. Eu sempre acordo antes que meu irmão, então uso o banheiro primeiro tranquilamente. Deixo a água escorrer pelo meu corpo até ela começar a esfriar.

Estou de toalha fazendo a maquiagem quando ouço a porta abrir em um estrondo. Me viro depressa. Esqueci de trancar a porra da porta.

Lorenzo me encara, sem expressar nenhum sentimento, e não consigo decifrar o que está pensando. Ele não se mexe e parece pouco interessado na visão à sua frente.

"Sai daqui!"- Grito, segurando a toalha forte contra o corpo enquanto ele fecha a porta, devagar e tranquilo.

Me apoio na pia e olho para mim mesma no espelho. Merda de irmãos.

Mas fico confusa com o tão pouco interesse que ele demonstrou quando me viu. Será que eu sou feia? Ou será que ele é gay? Seria bom se fosse.

Termino de me arrumar e corro escada abaixo, esperando encontrar algo decente para comer.

"Por que Deus não me concedeu uma meia-irmã?" - Suplico entrando na cozinha, e ouço a porta da frente abrir.

"O que você já está reclamando logo cedo?" - Nora entra em casa junto com Lena, sua meia-irmã.

Nora Miller é minha vizinha e melhor amiga. Ela também está recebendo gente, já que quer ir para fora do país. A sorte dela é que ela recebeu uma meia-irmã.

"O que você tá fazendo aqui logo cedo?" - Reviro os olhos de brincadeira e ela se senta no balcão.

"Penúltimo ano da escola, nem dá pra acreditar"

"Penúltimo ano da escola e um estranho morando na minha casa, não da mesmo pra acreditar"- Nós rimos.

Nesse momento, ouço os passos fortes de Lorenzo descendo as escadas e todas nós nos viramos. Ele passa a mão pelos cabelos recém molhados e passa reto por nós, sem nos encarar.

"Ele é gato" - Nora abana seu próprio rosto e sorri.

"Não, ele não é" - Digo, mesmo não sendo totalmente verdade.

Lorenzo deve ter 1,85 de altura, os cabelos são castanho escuro e parecem macios, pra ser sincera. Ele não é fraco, nem forte, mas consigo ver alguns gominhos pela camisa - não que eu tenha reparado. Os olhos são claros como mel, e a boca é mais convidativa do que deveria. Ok, ele é babaca, mas não tem como negar que é atraente.

"O que as menininhas já estão tagarelando logo cedo?" - Mike passa por nós e abre a porta do armário. Vira o cereal e o leite em uma tigela e começa a comer.

Mike e eu somos gêmeos e ele já é ciumento e agressivo o suficiente para tornar minha vida um inferno. Com outro homem dentro de casa, com certeza o ciúmes pioraria.

"Isso é nojento" - Faço a pior cara que consigo, vendo-o comer.

"Você é nojenta" - Ele mostra a língua de um jeito infantil.

"Acho melhor a gente ir" - Lena comenta.

O bom de morar em cidade pequena é poder ir a todos os lugares a pé porque, se meu irmão tivesse um carro, definitivamente todos estariam mortos a esse ponto. Meus pais sempre saem para trabalhar antes de nós acordarmos e voltam só a noite, então essa também não é uma opção. Quinze minutos de caminhada até a escola não nos matavam.

.

Ian me acompanha até minha casa na volta, já que esse era o único momento em que podíamos ficar sozinhos sem meu irmão nos encarar com cara feia. Ele é quase meu namorado e eu sinto que falta pouco para ele me perguntar para nós oficializarmos.

"Até amanhã, gata" - Ele me beija e sorri.

Entro em casa e reviro os olhos quando olho para Lorenzo deitado no sofá.

"Tá na sua casa, por acaso?" - Falo e ele nem se mexe.

"Sim" - Ele não tira os olhos da tevê.

Não é possível.

"O que você disse?"

"Que sim. Essa é minha casa agora"

"É melhor você pedir pra mudar antes que meu irmão te expulse daqui então"

"Não vou fazer isso"

"Mas ele vai"

Subo as escadas e mando uma mensagem à Mike avisando que cheguei, já que ele fica para o treino depois que acaba a aula.

Desço novamente e decido perguntar o que o imbecil quer comer, porque também não quero matá-lo de fome.

"Meus pais não chegam até as seis e meu irmão fica no treino até as cinco. O que você vai querer comer?"

"Não estou com fome"

Curto e grosso. Minha paciência já começara a diminuir.

"Olha aqui Lorenzo, não sei como funciona no seu país, mas aqui a gente não tolera essa sua... atitudezinha"

"Só falei que não estou com fome. É difícil aceitar isso pra você?"

"Sabe o que é difícil aceitar? Você aqui na minha casa atrapalhando toda a minha vida sem que eu possa fazer nada"

"Não tenho culpa se sua mamãe decidiu inscrever a casa em um programa de intercâmbio"

"Se fosse uma mulher, eu não estaria reclamando. Mas tinha que ser alguém babaca como você, né"

"Pode me tratar como uma mulher. Não tenho nenhum interesse em você"

"Uau, você não é nada do que finge ser na frente dos meus pais. E eu também não tenho nenhum interesse em você"

"Eu seria legal com você se você não fosse uma estúpida"

"Do que você me chamou?"

"Estúpida"

"Você é um idiota"

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