CAPITULO 7

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"Bom dia" - Lorenzo sorri assim que entro na cozinha no outro dia.

Havia acordado mais leve depois da minha confissão ontem.

"Onde estão meus pais?" - Esfrego os olhos.

"Seus pais avisaram que tinham que resolver algumas coisas e seu irmão tá na vizinha. São onze e meia da manhã"

"O que meu irmão tá fazendo na vizinha?" - Franzo as sobrancelhas.

Ele abre a boca para responder, mas nesse momento Mike entra pela porta.

Volto a atenção para a cozinha e pego um copo para encher d'água, enquanto Lorenzo vira as costas e segue para o seu quarto.

"Acordou dorminhoca?" - Meu irmão senta no balcão.

Não respondo e me concentro no copo.

"Entendi, não vai responder. Olha, eu entendo que você esteja brava, mas você não pode me ignorar pra sempre. Você me desculpa? Eu não queria ter falado aquelas coisas, mas era pra te proteger..."

"Tá" - Viro a água e me viro para subir as escadas.

"Não vira as costas pra mim" - Ele segura meu braço.

"Não encosta em mim" - Puxo o braço com força.

"Abby, por favor... Fala comigo"

"Não, Mike. Não tem o que conversar. Por favor, me deixa em paz" - Falo, brava, e subo.

.

"Qual filme você quer ver?"

Estava na casa de Ian, minha mãe finalmente havia permitido eu passar a tarde lá, desde que nós ficássemos com a porta aberta.

A casa dele é bem diferente da minha, já que a renda dos pais dele é melhor que a dos meus. O quarto dele é bem grande e estou até um pouco desconfortável.

"Qualquer um" - Sorrio.

"Beleza, pode escolher enquanto eu faço pipoca" - Ele fala animado e se levanta.

Fiquei ali sozinha na cama de casal gigante, com o controle em mãos.

Eu estava um pouco nervosa, apesar de parecer calma. Nunca havia ido ali sem meus amigos.

Enquanto passava pelos filmes da Netflix, me lembrei da vez em que mexi nas gavetas de Lorenzo depois de uma briga nossa. Parecia que isso havia acontecido há muito tempo, mas haviam se passado apenas algumas semanas.
Será que eu devia contar a ele? Ou isso só iria trazer problemas?

Optei por não falar, ainda não o conheço bem o suficiente para saber como reagiria ao saber que eu tinha invadido o quarto dele.

"Eu coloquei manteiga, sei que você gosta" - Ian encosta a porta, deixando apenas uma brecha - "Que filme escolheu?"

"Hum" - Eu havia esquecido do filme depois de me perder em pensamentos sobre Lorenzo - "Acho melhor você escolher"

Nesse momento, Ian percebe como eu estou apreensiva e deixa o balde de pipoca em cima da cabeceira, deitando-se ao meu lado.

"Ei" - Ele pega em meu rosto - "Relaxa. Minha mãe não vai ficar espiando a gente, e outra, você tá comigo, não precisa ficar nervosa" - Ele dá um beijo em minha testa.

"Eu não tô nervosa" - Digo, apesar de não ser totalmente verdade.

Assistimos o filme normalmente, até Ian me puxar mais para perto, passar um braço em volta de mim e com o outro começar a acariciar minha barriga, descendo um pouco mais a cada movimento. Me mexi desconfortável, numa tentativa inútil de afastá-lo.

"Hum... Ian" - Murmuro como alerta para para-lo.

"Ah, qual é, Abby? Já estamos ficando faz tempo, você não confia em mim?"

"Sua mãe tá em casa"- Invento uma desculpa, que não era totalmente mentira.

"Ela está no andar de baixo" - Ele começa a beijar meu pescoço.

Não consigo sentir nada de bom nisso, apenas desconforto. Começo a ficar nervosa e, por um momento, meu cérebro volta para aquele banheiro no Rio de Janeiro, eu não sabia como para-lo. Fiquei paralisada, não conseguia me mexer; Ian leva isso como um sinal para continuar. Fecho os olhos com força, reunindo coragem, e o empurro.

"Eu disse que não quero!" - Levanto para pegar minhas coisas e ir embora, porém ele me segura.

Ele tenta argumentar, se desculpar, falar qualquer coisa, mas não ouço nada com a raiva batendo em meus ouvidos.

Tropeçando nos degraus e passando pela sala, deixo a casa de Ian e fecho a porta com força.

Ando pelas ruas da cidade até chegar em casa, alguns minutos depois, ainda com raiva.

"Abby? O que aconteceu? Achei que fosse voltar só a noite" - Minha mãe fala quando passo pela sala.

Não respondo, apenas subo logo para o meu quarto.

Como ele pôde fazer aquelas coisas? Era eu que não queria mais ficar com ele agora. Senti as lágrimas descerem e não tentei impedi-las.

Ouço batidas na porta, mas apenas grito que não quero conversar. Sabia que essa semana seria longa sem ao menos ela ter começado.

.

Faz horas que eu estou trancada no meu quarto sem ninguém vir falar comigo. Será que Lorenzo havia visto eu chegar? Não me lembro de te-lo visto depois do "bom dia" que ele me deu pela manhã.

Decido finalmente sair e ir comer alguma coisa. Mas, assim que desço as escadas, avisto meus pais sentados no sofá, conversando sério. Assim que eles me veem, abrem um sorriso nervoso.

"Lorenzo tá em casa?" - E, quando percebo o quanto a pergunta havia sido estranha para eles, acrescento: - "Ele não para de deixar a roupa usada no banheiro, preciso falar com ele sobre isso"

"Ele avisou que estava saindo para ir na vizinha, não vimos ele voltar ainda"

Respiro fundo. Claro.

"Ah, obrigada então"

Passo pelo quarto de Mike, com a intenção de nos resolvermos. Ele tinha razão, eu não podia ficar brava para sempre, nós já estávamos afastados demais para deixar que isso nos afastasse ainda mais. Meu irmão sempre foi meu melhor amigo, não posso perde-lo agora por ele apenas se importar comigo. Mas, assim que empurro a porta encostada, ele não está lá. Achei estranho, mas ele só devia estar em algum lugar com os amigos.

Entro no meu quarto novamente, de onde nunca deveria ter saído. Abro a janela para tomar um ar, mas, assim que olho para frente - onde a janela de Nora está na mesma reta que a minha -, percebo as cortinas estão fechadas, o que nunca acontece, já que ela ama ficar vendo o céu. Franzo as sobrancelhas, mas também não me importo muito.

Sento na cama, deixando o vento frio me atingir de vez. Nesse momento, me vi completamente sozinha. Sem amigos, sem família, sem "namorado". O mundo virou de cabeça para baixo de uma vez esse ano.

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