mansidão

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     Sempre calmo, fumando nas calçadas, perambulando nas esquinas, vendo a vida passar. Velho demais para correr com as pernas, mas ainda jovem o suficiente para deixar a mente voar.

     Me entoco nas cavernas, tentando não pensar em como as coisas poderiam ser diferentes, afinal, não se pode mudar o passado e o futuro não está facilmente ao alcance das mãos. Eu confesso que sou ranzinza, essa calmaria toda é só no exterior, por dentro me borbulha o ódio e o peso das desgraças que já passaram e as que ainda tenho que aturar. 

     É difícil ser humano, mais ainda estender a humanidade para ser gentil com o outro. Ser bondoso é um ato de extrema coragem, e às vezes até ato de burrice. Segunda chance se dá, terceira é pedir para ser apunhalado novamente nas costas, na barriga, nos ouvidos e no coração. 

     Eu sofro muito, ô como sofro! Não sei se fiz alguma coisa para merecer, e também já não importa. Sigo sofrendo, merecendo ou não. O corpo já em frangalhos de tanto que apanhou, a mente só pela misericórdia divina, de tanta merda que já teve em cima da coitada. O mundo é hostil, e as pessoas jogam bombas como se fossem terroristas, não tem um que se salve o tempo todo dessa maldição. 

     E o tempo passa, não deixa de passar, até quando parece parado. A vida anda e corre, e você tem que correr junto para não ser pisoteado.

     Pisoteado também já fui, ô se fui! Tantas vezes que não sei como não tô esmagado. Lembro de vó sempre dizendo: "Que Jesus tome nossa frente.", e o coitado tomou, mas a gente não deixou de carregar cruz por causa disso. Tem gente que te estende a mão pra te chutar de volta na merda logo em seguida, é um ciclo vicioso. Tem muito veneno no coração dos outros, talvez no de todo mundo, sei que tem no meu também. Um veneno horrível, viscoso, que não se esgota por quê quando tá perto de se esgotar, vem alguém e joga um pouco mais, e a gente deixa, e se não deixar também, o pessoal dá um jeito.

     Eu sinto uma revolta tão grande, que se fosse bombardear de volta já teria explodido mais da metade de todo mundo que já conheci nessa vida de tortura. Mas, bombardear não é comigo, não. Acho que já bombardeei vez ou outra, mas não leva a nada, pego minha dor, minha raiva e procuro o que fazer. Eu sou pacifista, e por isso mesmo vivo tomando no cu. E nem peço desculpa pela expressão, é disso mesmo que muitas vezes é feita a vida, tomada de cu e mais tomada de cu.

    Que Deus perdoe meu ódio, ele vai e volta, e sempre me aparece mais motivo pra senti-lo. Essa vida é foda. É bonita, sim, também, mas é foda! Espero que tenha remédio essa doença da humanidade, eu não aguento mais. E sigo aguentando, pois também não há nada mais que eu possa fazer.

votos secretos da identidade do ventoOnde histórias criam vida. Descubra agora