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Charlie Bushnell

Quando Alyssa e eu chegamos em casa, ela ainda não estava falando comigo. Quer dizer, pra me apressar na hora de ir embora porque precisa de carona, ela fala comigo. Mas durante todo o caminho e em casa, continua agindo como se eu fosse invisível. Quanta maturidade...

     Fecho a porta, porque sou o último a entrar em casa, enquanto Alyssa vai subindo direto as escadas. Só que antes dela chegar lá em cima, minha mãe vem descendo, parando-a no quarto degrau ainda.
   — Mãe! — Aly sorri, abraçando-a rapidamente em seguida. Minha mãe a abraça de volta, mas sem toda aquela força ou alegria da própria filha. — Eu não sabia que ia voltar de Seattle hoje.
     — A audiência do caso que estou resolvendo por lá foi adiado pra semana que vem. — Ela responde, sempre séria e neutra. — Seu pai também voltou, mas está descansando, então façam silêncio.
     Alyssa concorda com a cabeça, sorrindo mais uma vez antes de beijar a bochecha da minha mãe para continuar subindo as escadas. Quando ela some pelo segundo andar da casa, minha mãe lança seu olhar, cheio de frieza, na minha direção. Eu suspiro, fingindo que não é comigo quando giro meu corpo nos calcanhares, e me viro para ir até a cozinha.
  — Charlie! — Minha mãe exclama. Há alguma coisa em seu tom de voz, que faz com que meu nome saia tenso e pesado de sua boca, parace até que eu fiz alguma merda. Acho que meus pais escolheram esse nome pra mim, justamente porque sabiam que iam me dar muito esporro na vida.
     — Sim, senhora? — Sorrio com um toque de sarcasmo nos lábios, jogando a mochila em cima da ilha de inox enquanto passo direto até a geladeira.
     — Fale direito comigo, sou sua mãe, não seus amigos ou aquelas garotas que você traz em casa.

     Não estou olhando para ela, porque estou quase me enfiando dentro da geladeira, mas sei que está cruzando os braços de forma autoritária. É tudo o que minha mãe é autoritária.
     — Charlie. — Ela chama outra vez, ainda mais grave que antes. — Olhe pra mim enquanto falo com você.
     Suspiro, e pego a garrafa de leite antes de fechar a porta da geladeira. Abro a tampinha da garrafa, e então dou um longo gole no leite direto da boca mesmo, enquanto encaro minha mãe, que apenas observa com uma expressão repulsiva ao meu "ato totalmente primitivo".
     — O que eu já disse sobre beber o leite direto da garrafa? — Erguendo uma sobrancelha, ela me acompanha com o olhar enquanto me sento num dos banquinhos da ilha.
     — Que eu não devia fazer isso... — Resmungo e fecho a garrafa.
     — Então por que fez?

     Meio abaixo a cabeça e olho para ela. Odeio a forma como sempre me trata – como se eu tivesse 10 anos. Quando se trata de confiança, aqui em casa eu sou o único que não tem direito a esse "sentimento", porque ninguém confia em mim nessa porra. Parece até que eu vou chamar uma coletiva de imprensa se me contarem algum segredo. Sou útil quando convém, fora isso, sou apenas o filho rebelde, que tira notas baixas e precisa de um puxão de orelha o tempo inteiro, além de um mulherengo traidor que não presta, e mágoa todo mundo. Da pra ver que eu sou muito amado pela minha própria família.

     Minha mãe apoia uma mão no metal da ilha, e uma mão no quadril, se inclinando na minha direção.
     — O que aconteceu com você? — Ela pergunta — Está com olheiras, meio pálido... está se sentindo bem?
     Até quando tenta ser preocupada, minha mãe parece com um robô com programações para agir.
     — Só cansado. — Passo a mão no cabelo, o tirando da testa. — Não foi um bom fim de semana.
     — Sua irmã me contou o que aconteceu com aquela menina. Espero que ela esteja bem.
     Ela diz "menina", como se não conhecesse a Amélia, que a propósito frequenta nossa casa mais do que a própria dona dela.
    — Mas ainda sim, quero que tire isso da cabeça, Charlie. Você tem assuntos mais importantes do que ficar pensando numa garota o dia inteiro, o que a propósito você faz desde que entrou na puberdade.
  Passo a mão no rosto, fechando os olhos. Minha cabeça já está começando a latejar de dor, e tudo porque minha mãe está me torrando uma paciência que já não existe mais. Antes ela ficasse em Seattle.
     — Tipo o que? — Murmuro — O que é mais importante? — Já até sei o que ela vai dizer...
     — Futebol. — Blim-blim-blim, eu acertei! — E suas notas.

ALL FOR LOVE - Charlie Bushnell (livro 2)Onde histórias criam vida. Descubra agora