Uma chance

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Acordei com uma enxaqueca forte que não parava de martelar e o som do despertador não estava ajudando.

Sério que preciso trabalhar hoje? Me sinto como um estudante sendo obrigado a ir para o colégio todas as manhãs, pelo menos, ao contrário daquela época, hoje em dia sou pago e não preciso ouvir ensinamentos nazistas e muito menos fazer treinamento militar.

Quem se importa que o salário é ruim? Tenho eletricidade, água, gás e não preciso pagar nada disso, o que eu preciso é parar de reclamar. Mas sinto como se ainda morasse na casa de meus pais falecidos, velhos abutres que não me tratavam como um filho, mas como um cachorro que precisava ser treinado.

Isso foi um pouco mórbido, prefiro não pensar mais nisso.

Quando havia terminado de tomar banho e me vestir com o uniforme, fui para minha cabine para começar mais um dia de trabalho. Eu estava segurando minha nova xícara preenchida com café quente e amargo, para um café ser bom precisa ser assim.

Estava tomando um gole e fazendo meu trabalho normalmente, não consegui engolir o café imediatamente, pois Francis estava na minha frente.

— Mmm... Bom dia, Mikhael...

Eu realmente espero que seja uma anomalia, porque não sei como vou conseguir agir normalmente depois do que aconteceu. Olhei para a aparência dele e realmente parecia ser ele, havia um pequeno machucado no canto dos lábios dele, ao ver isso, não consegui mais olhar nos olhos dele.

— Bom dia, Francis... Vou seguir o protocolo de checagem para confirmar sua identidade. — minha voz estava trêmula pelo nervosismo.

Acho que ele está tão desconfortável quanto eu nessa situação.

— Tudo bem...

Vi que Francis estava na lista de entrada, confirmei a identidade e estava analisando o pedido de entrada dele, mas não conseguia me concentrar. Havia uma tensão bizarra e desconfortante entre nós, eu não conseguia agir normalmente e muito menos ele.

Geralmente, eu tentava ao máximo puxar assunto com Francis, ser atencioso e mostrar que sou um bom partido, mas agora não conseguia nem o olhar nos olhos dele. Enquanto Francis que era habitualmente quieto, parecia desconfortável se mexendo e remexendo.

— Você...

— Francis...

Acabamos falando ao mesmo tempo e paramos ao mesmo tempo, nos encarando.

Ele desviou o olhar.

— Pode falar primeiro.

— Podemos conversar sobre o aconteceu naquela noite? Não precisa ser agora, podemos conversar sobre isso durante a minha pausa para o almoço. — Minhas mãos segurando a xícara tremiam um pouco, coloquei ela em cima da mesa, com receio de derrubar acidentalmente.

Eu não conseguia conter meu nervosismo, mas falar sobre isso é algo que eu e Francis precisamos fazer.

Ouvi um longo suspiro vindo de Francis, ele parecia um pouco cansado.

— Sim, eu ia sugerir a mesma coisa... Podemos nos encontrar no bar ao meio dia, agora preciso fazer algumas entregas de leite dentro do prédio agora, poderia abrir a porta?

— Sim, então nos vemos mais tarde. Vou abrir agora mesmo, já  confirmei sua identidade. — abri o portão para Francis.

Eu queria acabar o mais rápido possível com essa atmosfera constrangedora e desconfortável. Parecia ser o mesmo para Francis, pois ele saiu rapidamente.

Me recostei na cadeira, dando um suspiro profundo. Senti alívio quando Francis foi embora, mas quando percebi como eu estava me sentindo, congelei.

Por que me senti tão aliviado pela saída dele? Normalmente, eu tentaria estender o tempo que conversamos. Mesmo que eu esteja desconfortável e nervoso, eu deveria pelo menos me sentir um pouco frustrado com a partida dele, não tão aliviado, afinal, eu o amo.

The Milkman | That's not my neighbor Onde histórias criam vida. Descubra agora