A BORDO

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Não eram as boas-vindas que Derek estava esperando, não aquela voz soando logo quando acordou.

– A vida pode ser como o fluxo das marés, não é? Indo e voltando.

O quarto em que estava era estranho para o jovem, bem como a máscara hospitalar em seu rosto, mas tinha noção de quem falava.

– Maciel? – disse de modo abafado, a mente ainda anuviada pelo sono. – Onde estou?

– Em nosso navio, tratado como hóspede de luxo. Podia ser integrante da nossa banda e estar aproveitando a paisagem aqui fora, se quisesse. Muita coisa seria diferente se não fosse tão teimoso.

– Hóspede? – Derek levantou os braços e não foi surpresa perceber que estava acorrentado na cama daquele quarto branco. – Um prisioneiro de luxo, você não quer dizer? – Ele olhou em volta, procurando de onde a voz de Maciel vinha e se perguntando se o outro podia escutá-lo mesmo com aquela máscara sobre a boca. Não encontrou mais ninguém no recinto, e o fato o lembrou de uma ausência importante. – Eveline! Onde ela está?

– A senhorita Gutierrez está bem. Acordada, inclusive. Sem ouro, ela é totalmente inofensiva, diferente de você. Está ficando resistente ao sonífero e possuía aquele veleiro que fugiu de nós como se fosse uma criatura viva. Onde conseguiu? – Maciel esperou a resposta. – Bem, não interessa por enquanto. Não é como se o modelo estivesse à venda, não é? O que chama a atenção mesmo é que está bem mais poderoso. Resolveu não fugir mais da magia, do seu destino?

A mente do mago ignorou totalmente a última pergunta e migrou para a verdadeira questão: Fortuna. O barco estava mar afora, ao sabor das ondas. Se apurasse os ouvidos, quase podia ouvi-lo badalar como um sino distante. Ele se concentrou na conexão tênue que possuía com o barco, torcendo para que Maciel não percebesse algo de diferente e atrapalhasse. Percebendo ou não o que se passava dentro da cabeça do jovem, a voz não demorou a tirar a concentração dele com poucas palavras.

– Enfim, motivos não faltam para rever sua recusa em usar magia. São muitos os fatores que influenciam o seu bem-estar e o da sua amiga. É possível ver perfeitamente em sua cara que não gostaria que cortássemos relação com a encantadora de ouro, não é?

Não era apenas blefe de Maciel, nem mesmo a parte de poder ver a preocupação surgir no rosto de Derek. Na ponte de comando do navio, observava os monitores enquanto conversava com o prisioneiro de luxo, jogando as cartas necessárias para mantê-lo dócil às suas ordens.

– Acredite: o poder sobre o ouro é muito valioso, mas se você ou ela não colaborarem, não haverá uma nova chance como esta que estamos dando agora – ele finalizou, desligando o microfone e deixando o rapaz digerir a ameaça.

– Acha que ele vai se comportar? – perguntou o tripulante ao lado.

– Ele pode ter aprendido truques novos, mas ainda é um garoto assustado e não vai fazer nada que prejudique a nova amiguinha dele. – Maciel olhou para outra tela e observou a moça andando de um lado a outro no quarto em que estava trancada. – No entanto, aumentem o sonífero para garantir. Não vamos correr qualquer risco a essa altura.

– A propósito, vamos atracar – anunciou o comandante.

De fato, Maciel podia ver perfeitamente o cais cinza-cimento – cujas poucas cores vinham apenas dos contêineres empilhados – cada vez mais perto conforme o navio de cruzeiro encurtava a distância entre os dois em uma aproximação lenta como um afago tímido. Ele baixou o olhar para o painel onde repousava uma maleta com a alça ligada a seu próprio pulso por uma corrente.

Derek Campbell contra a EfígieOnde histórias criam vida. Descubra agora