𝐶𝑎𝑝𝑖́𝑡𝑢𝑙𝑜 9

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𝑈𝑚 𝑎𝑛𝑜 𝑎𝑡𝑟𝑎́𝑠

Papai tinha me mandado para cama a mais de dez minutos, e desde então os gritos vindos do escritório não pararam nem por um segundo, já mamãe permanecia em silêncio. Ezra tinha sido dispensado mais cedo hoje, junto as governantas e os jardineiros, o que foi uma surpresa tanto para mim quanto para eles.

Um grito alto soou como um pedido de ajuda, então calcei minhas pantufas e corri pelos degraus até o som dos gemidos melancólicos da mamãe estarem mais perto, no corredor vi a porta do escritório entreaberta, aproveitei a escuridão da noite e fiquei para observar, o notebook que antes ficava na mesa da mamãe agora estava no chão ao seu lado, quase em pedaços.

- Como você pode? Toda essa ingratidão pela vida que eu te dei! - Papai que sempre estava sereno e sorridente, estava enfurecido, seu rosto vermelho e seu punho cerrado parecia estar a um fio de não segurar mais o que parecia querer explodir.

- Theodoro... - Choramingou mamãe encolhida e imóvel, estava amedrontada, e aqui parecia me sufocar, eu queria abraçá-la, dizer que ia ficar tudo bem.

- Eu quero saber tudo, agora! - Gritou jogando seu copo de whisky quase cheio no chão. - Eu disse agora! - Mamãe tremeu.

- Nos conhecemos quando fui à conferência cultural em Nova Orleans a dois anos, para comprar peças para o leilão beneficente da ilha... - Suas lágrimas se intensificaram e logo em seguida as do papai também. - Ele estava no bar e acabamos conversando e o quarto dele ficava ao lado do meu...

- E você achou que seria uma boa ideia continuar esse seu caso idiota?
- Não é um caso Theodoro...
- Nós temos uma filha Eleonor!
- Eu amo a minha filha, eu não viveria sem ela, mas quer saber Theo... ela é a única coisa que me fez aguentar essa farsa que você chama de casamento!

Em dezesseis anos que cresci vendo meus pais eu nunca tinha presenciado uma discussão, pior ainda uma dessas, nunca soube de crises no relacionamento, pra mim eles eram perfeitos, eu queria que Henry e eu fossemos assim, e agora eu não sei mais no que acreditar.

- Você não tem o direito de resumir dezoito anos juntos em uma "farsa". - Papai parecia ter perdido controle das próprias lágrimas, ele estava triste, mamãe também e agora eu lutava para segurar minhas próprias dores.

- Eu nunca te amei Theo, você sabe disso, sempre soube... Mas seu amor por mim era tão cego... - Mamãe se jogou na poltrona de couro no canto da sala, seus olhos tristes encaravam a lua brilhante pelo vidro, secou uma lágrima que escorria e voltou a olhar para o papai. - Eu vivi a mercê de Sunset toda a minha vida, quando meu pai disse que me casaria com você eu aceitei, e eu juro Theo, juro com todo meu coração que tentei amar você... Mas eu não consegui.

- Está dizendo que a culpa é minha?
Mamãe se levantou e foi até o papai, suas mãos tocaram seu rosto em desespero, então suas tetas se juntaram em um momento de calmaria.

- Você não fez nada errado meu querido, a culpa é deles... Você é bom Theo, merece alguém que ame você, que queira a eternidade ao seu lado, não alguém que se sinta preso a um casamento que não escolheu.
- Você vai me deixar?
- Eu preciso...

Papai a deu um empurrão, fazendo com que caísse de costas no chão, seus olhos eram vermelhos e assustadores, seu punho parou no ar segurando o fôlego, ele estava prestes a cometer um erro que mudaria nossa vida.

- Saia daqui! - gritou tão alto que pude sentir o tinir no meu tímpano, mamãe se levantou e antes que pudesse chegar a porta eu me levantei e corri o mais rápido possível para o quarto, me deitei na cama e tentei conter minha respiração que queimava nos meus pulmões.

𝑺𝒖𝒏𝒔𝒆𝒕 - 𝑢𝑛𝑖𝑑𝑜𝑠 𝑝𝑒𝑙𝑜 𝑐𝑎𝑜𝑠Onde histórias criam vida. Descubra agora