Retorno das rosas

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Foi uma noite mal dormida, apenas cochilei em alguns momentos. Deve imaginar que era por preocupação com Eduardo, bom não era.
Acontece que Clara não voltou para o quarto ontem à noite. E deveria ter voltado.
Matias está andando de um lado para o outro desde quando notamos a falta dela. Ou seja, onze horas da noite, ele me acordou desesperado, e nem dormindo eu estava. Que inferno, nem descansar mais eu posso!
Saímos do quarto, procurando por todos os lados.
Paramos na recepção, ela teria todos os horários que ocorreram no local e com quem cada "cliente" estava.

- Elisabete, bom dia

- O que querem aqui intrometidos - ela me interrompeu

- Clara sumiu

- Relaxem, o pessoal já está limpando tudo, aparentemente, depois do horário de serviço algum homem entrou lá e resolveu que queria descontar um ódio nela

- Ele a estuprou não foi?

Elisabete assentiu com a cabeça.
Se já não tivesse visto muitas situações dessas acontecerem aqui, estaria assustada. Mas até mesmo eu já passei por isso, era comum, e ninguém fazia nada. O problema era quando havia morte.

- E ela está bem?

- Devem receber a visita do chefe no quarto pra mais informações, por agora, vão não quero ser incomodada.

Saímos calmamente até o corredor, entramos no quarto e deram- se as reclamações e xingamentos à mulher.

- Que filha da puta

- Matias se acalme cara, sossega porra.- Léo dando um basta nos infinitos xingamentos que Matias tinha a dizer para a recepcionista - Clara vai ficar bem, eu sei que você ama aquela garota como a sua vida, mas para de escândalo, tá ficando chato ...
Um... Dois... Três... Quatro... Cinco...

Cinco batidas na porta... O chefe está do lado de fora, nosso sequestrador, nosso inferno em forma de gente.
Um sim coletivo pode ser ouvido, e a porta se abriu, mostrando um homem que coloca medo em quem ousar olhar em seus olhos.

- Elisabete informou da visita de vocês à recepção. Decidi por conta própria dar a notícia, Clara está morta, não suportou a "dor" que sentiu.
Quando esse homem pôs a palavra dor entre aspas, senti a força e coragem, misturadas a dor e ódio que sentia pela minha melhor amiga.

- O senhor sendo o filho da puta que é, se vê no direito de dizer que ela não sentiu dor? Eu sabia que era um monstro, mas não sabia que era tão sem noção e idiota a esse ponto. Mataram uma mulher aqui dentro, deveria sentir vergonha do que fez.

Vi ele se aproximar com uma face de ódio por tudo que eu disse. Era verdade. E minha mãe me ensinou a não mentir claro que minto com frequência. Clara nunca soube meu nome de verdade, e nunca tive a chance de contar o que realmente aconteceu, que eu conheço a fugitiva e que a ajudei a escapar. Mas ela me prometeu voltar um dia e libertar todas as crianças. Vejo que acreditei nela em vão.
Léo se colocou entre o homem nojento a minha frente e eu.

- Se encostar um dedo nela, eu sou obrigado a te matar, ela é minha irmã e com a minha família ninguém mexe.

Léo era do mesmo tamanho do chefe, forte e mais ou menos saudável, era melhor do que eu nisso. Porém um detalhe, Léo e eu não somos irmãos. A questão é que quando ele era criança, minha irmã veio comigo ao COSP, fomos sequestradas juntas, entretanto nos separaram, conversamos muito pouco naquela época.

Quando contei ao Léo que havia me distanciado da minha irmã por conta dos homens ele me olhou como fosse seu último ato:

- Quer ser minha irmãzinha então? Posso ser um ótimo irmão mais velho!

Aquele sorriso me conquistava, era o único que eu queria por perto na época, até Eduardo aparecer e mudar tudo.
O homem, aparentemente, se rendeu. Mas talvez sejamos punidos por isso.

- Venham comigo, vou levá-los ao quarto em que a encontraram. Matias Carvalho Vieira, o senhor fica.

Matias assentiu, apenas concordando, até mesmo aquele ser humano teimoso, aceitou que não estava pronto para ver o quarto onde o amor de sua vida foi morta. Eduardo ficou também, ainda estava machucado e precisava dar assistência ao Matias, ele precisará de todo o nosso apoio.
Caminhando pelo corredor cor de creme, um creme encardido, chegamos à uma porta vermelha, abrindo - a entramos em um cômodo que cheirava a limpeza.

- Os pertences que encontramos com ela estão na mesinha de cabeceira.

Voltando meus olhos para a mesa, notei tudo que era dela, remédios para a dor, o anel que era da mãe e trouxe no bolso ao ser sequestrada... Mas notei também uma coisa, coisa essa que eu sabia, Clara odiava. Eram rosas. Rosas brancas pra ser mais específica. Clara odiava todo o tipo de flores, disse que o cheiro, a cor, tudo nelas irritava.
O homem pensou ser apenas um detalhe, mas estava óbvio para Léo e eu, aquilo era o retorno de uma certa maldição.
Um dia foi dito por um garoto que sua irmã recebeu uma rosa aqui e foi morta horas depois.
Descobrimos mais tarde que ela planejava fugir e foi descoberta. Por quem? Até hoje ninguém sabe. Apenas temos a maldição que pelo visto, retornou.

Me faça esquecer as rosas Onde histórias criam vida. Descubra agora