17 | Problemas suficientes

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Vivienne Barbieri

O silêncio era sepulcral.

Foi assim na última uma hora inteira. Natália tinha sido a única a ficar para conversar com a polícia no bar. Haziel não achou que seria uma boa ideia prestar depoimento naquele momento, então, após trancar todas as inúmeras portas que poderiam levar qualquer desconhecido ao andar debaixo, nós saímos em seu carro para o apartamento de Gringo, que não ficava longe.

Não seria uma boa ideia ir para minha cobertura, uma vez que eu agora sabia que Laura tinha acesso a todas as gravações. Eu usara apenas a desculpa que Theodora estava lá, e, desde então, não dizemos nenhuma palavra.

Haziel tinha as chaves de Gringo. O apartamento ficava a não mais que três quilômetros do bar, e era pequeno, mas era de muito bom gosto. Tinha uma copa unida à sala e uma cozinha minúscula, mas planejada.

No instante em que ali entramos, Haziel foi direto para a cozinha. Segui-o automaticamente, e o vi abrir um armário e pegar um uísque dali. Ele pegou um copo e o encheu com o líquido alcoólico. Pensei que iria me entregar, mas tudo que ele fez foi engolir a bebida de uma só vez.

— Imagino que vá querer — ele sussurrou de modo seco, fazendo menção em pegar mais um copo.

Surpreendentemente, eu disse:

— Não. Hoje não.

Haziel me encarou de imediato, tão surpreso pela minha recusa quanto eu. As palavras tinham simplesmente escapado. Não quis pensar muito sobre isso, pois sabia que, se o fizesse, eu acabaria concluindo que queria mais do que tudo retirar o que dissera.

O garoto desviou o olhar para a garrafa sem dizer nada e se serviu de mais uma dose antes de pegar o copo e passar direto por mim para a sala. Ele se sentou no sofá de uma só vez e apoiou o copo na mesa de centro.

Fiquei observando enquanto ele apoiava a cabeça nas mãos, curvado. Sua postura exalava tensão pura.

Não soube dizer quanto tempo se passou com ele naquela posição, afogado em seus próprios pensamentos que não eram nada agradáveis. Permaneci focada nele, porque sabia que não podia me dar ao luxo de pensar no maldito tiroteio e, principalmente, em mim, em como eu agira durante o dia todo. De forma alguma sabia dizer o porquê de eu ter empurrado Haziel primeiro ao invés de me proteger primeiro. Eu o odiava mais do que tudo.

Quando Haziel enfim se colocou mais ereto, pegou seu copo e engoliu o restante do uísque ali presente antes de lançar seu olhar mais irredutível para mim. Foi inevitável engolir em seco.

— Essa é uma boa hora para você começar a falar, Vivienne — disse duramente, como se voltássemos à dinâmica normal. Ele também não estava muito disposto a fazer menção em como me protegera naquele tiroteio. Seus instintos deviam ser tão inexplicáveis quanto os meus. — Você sabia que o tiroteio ia acontecer. Foi me procurar por isso.

— Não é verdade — eu retruquei entredentes. — Não sabia que ia acontecer... aquilo.

— Mas sabia de alguma coisa. Quem foi?

Permaneci em silêncio.

— Me diz quem foi, porra. — Ele elevou o tom de voz, mas isso não me fez falar nada. Uma parte de mim temia Haziel, mas outra, depois de tudo, me dizia que ele não iria me fazer mal. Não sabia se ela era completamente estúpida ou apenas inocente. — Natália estava lá. Dois dos meus funcionários estavam prestes a chegar. Alguém poderia ter morrido.

Cerrei os dentes com força, nervosa. Esperei que Haziel se colocasse pé, que viesse até mim como costumava fazer em confrontos como aquele, mas... ele não fez nada disso. Após longos segundos, ele apenas jogou seu copo vazio na parede mais próxima com toda sua força, e os cacos se espatifaram de uma só vez.

Criaturas BrutaisWhere stories live. Discover now