Haziel Milani
O silêncio de Vivienne era ensurdecedor. Ela nunca ficava quieta.
Ela estava sentada a poucos metros de distância de mim, sem expressão e imóvel.
Não tinha sequer dito um "eu avisei" ou me lançado um de seus xingamentos infinitos.
— Então, o que vamos fazer? — um de meus homens me perguntou, rompendo o silêncio de quase meia hora que tinha se estabelecido. Havia apenas dois deles na sala dos fundos do bloco que se localizava na área da festa.
Eram os mais confiáveis.
Theodora havia sido levada de um local onde eu tinha domínio, o que automaticamente queria dizer que havia delatores ali. Eu encarei Vivienne, que segurava o pequeno pedaço de papel que havia sido me dado.
— Temos o endereço — eu disse para ela, cujo olhar perdido se voltou para mim. — Eu e meus homens podemos invadir o lugar. Podemos...
— Não — ela me cortou, o rigor quase palpável em sua voz. Eu não tinha dúvidas de que, caso ela tivesse seguido naquele mundo, teria sido uma dirigente respeitada. — É perigoso demais. Para vocês e para Theodora. Não vou arriscar.
— Mas podemos ter uma chance.
— Temos uma chance melhor se dermos o que ele está pedindo.
Ele.
Não havia assinatura no bilhete, mas não havia dúvidas de quem se tratava. Tudo que estava escrito em letras garranchadas era:
"Os arquivos pela sua irmã. Nada de gracinhas e ninguém além de você."
Em seguida havia um endereço.
Grego queria os arquivos que Vivienne tinha guardado, os mesmos que seu pai decerto lhe deixara. Não em pendrives, não em computadores, mas impressos. Ele sabia como esse mundo funcionava. Nada nunca podia ser apagado por completo caso fosse processado por um maldito HD, e ele com certeza não iria querer que isso caísse nas mãos erradas.
— Ele te quer lá sozinha, Vivienne — eu disse, sem rodeios. — E você, mais do que ninguém, sabe que Grego não é um homem de palavra. Ele não vai soltar sua irmã magicamente quando ver você com os papéis em mãos.
Vivienne trincou o maxilar. Não havia mais vestígios do sorriso que eu vira há menos de meia hora, da diversão explícita em suas feições e o brilho do olhar. Havia só... a pessoa quem ela fora criada para ser. Racional, ameaçadora e firme.
— Eu também sei que não há nada que o tire mais do sério do que ser contrariado. Já pensei sobre as duas possibilidades, e nenhuma é boa. Nem de longe. Mas não há nada que eu confie menos do que no orgulho dele. Ele mata Theodora no décimo de segundo em que perceber que está sendo atacado, porque, se for para cair, preferirá levar alguém junto consigo. Não chegaríamos a tempo nem com um maldito batalhão.
Encarei-a, repassando cada uma de suas palavras.
Odiei concluir que ela estava certa. Ainda assim...
— Podem sair. Quero ficar com ela a sós.
Em cinco segundos, a porta da pequena sala cheia de mofo foi fechada. Expirei o ar pesado pela boca e me inclinei em sua direção. Eu tive toda sua atenção.
— Você sabe que é burrice ir sozinha.
— E você sabe que eu não preciso da sua permissão — ela retrucou friamente, engolindo em seco.
— Podemos apenas esperar por você, então. Seríamos cuidadosos. Você o encontraria sozinha, mas estaríamos à espreita.
— Não — disse, agora mais firme do que nunca. — Eu vou fazer isso sozinha.
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Criaturas Brutais
RomanceVivienne Barbieri está enfrentando o Inferno. Jordan Barbieri, importante político de Belo Horizonte que a adotara aos dezesseis anos, falecera em uma operação que buscava encerrar atividades ilegais de rixas de comunidades. Com dívidas para cuidar...