29. Decisão

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Anna

[ Movies - Conan Gray - Spotify ]

"In my head, we're dancing in the dark... in my head...", meus dedos dançam pelo teclado do notebook enquanto dou um gole na xícara do Nevermind, do Nirvana, "...we kiss under the stars...".

Pelo tremor involuntário das minhas pernas, penso, o espírito do Kurt Cobain deve estar sentado na minha frente, me olhando com um cigarro na boca e balançando a cabeça em manifestação de pena. Estou nervosa.

Abro minha caixa de entrada do e-mail.

"Quê?!! ", levanto tão rápido da cadeira que sinto uma queda de pressão, e quando minha visão escurece, me deixo cair no assento de novo. "Ai, meu deus!", solto um grito ensurdecedor.

"Anny? Está tudo bem aí?", ouço barulho de passos no segundo andar e meu pai desce as escadas correndo, quase tropeçando no último degrau.

"Eu passei!"

Ele faz um sorriso largo, mas, pelos cotovelos dobrados e mãos abertas pendendo no ar e as sobrancelhas levemente erguidas, é óbvio que ele nem sabe o porquê está sorrindo. Principalmente por causa das olheiras fundas e de um pé com chinelo e o outro sem. O pobre coitado estava cochilando.

"Te acordei, não é?", digo, franzindo a testa, "Me desculpa..."

"Tudo bem, filha, eu queria muito acordar logo daquele pesadelo em que o Freddie Mercury estava me obrigando a fazer um solo de guitarra no palco do Rock in Rio, foi perturbador."

"O quê?!", solto uma risada estrondosa, "Isso é demais!"

"Demais onde?", ele balança a cabeça, indo em direção à mesa, "Só pra sua informação, eu não sabia nem segurar a guitarra, foi o pior pesade...", ele apoia os cotovelos na mesa e agarra a tela do notebook, "Anny!!!"

Meu pai me abraça com força, e nós saltamos em comemoração à minha aprovação na Universidade de São Francisco.

"Prezada Anna Bittencourt...", eufórica, concentro esforços para ler o e-mail devagar, "...estamos contentes em informar que você foi selecionada para estudar na Universidade de San Francisco, uma das mais notáveis da Califórnia...", continuo lendo até o final.

"Espera, tem mais aqui", papai aponta para um último parágrafo, embaixo da imagem de boas-vindas.

"Ah, sim", desço a tela e pigarreio, "Gostaríamos de anunciar que a nota obtida em seu teste multidisciplinar, realizado no início deste mês, despertou o interesse dos responsáveis pela correção e validação do exame, que, através deste e-mail, vêm oferecer-lhe a proposta...de conceder-lhe uma bolsa de estudos para frequentar a Universidade de Oxford, no Reino Unido. Nas presentes circunstâncias, estabelecemos o prazo e demais detalhes sobre seu posicionamento quanto à mencionada proposta, que constam no link abaixo. Ficamos no aguardo".

Espera... o quê?

Papai e eu nos encaramos por alguns segundos, em silêncio, incapazes de nos decidirmos entre ir à loucura ou preservar o bom senso da conformação. Tipo escolher entre surtar de felicidade e quebrar a janela com os cotovelos ou só terminar de ler o e-mail com um "Hum, que bacana".

"Faça as malas!", ele bate palmas.

"Mas, pai...", minha voz vacila, "...Oxford?"

"Vida nova, Anny, você vai estudar no Reino Unido!"

Desde que consigo me lembrar, meu pai sempre foi assim, o cara que me incentiva a viver altas aventuras, me dedicar a amores intensos e me arriscar por minutos de intensidade. Assim é Adam Bittencourt, minha catapulta dos grandes sonhos, e eu sou grata por isso. Mas Oxford... parece um degrau em falso.

"Anny?", ele me desperta dos meus pensamentos.

"Hum?", desvio o olhar, "Bem, vou pensar sobre isso."

Passo o resto da tarde grifando trechos de livros, um dos meus hobbies habituais. Um marca texto azul, o outro amarelo... e algumas dezenas de frases icônicas ou nada importantes da coleção de romances da minha ingênua estante de madeira. "Não é o tempo nem a oportunidade que determinam a intimidade, é só a disposição", dizem francamente as linhas de Jane Austen, em Razão e Sensibilidade. Ou "Meu caminhar não é leve, não sei flertar e, da última vez em que tentei usar um leque, acertei o olho de alguém", cochicha Julia Quinn em Uma Dama Fora dos Padrões. Me deixo formar covinhas nas bochechas do quão divertido é este passatempo. Pelo menos me distrai consideravelmente do fato de que tenho uma decisão a tomar.

Ir a Oxford? Mudar de país? Isto é loucura, não é? Eu teria de deixar tudo para trás: minha casa, Nick, Amanda, a Coffeeners, Lia... mas, sobretudo... a lembrança do meu pai. Cresci e vivi toda a minha vida na Califórnia, fui amada e criada por homens que abririam mão de qualquer coisa pelo meu sorriso. Por que eu deveria abandonar tudo isso agora?

"Ah...", suspiro, fechando o livro que tenho em mãos e apoiando os braços nos joelhos para olhar através da janela do quarto, "...será que vale a pena?" 

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⏰ Última atualização: Aug 19 ⏰

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