08

219 32 14
                                    

De volta à área principal, Sarah se acomodou na poltrona ao lado da dela, um braço equilibrado sobre o joelho dobrado.

Reclinada em seu próprio assento, e com Sarah descansando na cadeira vizinha, Juliette tratou de aceitar sua proximidade, e elas ficaram observando as chamas dançando, sonolentas, na lareira.

Com um suspiro, ela tentou deixar de lado todos os aspectos negativos da situação e se concentrar naquele momento de paz: ouvir um ou outro estalo na queda das cinzas, inalar o aroma de café fresco, ciente de que a neve caía mais suave lá fora...

Por tudo isso, Juliette não se encontrava nem um pouco preparada para a pergunta sombria que ouviu:

— Juliette, o que aconteceu com seus pais?

Uma onda gelada, que logo depois passou a queimá-la, inundou-lhe o estômago. Sarah a pegara de surpresa.

Ela não falava sobre o passado. Havia custado muito deixá-lo para trás.

No entanto, elas nunca mais se encontrariam e, embora Sarah estivesse curiosa no momento, ela podia apostar que ela iria esquecê-la, e também a sua história, bem antes do que ela própria.

Após pensar nos anos que passara em seu lar adotivo, por algum motivo Juliette sentiu uma estranha necessidade de desabafar.

— Eu gostaria de acreditar que minha mãe me amou. Mesmo que eu não tenha sido resultado de uma história de amor. Minha mãe adotiva me contou, quando eu ainda era muito pequena, que minha mãe foi estuprada.

Sarah se voltou na poltrona, praguejando baixinho.

— Por favor, diga que essa criatura não cuida mais de nenhuma criança!

— Mantenho contato com algumas pessoas com as quais fui criada, e elas me asseguraram que Nora já está aposentada há muito tempo.

Parte do desgosto no rosto loiro se desfez.

— Não tem mais ninguém da família?

— Não. Meus avós queriam que minha mãe me desse. Ela lutou para me manter, mas, uma noite, não muito tempo depois de eu ter nascido, fui levada embora. Até hoje não sei como trataram da parte legal. Acho que alguns papéis devem ter sido forjados. Pelo visto, meus avós imaginaram que minha mãe fosse superar minha perda, que, eventualmente, ela fosse retomar sua vida, ou melhor, a vida que eles haviam idealizado para ela.

Porém, isso não aconteceu. Minha mãe saiu de casa e partiu na tentativa de me encontrar. — Juliette sempre sorria quando se lembrava daquela parte da história, porém nunca por muito tempo. — Sem dinheiro ou apoio, minha mãe acabou nas ruas. Soube disso tudo quando contratei um investigador particular há uns dois anos.

Ele descobriu que minha mãe morreu um dia antes de seu vigésimo aniversário.

Sarah tinha o maxilar cerrado, porém seus olhos brilhavam o suficiente para que Juliette visse neles seu próprio reflexo.

— E quanto a seus avós?

— Ambos faleceram. Até onde o detetive pôde afirmar, eles nunca tentaram me encontrar. Minha mãe era filha única, portanto também não tenho tios nem tias.

Ela abaixou a cabeça e a balançou uma vez.

— Sinto muito. Posso entender agora por que tomou essa decisão.

— Que decisão?

— De não ter uma família sua. Não deve ser fácil lidar com tudo isso. Perdoar tudo isso.

O perdão era um conceito estranho, Juliette refletiu, com os olhos fixos no fogo. Ela já tinha ouvido dizer que uma pessoa precisava perdoar os erros alheios a fim de prosseguir com a própria vida, e ela fizera isso sem ter sentido a necessidade de perdoar coisa alguma. Podia conter as lágrimas. Podia planejar o futuro com bom senso. Por isso mesmo prometera a si mesma não ter seus próprios filhos e, desde então, nunca mudara de ideia. Nunca pensara de forma diferente.

Mães Por Um Tempo  》Sariette || ADPOnde histórias criam vida. Descubra agora