Somos una casualidad llena de intención
(Somos uma casualidade cheia de intenção)
— Mario BenedettiEra cedo demais para se estar na frente do prédio da empresa, Kelvin sabia, mas o que podia fazer? Apenas torcer pro escritório estar aberto uma hora antes do que ele deveria chegar, e pra que Ademir não fosse a única pessoa lá dentro.
Respirou aliviado ao entrar e sentir um cheiro de café passado e uma voz profunda que cantarolava “vou te amarrar na minha camaaaaaa, só vai fazer amor comigoooooooo” completamente fora do ritmo.
Ramiro deu um pulo ao ver um reflexo dourado e bege na porta da geladeira, calando-se e virando-se rapidamente, para ver o cabelo de Kelvin brilhando como o mesmo sol que o iluminava.
Porém, tinha alguma coisa errada, claramente errada. O brilho do cabelo do garoto não se comparava com o dos seus olhos no dia anterior, já hoje…— Bom dia Kelvin, tudo bem? 7:57? Aconteceu alguma coisa? — disse olhando seu relógio de pulso
— eu juro que algum dia vou acertar o horário pra chegar, por agora tô fazendo iteração… segundo minha projeção em perto de cinco meses chegarei no valor x — disse fazendo um bico enorme, que nunca pensou mostrar para alguém de seu trabalho
— eu não posso acreditar que eu tô rindo de uma piada com álgebra — respondeu com um sorriso enorme — quer café? Tem uma caneca?
— Nossa, você com esse café me salvou — Sorriu, tentando se animas — mas ainda não trouxe nada pra cá, não tenho caneca… se bem que precisaria de um balde
— eu posso ter um vaso de flores, serve? — Disse enquanto tirava uma caneca grande do seu lugar no armário e servia café para o menor
— Obrigada, meu deus, é do darth Vader, eu amo star wars!
— Você não podia ser mais nerdola, né? — implicou, rindo daquele pequeno sorriso que tinha aparecido no rosto do loiro. É, ele sorrindo era ainda mais lindo, pensou
— Nossa, patada a essa hora? Só não vou falar nada porque me deu café
— Essa é minha especialidade, então eu posso te comprar com café?
— Café e chocolates sempre vão me conquistar
— Vou fazer uma nota mental, um dos meus trabalhos mais importantes é fazer os nossos felizes
Kelvin riu, “nossos”. O loiro tinha certeza que Ademir não o considerava um “nosso”, mas por algum motivos, talvez pelo tempo que fazia que ele não tinha um café tranquilo em um lugar onde se sentisse bem, de repente, se sentia um daqueles “nossos” de Ramiro.
No meio da cozinha de um escritório onde tinha se sentido extremamente mal no dia anterior, se sentia acolhido… não por aquela empresa ou seu chefe escroto, mas pela simplicidade do momento e pela companhia.
— Oi, tá aí? — perguntou Ramiro chacoalhando a mão na frente do loiro
— Desculpa, tô sim, você sempre chega tão cedo? — Perguntou tentando puxar assunto. Se alguns minutos antes não queria entrar naquele lugar por medo de quem estaria lá, agora não queria sair. Porque sair dali significava talvez se encontrar sozinho com Ademir, e isso era tudo o que não queria.
— Nesse último mês tenho muitas pendências para resolver. Quero deixar tudo pronto pra quando for embora — comentou, piscando rapidamente mas sentindo lágrimas que insistiam em se formar no canto de seus olhos
— Está feliz com a promoção? — perguntou, notando as emoções afloradas no preto
— Estou, é claro que estou, é um salário muito bom, mais responsabilidade mas mais benefícios — suspirou — mas eu já me acostumei com essa cidade, sabe? Meus amigos estão aqui, eu consegui achar que esse lugar seria meu lar — respirou, tentando se controlar — mas a gente nunca sabe o que a vida nos depara. Uma vez larguei tudo no Brasil pra vir pra cá, e foi a melhor decisão da minha vida. Quem sabe agora — o olhar que estava perdido na paisagem fora da janela voltou a focar, e se fixou nos olhos cor de mel que o olhavam, aquilo era? compreensão? Aqueles olhos brilhavam um pouquinho de novo, Ramiro sentiu a necessidade de sorrir em resposta — Mas é você? Deixar tudo pra trás tão jovem não deve ter sido fácil
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Duas vidas, dois mundos
FanfictionOnde Kelvin precisa começar de novo, mais uma vez, agora do outro lado do oceano. Mas a vida vai lhe fazer entender que não importa o recomeçar, o que te faz ser quem você é, não pode ser deixado para trás. Ou Onde Ramiro quer finalmente ir embora...