Ninguém é como você

Deveria ser eu

🌸 Mei Lee's POV

O ar era uma mistura de plástico e axilas de adolescentes. Escovei o cabelo rapidamente enquanto encarava meu reflexo no espelho do armário, tão velho que parecia gritar toda vez que eu o movia.

- Essa garota não tinha a personalidade de uma beterraba? - perguntou Abby, passando batom e olhando no meu espelho também. Abby preferia bagunçar sua porta com adesivos de gatinhos e fotos de homens sarados, então não tinha espaço para mais nada.

- Ela quis dizer que a Riley não tem personalidade. - disse Priya, séria igual todas as vezes em que nos falamos desde que a conheci.

- Ou que ela se resume a hockey e deu. Nada mais. - disse Abby. Eu reviro os olhos. Ao mesmo tempo em que queria defender a Riley, eu estava com um pouco de raiva. Nas últimas mensagens que trocamos, ela foi bem babaca.

"Oi! Quer falar sobre o que rolou?"

Resposta da Riley: "Não".

E deu.

Nunca mais tocamos nesse assunto.
A habilidade que ela tinha de fingir que um momento nunca aconteceu era admirável. Uma pena eu não ser assim. Fiquei tão magoada que contei algumas coisas para as meninas (Exceto a Miriam, por razões... Óbvias.) para desabafar e também receber algum conselho especial.

- Ela só está brincando com você. Quem ela quer realmente é a Valentina chatinha. Achei que você soubesse se valorizar mais, Meimei.

- Sobre o que vocês conversam, afinal? - perguntou Priya. - Aposto que ela deve só falar de si mesma.

- Não! Vocês não entendem. Ela sempre se interessa pelos meus assuntos, ela é uma pessoa ambiciosa e apaixonada que não sente medo de ir até o infinito por seu sonho. Ela me faz rir de um jeito muito bom, e eu também faço ela rir! Ela me acha engraçada! E sei lá parece que às vezes ela me provoca de propósito, não sei dizer...

Suspirei, relaxando os ombros que só então notei que estavam tensos. Embora eu pensasse todas essas coisas, no fundo eu sabia que era um sentimento bobo que não levaria a lugar algum. Talvez Abby estivesse certa, afinal Riley era mais velha e gostava de andar com gente que brinca com os outros. Semelhante sempre atrai seu semelhante.

- Eu não devia ter me apaixonado pela Riley. Só queria que isso parasse! - eu disse, batendo a cabeça na porta do armário.

- Do que vocês estão falando? - a voz de Miriam nos deixou em estado de alerta. As meninas tentaram disfarçar, mas acabaram deixando meio na cara.

- Por que não me contou que estava apaixonada? E pela Riley! Do meu time de hockey!

Miriam soava alegre e interessada, mas eu a conhecia bem demais para entender o que seu coração queria dizer.

- Faz quanto tempo que vocês estão escondendo isso de mim? - ela perguntou, frustrada.

- Eu não contei porque... - eu hesitei. Miriam me fitou com expectativa. - Eu não queria te machucar.

- Qual é! Do que você está falando? - ela deu risada do jeitinho descolado de sempre. Eu olhei fundo nos seus olhos, séria.

- Você sabe do que estou falando.

Abby e Priya trocaram um olhar constrangido e saíram de fininho, me deixando a sós com Miriam. Por um instante, Miriam tropeçou nas palavras, tentando me enrolar. Eu continuei com meu semblante de quem não queria perder mais tempo, e então ela apenas pôs tudo para fora.

- Eu sei que você gosta dela. Aquele dia no karaokê, eu vi as mensagens em seu celular.

- Você bisbilhotou o meu celular?! - perguntei, irritada.

- Você ficou um tempão mexendo nele! Eu fiquei preocupada. E sinceramente o Tyler me desafiou a fazer isso em troca de um amendoim torrado.

Segurei minha risada. Isso era a cara da Miriam.

- Não devia ter invadido minha privacidade. Agiu como se fosse minha mãe. - eu disse, cruzando os braços.

- Fala sério. Mesmo se eu não tivesse visto as mensagens de vocês duas claramente flertando, não seria difícil descobrir considerando que você tem falado muito nela ultimamente.

- Como é?

- Você pode não saber disso, mas eu lembro de cada coisinha que você me fala. E eu sei quando você finge estar interessada nos meus treinos só para saber da Riley.

Senti uma onda forte de remorso e vergonha. Eu estava sendo uma péssima amiga com Miriam, e ela nunca deixou de me tratar bem apesar de ter suas desconfianças.

- Do contrário do que você pensa, isso não me machuca. Porque eu sei que um dia você vai acordar dessa fantasia bobinha que acha que está vivendo e finalmente perceber que deveria ser eu a pessoa que faz você rir, que te faz companhia e se esforça para ver seu sorriso brilhar todos os dias. Poxa! Você me conhece melhor que ninguém, e eu te conheço tão bem quanto sua própria mãe! Eu adoro quando você apresenta seus trabalhos e fica falando e falando sem parar uma porção de palavras inteligentes que quase ninguém entende. E eu gosto do jeito que você escova as bochechas quando está nervosa. Gosto muito de você, Meimei. Mas o que eu sinto é real, e eu vou provar isso pra você sendo paciente. Eu prometo que vou esperar, porque eu não quero mais ninguém. Só você. - disse Miriam, segurando meus ombros.

Fiquei imóvel e de boca aberta. Sem reação. Por sorte, o sinal tocou anunciando o começo da aula de matemática. Miriam se ofereceu para levar meus livros, como sempre.

- Olha só, sem pressão tá? Eu ainda sou sua amiga. - ela disse, me tranquilizando um pouco. Senti o ar meio pesado, mas Miriam se esforçou muito para disfarçar e me deixar a vontade. Diferente de outra pessoa.

Durante a aula, auxiliei Miriam em alguns exercícios que ela tinha dificuldade. Ela rabiscou pequenos corações na minha mesa, e eu a repreendi pelo vandalismo. Miriam era adorável.