Capitulo Onze

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Manuel Ferrari:

O som suave da chuva batendo contra as janelas foi o primeiro sinal de que o novo dia havia começado. As gotas escorriam pelo vidro, formando padrões aleatórios que desapareciam tão rápido quanto surgiam, como pensamentos efêmeros que se perdem na pressa da mente. A manhã estava envolta em um cinza pálido, a luz do sol obscurecida pelas nuvens densas que cobriam o céu, refletindo perfeitamente o clima que pairava dentro de mim.

Levantei-me da poltrona onde havia adormecido algumas horas antes, o corpo protestando com uma leve rigidez causada pela posição desconfortável. A sala de estar ainda estava imersa em uma penumbra tranquila, exceto pela fraca iluminação que atravessava as cortinas entreabertas. O silêncio era quase absoluto, quebrado apenas pelo sussurro distante da chuva e pelo tique-taque suave do relógio na parede.

Eu me movi lentamente, como se cada passo precisasse ser deliberado, consciente. Peguei o controle remoto sobre a mesa de centro e liguei o sistema de som. Uma música suave e instrumental começou a preencher o espaço, acompanhando o som da chuva lá fora, criando uma harmonia que parecia quase relaxante, mas que não conseguia penetrar na camada de pensamentos que envolvia minha mente.

Olhei ao redor, observando as sombras suaves que dançavam nas paredes. Tudo parecia tão comum, tão familiar, mas havia algo diferente, algo que não conseguia identificar, mas que estava lá, pairando sob a superfície. Talvez fosse o resquício das emoções da noite anterior, ou talvez fosse o simples fato de que, por um breve momento, eu havia sentido algo diferente — algo que me havia dado um vislumbre de que a vida ainda poderia me surpreender.

Caminhei até a cozinha, cada movimento meticuloso, como se seguir um ritual. A chaleira foi colocada no fogão, e enquanto esperava que a água aquecesse, me permiti um momento para refletir. Pietro, o beijo na bochecha, a sensação de que algo estava mudando... tudo isso girava em minha mente, mas eu sabia que não podia me deixar levar por essas emoções. Precisava de clareza, de controle, porque era isso que sempre me manteve de pé, não importava o que acontecesse.

A chaleira começou a assobiar, trazendo-me de volta ao presente. Desliguei o fogo e preparei o chá, o aroma suave das ervas se misturando ao ar, trazendo um conforto temporário. Com a caneca quente nas mãos, voltei para a sala de estar e me sentei novamente, desta vez no sofá, olhando para a chuva lá fora.

Enquanto tomava um gole do chá, deixei meus pensamentos vagarem para o que viria a seguir. Havia tanto a fazer, tanto a considerar, e eu sabia que precisava estar preparado. Mas por agora, tudo o que eu tinha era o silêncio, a chuva e as sombras suaves que continuavam a dançar ao meu redor.

Devo admitir, minha casa é silenciosa — tão silenciosa que, às vezes, o próprio silêncio parece ter uma presença tangível, como um espectro que sussurra nos cantos dos cômodos vazios. Tem sido assim nos últimos cinco anos, desde que minha irmã se foi. O tempo passou, mas o vazio que ela deixou permanece, preenchendo cada espaço com uma quietude que antes era desconhecida.

Antes, o som de nossas conversas ecoava por essas paredes, trazendo vida e calor para cada cômodo. Lembro-me das tardes em que nos sentávamos juntos, rindo de algo bobo ou discutindo sobre as coisas mais triviais. Era um som reconfortante, familiar, que dava à casa um pulsar próprio, como se ela estivesse viva, respirando junto com a nossa conexão.

Agora, sem ela, essa vitalidade se foi. E embora eu tenha aprendido a conviver com a solidão, ainda há momentos em que sinto falta desesperadamente das nossas conversas. Às vezes, pego-me falando em voz alta, como se esperasse ouvir a resposta dela, como se por um instante, o passado pudesse ser trazido de volta, e o silêncio fosse substituído por aquela voz que eu tanto amava.

Meus Príncipes Encantados (MPreg) | Spin-off Do Livro Memórias Do Seu CoraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora