RETALHOS - Bask

Trinajsti. - "Qual o teu problema!?"

- Entra, tá aberto! - gritei de dentro do apartamento para Apollo que acabava de chegar

- Oi. - ele entrou e pude reparar seu semblante sério mas era indecifrável

Apollo sempre foi uma pessoa difícil de se lidar, em momentos de estresse ele se descontrola, extremamente ciumento e depois fica com peso na consciência por atrapalhar minhas relações, nem sempre suas atitudes são pensadas racionalmente mas as vezes ele mesmo se prejudica.

Eu sabia que essa era mais uma das vezes em que teríamos que conversar e nos alinharmos de novo. Apesar de marrento, Rogério é sentimental e sofre muito por tudo, se cobra de mais, carrega alguns fardos que não são dele mas mesmo assim ele escolheu carregar.

- A gente precisa conversar. - ele se pronunciou se jogando no sofá

- Fala, tô toda ouvidos. - falei sem tirar os olhos do celular

- Sou muito orgulhoso pra pedir desculpa mas como é você... - ele coçava a nuca, aparentemente nervoso - eu peço desculpas, assumo que errei.

- É sempre a mesma história, você faz merda e eu te desculpo, tu vai lá e faz de novo. Cresce um pouquinho, tu já é adulto formado e pra certa coisas você é tão esperto. - desabafei

- Mas eu juro que não foi de propósito! - ele falou num tom de voz mais alto - Você fica puta comigo por qualquer coisa, quem deveria crescer é você.

- Porra Rogério! - exclamei alto e ele me olhou com os olhos arregalados - Você tá querendo que eu seja aquela menina de quatro anos atrás. Eu tô praticamente sozinha, não conheço muita gente. Achei que você iria me apoiar mas tu não consegue fazer isso.

- Sozinha cê não tá, você tem o Guri. - murmurou baixo num tom irônico

- Talvez porque ele seja o único que tá me apoiando. Você conhece todo mundo, eu não conheço ninguém. Tu acha que eu me sinto como? Feliz? - suspirei - Nós nunca paramos de ser parceiro mas é foda tentar apoio de alguém que não dá a mínima.

- Não dou a mínima!? E tudo o que eu já a gente fez um pelo outro, não conta? - ele continha certa raiva na sua voz

- Conta, claro. Eu serei eternamente por todo incentivo que você me deu, isso foi essencial e sempre fiz questão de deixar claro. - pausei - Pode parecer insanidade mas as vezes eu sinto que você quer que eu me pareça com ela e eu nunca vou conseguir ser.

- Para de ser maluca Ayanna, nunca passou pela minha cabeça isso. Ela nunca foi pauta das nossas discussões, deixa ela fora disso. Por favor. - meus olhos se encheram de lágrimas e um aperto no peito me invadiu

- Será mesmo? Você sempre idealizou ela em mim, me disse isso um pouco antes de eu ir embora. - falei num tom mais baixo procurando por ar

- Nunca! Eu sei bem o que você é e gosto de ti assim.

- Você falou isso bêbado, Rogério! Enquanto eu cuidava de você. - gritei e logo depois me encolhi no longo sofá

- Por que nunca me disse antes? Resolveu guardar pra ti, nunca me lembrei disso. - agora sua voz era baixa, continha tristeza e um pouco de desespero

- Eu simplesmente preferi manter tudo como estava, já sabia que não ia ficar por muito tempo.

- Caralho Ayanna, nunca me falou isso porquê? Qual o teu problema!?

- Deveria ter falado, acabado com isso de uma vez por todas.

Nós conversamos mais um pouco mas nada que fosse resolver a atual situação de forma significativa. Por um lado ele se sentia traído por eu não ter contado uma atitude do próprio e por outro eu me sentia triste pela situação só ter se agravado.

Me aproveitei do meu sentimento aflorado e decidi fazer o que eu sei fazer de melhor. Música.

Meu estúdio estava completamente desorganizado literalmente virado do avesso, eu aproveitei para arrumar tudo ouvindo uns bons pagodes.

- Eu sou o cara que seu ex vai odiar, sua mãe vai amar e você nunca vai esquecer. - cantarolei terminando de arrumar a cozinha

Meu celular pessoal vibrou em cima do mármore, me questionei quem poderia ser mas resolvi olhar.

- Bask? Lá vem bomba. - comentei sozinha enquanto desbloqueava o celular e entrava no Instagram

JorgeBask

- Eai Kieza, suave? Fiquei sabendo que você e o Apollo bateram neurose, que fita foi essa?
Oi Bask. Isso é um assunto pessoal nosso que não vem ao caso agora. Não entendi a cobrança. -

- Não é cobrança nenhuma, foi mal se tu entendeu assim. O mano tá malzão aqui do meu lado.

Eu também fiquei mal mas não fui chorar pra ninguém... -
*visto

- É cada coisa que me aparece. O cara barbado querendo pagar de nenêzão, era só o que me faltava. - me alonguei e fui tomar um banho que tirasse todo o cansaço que eu sentia

Achei que depois do banho eu teria paz mas como ainda é a minha vida, com certeza eu não tenho paz.

Nesse exato momento a Marina teve um surto e enjoou do Mu540.

- Marina Vicente! Para com isso, que coisa boba.

- Não é amiga, não é. Tô chateada, ele me trocou por música! - ela gritou chorosa do outro lado do telefone

- Então vem embora ué, você tem carro.

- Eu não quero deixar ele aqui mas ele vive no estúdio.

- Puta que pariu Marina, resolve a tua vida não posso fazer isso por ti. Tchau.

Finalmente voltei ao Rio. Estranho né?
Eu meio que surtei de madrugada e quis vim pra casa dos meus pais, precisava de colo, de acolhimento e de amor, as vezes sair da cidade cinza é bom.

- Oi meus véio'! - os dois atenderam a porta de pijama e um bolinho na mão

- Meu amor! Entra, trás tudo. - minha mãe me abraçou e sorriu alegre

- Eu coloco isso no quarto, deixa comigo. - meu pai beijou minha testa e levou a única mochila que eu tinha

- Vou dormir aqui só por hoje, na real eu vim pegar a chave da minha goma mas eu queria ficar um pouquinho com vocês. - falei sorrindo e minha mãe assentiu

A gente ficou conversando por bastante tempo, eles ficaram bebendo e eu tomei meu Toddynho quente.

Tiveram momentos que eu fiquei apenas observando os dois conversando e se provocando, ele são eternos adolescentes e nunca perderam isso no relacionamento e é a coisa que eu mais admiro.

Um namoro de escola virou coisa séria e até hoje eles estão juntos, foram feitos um para o outro e sabem disso.