Era hora do almoço e minha mãe fez sua típica feijoada, me remetia a minha infância e os bons momentos em família que nós tínhamos juntos, de muitas risadas, brincadeiras e som alto.
- Tô te achando tão murchinha, aconteceu alguma coisa? - minha mãe quebrou o silêncio que havia se estabelecido entre nós duas
- Nah, tá tudo bem. - continuei focada em lavar a louça, se eu falasse mais alguma coisa iria chorar
- Fala logo Ayanna, fui eu que te pari e te conheço muito bem. - ela disse num tom de ameaça mas ainda assim brincalhão
- Apollo. - foi a única coisa que eu disse antes do meu coração acelerar e eu começar a chorar
Ela me abraçou carinhosamente enquanto fazia carinho no meu cabelo ainda úmido, com o braço envolto em minhas costas ela me guiou até o sofá de forma cautelosa.
Eu chorava desesperadamente, soluçava até meu pai trazer um copo de água para mim. Os dois sentaram do meu lado e me abraçaram, por mim tudo poderia acabar ali que nada mais importaria.
- Eu sinto falta dela, eu perdi minha melhor amiga. - falei entre soluços e meu pai encostou sua testa na minha
- Ela tá em paz meu amor, tá vendo a gente lá de cima.
Ela, quem é ela?
Minha irmã, Carol ou mais conhecida como Hyru. Morreu aos 18 anos na porta da minha, overdose de cocaína. Minha melhor amiga, meu amor, minha maior inspiração, minha referência que morreu em meus braços.
Conheci o Apollo através dela, como ele mesmo diz, ela era sua grande paixão, sua melhor amiga, companheira e sua garota como ele a chamava. Carol sempre incentivou ele com as batalhas e em tudo no geral, era uma relação de cumplicidade, amor, amizade e muito carinho.
Essa bucha sobrou para mim após alguns meses de sua morte, Rogério projetou ela em mim e eu jurava que alcançar os padrões que ela tinha realmente ajudaria ele a lidar com o luto.
Foi um rombo enorme na família mas acabou ficando mais unida do que nunca. Depois do ocorrido nunca mais tocamos no assunto apenas lembramos de momentos engraçados em que ela estava inclusa, mas fora isso esse fato é velado na minha família. Nem sei bem ao certo o motivo mas não serei eu que vou reviver esse grande trauma.
Eu tenho inúmeras músicas baseadas nela, tenho tatuagem com seu nome e coisas que gostava, ela realmente foi a minha maior inspiração. Foi quem me levou para fazer a primeira trança, me deu o primeiro skate, me viu ganhando a primeira folhinha mas não deu tempo de me ver ganhando o nacional.
" Hoje é um dia muito especial, né segredo pra ninguém. Eu quero dedicar essa conquista para alguém extremamente especial, que foi minha melhor amiga, minha parceira de vida e minha malokeira favorita. Carol, esse prêmio é por você, pela gente e pela nossa família. Eu vou te amar até que minha memória se vá."
Essa foi a primeira parte do meu discurso no Nacional, todos que conheciam a minha história se emocionaram e se sentiram tocados mas eu sabia que ela estaria com o seu sorriso largo e seu piercing que enfeitava seu lábio, eu tinha essa imagem quase como uma certeza mas quando abri os olhos vi aquele mar de gente e ela ainda não estava lá.
- O que aconteceu com o Apollo, filha? - minha mãe perguntou nervosa
- A gente brigou feio mas feio mesmo. - reafirmei e ela fez uma cara de espanto
- O que aconteceu? - ela estava aflita, sua perna mexia sem parar contra o chão enquanto meu pai mantinha uma expressão serena - Vocês só bateram neurose?
- É, o nome da Carol voltou para nossa conversa. - disse decepcionada - Ele acabou falando algumas coisas mas nada sobre isso e depois tentamos conversar mas não deu muito certo.
- Poxa meu anjo, tudo vai se acertar viu? Confia que sempre dá certo, com ou sem ele você continua seguindo seu caminho.
- Eu quero seguir com ele mas aparecem várias que sabem me valorizar, aí complica.
- Calma bem, cê de cabeça quente não vai ajudar em nada. - meu pai se pronunciou e logo saiu da sala
Eu consegui me acalmar, em seguida me senti culpada por dar tanto trabalho aos meus pais em comparação aos meus irmãos que nunca deram nenhum tipo de preocupação para eles.
- Mãe, tô indo pra casa. - comentei enquanto guardava o último copo na estante
- Mas já!? Achei que você ia passar mais dias com a sua mamãezinha querida. - ri do seu drama - Pelo menos vem almoçar aqui nos dias que você ficar.
- Tá bom, venho sim.
- Tô afim de fazer um churrasco daqueles brabão. - meu pai comentou contente
Quem ouvia nossas conversas facilmente acharia que nós éramos nascidos no Rio e todos os três o meu pai foi o que mais pegou sotaque e as gírias também. Era engraçado ouvir meu pai falando assim, parece um adolescente mas é apenas uma pessoas de 54 anos em mais um dia normal.
- Eu fecho! - falei animada - Vai chamar quem? Os de sempre?
- Sim senhora, pegar aquela casa lá e fazer lá mermo'. - minha mãe disse
- Beleza então, só me avisem para eu me programar certinho.
- Família Ríncon Andrade, estou lhes deixando mas volto em breve com a minha ilustre presença. Qualquer coisa é só mandar uma carta até a minha humilde residência. - brinquei e eles sorriram - Agora falando sério, beijo procês'! Fui!
Organizei toda minha casa ao som da minha playlist que vai de Gilberto Gil até um funk da pior qualidade possível.
- Sei que cê me entende bem, Marília leoa gostosa, posso te ligar meu bem? O que cê tá fazendo agora? - cantei abraçando a vassoura e logo a campainha tocou - Ih, chamei ninguém não.
Olhei pelo olho mágico e era Stephan sozinho. Abri a porta e ele sorriu pra mim.
- Oi, tá fazendo o que aqui?
- A mãe falou que cê tava na bad, vim te ver. - ele entrou e se jogou no sofá ligando a TV
- Marina sabe disso? - ele afirmou - Tá bom, já jantou?
- Já, mas tô na broca ainda.
- Só anda fumando, obviamente a larica ia bater.
Aquela noite foi uma imersão para fugir da realidade, os dois precisavam disso e nem sabiam. As conversas as vezes eram trocadas pelo silêncio mas que continham muitas palavras, as risadas eram substituídas por lágrimas Mas nem sempre era de tristeza. Tanto Stephan quanto Ayanna conseguiram deixar Sain e Kieza de lado e serem eles mesmo sem preocupação com a imprensa, os flashes e fãs.
- num gostei mto nn.
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RETALHOS - Bask
Fiksi PenggemarApós um longo tempo focada em sua carreira musical, Ayanna ou melhor, Kieza mc decide retornar às suas origens, as batalhas de rima. Entre velhos e novos conhecidos um em específico a chamou atenção, Jorge Bask. "Acho que minha vida é isso... 'uma...