Capítulo V: Garoto Vira-Lata

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Quando eu penso no conceito do pós-vida e coisa e tal, eu penso em algo bem clichê. Nuvens, anjos cantando, esse tipo de coisa. O que eu não imaginava, no entanto, era que eu ia acabar parando em uma floresta junto com o cheinho e o amigo levemente metrosexual dele. Se isso fosse algum tipo de "fila de espera" ou sei lá, então tudo bem, tranquilo Deus! Eu consigo esperar para entrar nos portões do céu. Vovó me ensinou a ser paciente, uma das virtudes que me faria ir para o paraíso ou blablabla, mas eu bem que queria um lugar melhor para esperar o julgamento divino.

Se não fosse isso, então a outra opção era de que esse era o sonho mais estranho de toda a minha vida. Na real, era até que acreditável no início: invadir o orfanato bonitinho, roubar uma grana boa e meter o pé. Eu precisava do dinheiro, não só por ganância — e eu admito que eu ia guardar uma parte pra mim — como por sobrevivência. Digamos que eu acabei tendo problemas com um cara que "empresta dinheiro com juros altissimos", e agora o meu pescoço estava em jogo. Logo, faria sentido sonhar com um roubo assim, certo? Eu concordo! Só comecei a duvidar quando apareceu a cobra gigante, o meio-bode e o poodle teletransportador, não necessariamente nessa ordem de absurdo.

— Ok, a gente saiu do orfanato, viemos parar numa floresta e... — eu começo a tentar racionalizar aquilo, visto que se eu perceber que é um sonho, talvez eu conseguisse acordar. — Quem são vocês?

— Quem é você.

O loirinho diz enquanto me olha com muita suspeita. Eu já estava acostumado com isso, mas uma parte minha ainda queria botar o pé na frente dele enquanto ele anda, só pra ver o que acontece.

— Já disse, amigão, eu sou o consertador de cofres.

— Você não percebeu que essa mentirinha não colou? — o cheinho diz enquanto aponta o livro como se fosse uma espada afiada. — Cofre nem tem que ser consertado!

Óbvio que tem? — eu me sinto legitimamente indignado com a afirmação dele. Digo, como que esse cara espera que não tenha que consertar um cofre? — Tá, olha, vou abrir o jogo com vocês. Sim, eu queria passar a mão no que tinha dentro do cofre.

— Eu sabia!

O loirinho me interrompe como se tivesse descoberto algo fenomenal. Amigo, você me encontrou escondido em uma fogueira todo sujo de carvão depois de encher o cofre de porrada, precisava de mais do que isso pra entender o que tava acontecendo? Não, e isso me fez ter que segurar a vontade de chamar ele de "animal" ou "imbecil" diversas vezes.

— Mas olha, eu não fazia ideia de que ia ter um bode fedido e uma cobra gigante!

— Bode fedido? Não fala assim do senhor Underwood!

O cheinho ameaça e joga o livro em minha direção, e o "projétil" cai na minha frente sem nem ousar fazer contato comigo. Aquilo foi tão deprimente que até o amigo dele parecia ter ficado meio envergonhado, colocando a mão no ombro do moleque e fazendo um não com a cabeça. Tentando ignorar isso pelo bem dele, eu pego o livro no chão e finjo interesse. A verdade? Eu não decifrei uma única palavra no livro, pelo importante detalhe de que eu não sabia ler. Ou... eu ainda estava dormindo, pois uma vez ouvi alguém dizendo que você não consegue ler em sonhos.

— Que interessante... aqui diz que- — eu começo a tentar fingir e vejo os dois me encarando sérios. Sem vontade de me humilhar com isso, eu entrego o livro de volta e finjo uma tosse. — Olha, desculpa falar mal do seu... o que ele é mesmo?

— Ele é o dono do orfanato, ele cuida da gente. — o cheinho diz sem parecer muito interessado nas minhas desculpas. — Eu não sei se você percebeu, mas apareceu uma cobra gigante e agora a gente tá no meio do nada, e se alguma coisa tiver por perto?

Os Heróis do Novo Olimpo: O Filho das ChamasOnde histórias criam vida. Descubra agora