୨୧ Las Vegas :: 12

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Las Vegas em 2026 era uma cidade que nunca dormia, uma selva de luz que pulsava com uma energia incontrolável e inconstante, quase como um reflexo da vida de Rosé. Ela se via presa em uma rotina sem fim, onde os dias se misturavam às noites, e o tempo parecia uma linha indefinida que se arrastava sem sentido. Ela havia fugido do Texas com o coração partido e as malas cheias de expectativas vazias, acreditando que poderia reinventar sua vida na cidade que prometia tudo, mas que, na verdade, não entregava nada além de ilusões.

A rotina de Rosé era um ciclo exaustivo de trabalhos aleatórios e relacionamentos sem sentido. Durante o dia, ela dava aulas de russo para os seus alunos, Às vezes, conseguia uns bicos como assistente de tradução. Mas também Nada que pagasse bem, nada que a fizesse sentir alguma conexão com algo real.

Quando o sol se punha e as luzes brilhantes de Las Vegas tomavam conta do cenário, Rosé mergulhava em uma vida ainda mais sombria. O apartamento que alugava com dificuldade em uma área distante da Strip era minúsculo, com paredes finas e o cheiro constante de fumaça de cigarro e umidade. Era um reflexo físico do caos que tomava conta de sua mente. Cada canto do lugar parecia sussurrar fracasso, lembrando ela constantemente do que ela tentou escapar e do que nunca conseguiu alcançar.

Ao entrar no apartamento, Rosé largou sua bolsa no chão e jogou-se no sofá, um móvel velho que já tinha visto dias melhores. O silêncio a engolia, e tudo o que conseguia ouvir eram seus próprios pensamentos, caóticos e incessantes, misturados com o som distante de sirenes e o burburinho constante da cidade que nunca parava.

Las Vegas era isso — um vício disfarçado de refúgio, um abrigo para aqueles que queriam esquecer. E Rosé estava perdida em sua própria espiral, carregando um vício que começou como uma fuga e agora era uma corrente que a prendia a cada dia mais. Os remédios que Lalisa lhe apresentou, em um passado que parecia uma vida atrás, haviam se tornado um hábito do qual ela não conseguia se desvencilhar. As pílulas coloridas, escondidas em potes no armário do banheiro, eram como velhos amigos que a puxavam para um sono inquieto e a mantinham dormente durante o dia.

Ela acendeu um cigarro e observou a fumaça subir, se dissipando no teto manchado. A nicotina queimava sua garganta, um desconforto familiar que, de certa forma, a fazia sentir algo. Qualquer coisa era melhor do que o vazio que a engolia. As noites eram ainda mais difíceis. As festas que antes eram um escape ao lado de Lalisa agora se tornaram um fardo. Ela vagava pelos bares e cassinos, encontrando-se em mesas de pôquer onde gastava os poucos dólares que tinha, apostando na esperança de ganhar algo, qualquer coisa, mesmo que fosse só a sensação momentânea de vitória.

Rosé também tentou se perder em alguns relacionamentos, buscando algo — ou alguém — que pudesse preencher o vazio. Mas todos os relacionamentos terminavam em desastre, uma coleção de noites mal dormidas, brigas intensas e silêncios constrangedores que diziam mais do que palavras. Havia tentado se conectar com pessoas diferentes, algumas pareciam promissoras no início, mas todas acabavam da mesma forma: ela se via abandonada ou fazendo o papel da pessoa que fugia. Um ciclo interminável de desilusão.

A memória de Lalisa pairava sobre ela constantemente, como um fantasma que ela não conseguia exorcizar. Por mais que tentasse esquecer, ainda via o rosto de Lalisa nas ruas, nas festas, em todos os cantos escuros de Las Vegas. Sentia falta das risadas, das noites sem fim, das conversas sobre tudo e nada. Mas, acima de tudo, sentia falta de como Lalisa a fazia sentir viva. Agora, tudo parecia uma sombra do que era.

Rosé se lembrava claramente da última vez que viu Lalisa, quando ainda estavam no Texas. A garota rebelde e vibrante, cheia de contradições e cicatrizes, que a havia arrastado para um mundo que ela nunca teria ousado explorar sozinha. Aquela garota que sempre carregava um brilho nos olhos, mesmo nos momentos mais sombrios. Rosé nunca havia entendido completamente Lalisa, e talvez nunca entenderia, mas sabia que a amizade delas tinha sido a âncora que a mantivera firme por tanto tempo. Sem Lalisa, Rosé sentia como se estivesse à deriva.

Ela deixou o cigarro se apagar no cinzeiro e foi até a janela. As luzes de Las Vegas cintilavam ao longe, um mar de cores que tentava seduzir os olhos e a mente. Mas para Rosé, aquelas luzes não eram mais do que um lembrete constante do quanto ela havia perdido. Fechou os olhos, tentando bloquear os flashes de memórias, mas tudo o que conseguia ver era Lalisa sorrindo, jogada em um sofá, cantando músicas em idiomas que Rosé nunca entenderia completamente.

Ela pegou uma garrafa de vodka da prateleira, a mesma que estava lá desde a última festa que tinha dado sozinha. Bebeu direto do gargalo, sentindo o líquido queimar enquanto descia. A bebida fazia com que as coisas ficassem mais fáceis, mesmo que por alguns minutos. Fez com que as memórias fossem menos cortantes, as saudades menos pesadas.

As horas passavam lentamente, e Rosé se via encarando o vazio de seu apartamento, pensando nos caminhos que a levaram até ali. A garota que um dia sonhou em se tornar uma escritora agora se contentava em escrever rascunhos desconexos em um caderno velho, rabiscando histórias que ela nunca teve coragem de finalizar. Ela tinha uma pilha de manuscritos, todos inacabados, que começavam com promessas de algo grandioso, mas sempre terminavam abruptamente, como se a vida real a lembrasse de que ela nunca conseguiria terminar o que começava.

Durante aqueles meses em Vegas, Rosé se tornou uma especialista em esconder as próprias dores. Ela sabia sorrir nas horas certas, rir das piadas mais sem graça, fingir que estava bem quando tudo dentro dela gritava o contrário. Mas, no fundo, sabia que estava desmoronando, pouco a pouco. O peso de suas decisões, a culpa pelo que fez — e pelo que deixou de fazer — a atormentavam todas as noites.

As luzes de Las Vegas continuavam brilhando, indiferentes às dores e frustrações de Rosé. Ela sabia que precisava encontrar uma saída, um motivo para continuar. Mas por enquanto, tudo o que tinha era aquela cidade sufocante, suas bebidas, seus vícios e as memórias de uma amizade que, mesmo distante, ainda moldava cada decisão errada que ela tomava.

Rosé se deitou no sofá, sentindo o cansaço pesar sobre seus ombros. A noite estava só começando, mas para ela, parecia que nunca terminaria. Fechou os olhos, desejando que, ao menos em seus sonhos, pudesse encontrar um pouco de paz. Porém, mesmo em seus sonhos, Lalisa estava lá, sorrindo, bebendo, vivendo intensamente como sempre fazia, enquanto Rosé continuava presa em seu próprio labirinto de arrependimentos.

ᘡ    ۫    𖨂    𓈒   Querido Texas  ۟    ៹    𓂂Onde histórias criam vida. Descubra agora