୨୧ Álcool não ajuda em nada! :: 20

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O céu de Las Vegas estava opressivamente claro naquela manhã, o sol intenso revelando todas as falhas e rachaduras da cidade que, à noite, se escondiam sob um manto de luzes vibrantes e promessas vazias. Rosé estava sentada na varanda de um bar decadente, um cigarro aceso entre os dedos, tragando com a mesma urgência que alguém se agarrasse à última esperança. A fumaça subia lenta, se misturando ao ar quente e seco do deserto, enquanto o mundo ao redor dela seguia seu curso indiferente.

Fazia dias desde a última vez que tinha visto Lalisa. Dias que se estendiam como semanas, marcados por mensagens não respondidas, ligações ignoradas e o peso crescente de uma ausência que agora parecia mais um buraco no peito. Rosé tentava se distrair, se ocupar, mas tudo o que conseguia era perder horas entre o fundo de uma garrafa e a fumaça de seus cigarros, cada um queimando com o mesmo desespero que ela sentia crescer dentro de si.

Naquela manhã, Rosé descobrira que o quadro havia sido perdido. A última ligação de Lalisa, desesperada e cheia de desculpas, revelara que a impulsividade de um plano mal executado havia levado tudo embora. Rosé não sabia como reagir. Não sabia como processar o fato de que a única coisa que a conectava ao passado agora estava fora de seu alcance, talvez para sempre.

— Desculpa, Rose. Eu pensei que... — A voz de Lalisa ecoava em sua mente, repetindo as mesmas palavras incansavelmente.

Rosé apagou o cigarro no cinzeiro já cheio, o gesto quase automático enquanto tentava segurar as lágrimas que ameaçavam cair. O barulho da cidade parecia abafado, distante, como se o mundo inteiro estivesse coberto por uma névoa espessa. Ela não conseguia parar de pensar na última vez que tinha visto Lalisa, ambas bêbadas, presas em um ciclo interminável de erros e promessas quebradas. A amizade que tinham parecia desmoronar sob o peso de tudo o que elas haviam feito e deixado de fazer.

Rosé fechou os olhos, lembrando-se de cada detalhe da noite anterior. Ela estava sozinha em um bar, o terceiro da noite, com a cabeça pesada e o coração ainda mais. O álcool já não a deixava mais entorpecida como antes; era só um companheiro amargo, que fazia as memórias doerem ainda mais. Ela se lembrava de olhar para o copo, para a imagem distorcida de si mesma no reflexo do vidro, e de se perguntar em que momento tudo tinha dado tão errado.

— Você tá sozinha? — O barman perguntou, com um olhar de preocupação que Rosé não tinha mais paciência para responder. Ela apenas acenou, pedindo outra dose de algo que não sabia mais o gosto.

Cada gole era uma tentativa de preencher o vazio, mas nada parecia suficiente. Ela não conseguia parar de pensar em Lalisa, na dor nos olhos dela quando admitiu o que tinha acontecido, na maneira como sua voz falhou quando disse que tinha perdido o quadro. Não era apenas o objeto, era tudo o que ele representava. Todo o peso de suas memórias, de suas promessas silenciosas, de tudo que elas já haviam sido uma para a outra. E agora, tudo isso parecia se esvair, escorrendo pelos dedos como areia.

Do outro lado da cidade, Lalisa estava em um apartamento escuro, sozinha, com uma garrafa pela metade e os olhos vermelhos de tanto chorar. Ela sabia que tinha estragado tudo, de novo. A culpa era de uma presença constante, sufocante, que não a deixava respirar. Cada gole de vodka era uma tentativa inútil de calar a voz em sua cabeça, a voz de Rosé, cheia de mágoa e desespero, perguntando por que Lalisa sempre arruinava tudo.

— Eu te disse que a gente devia ter parado com isso, Lisa. Eu te disse que a gente tava indo longe demais.

Aquelas palavras ecoavam como um sino quebrado, ressoando por toda a mente de Lalisa enquanto encarava o teto, o copo vazio ao seu lado. Ela sabia que tinha passado dos limites, sabia que havia cruzado uma linha da qual talvez não houvesse voltas. Mas o que mais a destruía era o olhar de Rosé, o jeito como ela parecia tão... desapontada. Não era raiva, não era ódio; era algo muito mais profundo. Era o tipo de dor que não se cura com tempo.

Rosé deixou o bar e caminhou pelas ruas sem rumo, a cabeça baixa e os pensamentos embaralhados. Ela acendeu outro cigarro, tragando profundamente enquanto tentava ignorar o aperto no peito. A fumaça queimava sua garganta, mas era um tipo de dor com o qual ela já estava acostumada. A cidade brilhava ao seu redor, cheia de vida e promessas vazias, mas para Rosé, tudo parecia um borrão cinza, um lugar onde sonhos iam para morrer.

— Eu nunca deveria ter deixado chegar a esse ponto — Rosé murmurou para si mesma, jogando a bituca no chão e continuando a andar.

Ela passou por um hotel luxuoso, as luzes refletindo em seus olhos cansados, e por um momento, ela se perguntou como seria se tudo tivesse sido diferente. Se elas tivessem feito outras escolhas, se tivessem parado antes de chegar a esse ponto sem retorno. Ela queria culpar Lalisa, queria sentir raiva, mas no fundo, sabia que também era responsável. Elas haviam se perdido juntas, e agora estavam pagando o preço.

Rosé parou em frente a uma loja fechada, os letreiros apagados e as vitrines vazias. Ela se sentou na calçada, os olhos fixos no nada, sentindo o peso da perda apertar seu peito. A vontade de chorar era quase incontrolável, mas ela segurou. Chorar não vai mudar nada. Chorar não ia trazer de volta o que elas tinham perdido.

— Eu sinto tanto, Rosé. Eu sinto tanto por tudo — Lalisa havia dito.

Rosé se lembrou de como aquelas palavras soaram vazias, como se desculpas não fossem o suficiente para remendar o que havia sido quebrado. Ela pensava em todas as vezes que Lalisa havia prometido mudar, em todas as vezes que ela havia acreditado, apenas para se decepcionar novamente. Mas agora, diante da perda do quadro, Rosé se perguntava se havia algo ali que valesse a pena salvar.

— Eu não sei se consigo te perdoar, Lisa. Eu não sei se consigo continuar com isso

Lalisa, em seu apartamento, olhava para o celular, o nome de Rosé piscando na tela. Ela hesitou, o dedo pairando sobre o botão de chamada. Ela queria ligar, queria pedir perdão mais uma vez, mas tinha medo do que ouviria. No fundo, ela sabia que talvez fosse tarde demais para consertar tudo.

Rosé se levantou da calçada, apagando o último cigarro e decidindo que era hora de ir para casa. Ou pelo menos para o que restava dela. Ela caminhou lentamente, cada passo parecendo mais pesado que o anterior, e quando chegou ao apartamento, se jogou no sofá, os olhos fixos no teto. Ela pensou em todas as escolhas que a tinham levado até ali, em todos os momentos em que poderia ter feito diferente.

Ela pensou em Lalisa. Pensou em como a amizade delas tinha começado de forma tão inocente, em como havia se transformado em algo que nem as duas conseguiam mais entender. Ela queria odiar Lalisa, queria culpar alguém, mas tudo o que sentia era um cansaço profundo, como se estivesse lutando contra uma corrente que não a deixava seguir em frente.

— Talvez isso seja o fim. Talvez a gente nunca consiga se consertar

Rosé fechou os olhos, tentando encontrar um pouco de paz em meio ao caos. Mas a verdade era que não importava o quanto tentasse, Lalisa sempre estaria lá, em cada canto de sua mente, em cada memória e arrependimento. E isso, mais do que qualquer outra coisa, era o que doía mais.

O capítulo termina com Rosé encarando o vazio, enquanto Lalisa, do outro lado da cidade, se afunda ainda mais em seus próprios erros. As duas, separadas pela dor e pelas decisões impulsivas, se encontram em um ponto de ruptura que pode ser o fim definitivo ou o começo de algo novo, embora incerto e perigoso.

ᘡ    ۫    𖨂    𓈒   Querido Texas  ۟    ៹    𓂂Onde histórias criam vida. Descubra agora