୨୧ "Resolvidas" :: 19

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Las Vegas parecia mais fria naquela noite, como se o brilho incessante das luzes neon e o barulho das ruas cheias de vida não conseguissem aquecer o vazio que se instalara entre Rosé e Lalisa. A cidade que um dia fora o cenário de seus maiores excessos agora parecia um palco decadente, onde cada canto trazia uma lembrança que elas prefeririam esquecer. Rosé estava sentada na sala de estar do pequeno apartamento que dividiam ocasionalmente, com os olhos perdidos na fumaça do cigarro que ela segurava entre os dedos.

Lalisa entrou pela porta com passos pesados, o rosto pálido e o olhar distante, como se já tivesse enfrentado mil batalhas só naquele dia. Elas se encararam em silêncio por um longo momento, sem saber exatamente por onde começar. Havia muito a ser dito, mas as palavras pareciam grandes demais para caber naquele espaço apertado.

— A gente precisa conversar — Lalisa disse, jogando a jaqueta no sofá e acendendo um cigarro, as mãos trêmulas enquanto tentava manter a pose de quem não se importa.

Rosé bufou, desviando o olhar para a janela. — E desde quando a gente faz isso? Conversar? Você sempre corre, sempre arranja algum plano pra fugir da realidade.

Lalisa revirou os olhos, soltando a fumaça lentamente, como se estivesse pensando em cada palavra antes de soltar. — E você acha que eu sou a única fugindo? Olha pra você, Rosé. Olha onde a gente tá. Nada disso é só por minha causa!

Rosé se levantou, o cigarro caindo do cinzeiro. Ela sentia o peito arder de raiva e tristeza acumuladas. — Eu tentei me afastar, Lisa. Tentei arrumar minha vida, colocar a cabeça no lugar. Mas toda vez que eu penso que tô saindo disso, você aparece e me puxa de volta. E eu deixo, eu sempre deixo. Por quê?

Lalisa balançou a cabeça, tentando manter a calma que claramente estava escapando por entre os dedos. — Porque a gente é assim, Roseanne. Porque a gente sempre foi assim. Você acha que eu não tentei seguir em frente? Que eu não tentei esquecer? Caralho.

Rosé deu uma risada amarga, quase engasgada. — Seguir em frente? Lisa, você me arrastou para o inferno com você e nem olhou pra trás. Eu achava que... eu sei lá, que a gente tinha algo. Que isso tudo era mais do que essas merdas que a gente faz

Lalisa se aproximou, o rosto se contorcendo em uma expressão que misturava dor e arrependimento. — Você não entende, né? Não consegue ver o que sempre esteve bem na sua frente? Eu quis tanto, Rose. Eu te quis de um jeito que... eu nem sabia como lidar. Lá atrás, quando a gente ainda era só duas garotas no meio do nada. Eu pensava em você o tempo todo! Блять. (Merda.)

Rosé ficou em silêncio, as palavras de Lalisa batendo contra ela como uma onda inesperada. Ela sentiu o peso daquelas confissões, lembrando de todos os momentos que compartilhavam olhares que duravam mais do que o necessário, dos toques casuais que nunca eram só casuais, das noites em que dormiam juntas e o mundo lá fora parecia não importar.

— E por que você nunca disse nada? — Rosé perguntou, a voz embargada pela mistura de raiva e tristeza. — Por que você sempre fez parecer que era só diversão? Que eu era só mais uma das suas aventuras?

Lalisa deu um passo para trás, como se tivesse levado um soco no estômago. — Porque eu tinha medo, porra! Medo de perder você. Medo de você me olhar como tá olhando agora. E eu não queria estragar... qualquer merda que a gente tinha. Eu não sabia como te ter sem te destruir!

O silêncio se instalou entre elas, pesado e cheio de significados. Rosé sentia uma dor surda no peito, como se estivesse perdendo algo que nunca soube que tinha. Ela se virou para a janela, observando as luzes lá fora e tentando processar o que acabara de ouvir. A confissão de Lalisa era como um espelho que refletia tudo que ela mesma tinha tentado enterrar: os sentimentos confusos, o desejo reprimido, o medo de que tudo não passasse de uma ilusão.

— Eu também senti, Lisa — Rosé disse, baixinho, quase como se falasse consigo mesma. — Durante tanto tempo, eu achei que era só eu. Que eu era a única idiota que ficava presa nesses pensamentos. Mas agora... agora eu não sei mais. Parece que a gente perdeu a chance. E eu não sei se dá pra voltar

Lalisa olhou para ela, os olhos cheios de lágrimas que ela se recusava a deixar cair. — Eu não quero que você vá embora de novo. Não quero perder você. Mas eu sei que eu sou uma merda e... talvez você esteja certa. Talvez a gente seja só isso. Uma bagunça que nunca vai se resolver

Rosé deu um passo em direção a Lalisa, os sentimentos borbulhando em seu peito de forma descontrolada. Ela queria gritar, queria abraçá-la, queria fugir para o lugar mais distante do mundo. Mas, em vez disso, apenas segurou a mão de Lalisa, sentindo o calor e a familiaridade daquele toque que conhecia tão bem.

— Eu não sei o que eu quero, Lisa. E isso me assusta pra caralho. Mas o que me assusta mais é te ver assim, se destruindo e me levando junto. A gente precisa parar, precisa... sei lá. Encontrar alguma coisa além dessa merda toda

Lalisa apertou a mão de Rosé, as lágrimas finalmente escorrendo por seu rosto. — Eu só queria que a gente pudesse ter sido diferente. Que eu não tivesse estragado tudo. Mas você é tudo pra mim, Rosie. Sempre foi.

Rosé respirou fundo, sentindo o peso das palavras de Lalisa e o próprio coração despedaçado pelas incertezas. Elas ficaram ali, juntas no silêncio, cada uma lidando com suas dores e arrependimentos, sem saber ao certo qual seria o próximo passo. A vida tinha se tornado uma sequência de escolhas ruins e arrependimentos que se acumulavam, mas, de alguma forma, a presença uma da outra ainda parecia fazer sentido, mesmo que fosse só por um momento.

— A gente vai descobrir o que fazer, Lisa. Pode não ser agora, mas a gente vai descobrir — Rosé sussurrou, tentando acreditar nas próprias palavras.

Lalisa sorriu, um sorriso fraco e cansado, mas genuíno. — Espero que sim. Porque, sem você, eu nem sei quem eu sou

O confronto não trouxe respostas claras, mas deixou uma promessa silenciosa de que, de alguma forma, elas encontrariam um caminho. Mesmo que fosse um caminho cheio de buracos e escuridão, elas estariam juntas para tentar enfrentá-lo. E talvez isso fosse o mais próximo de uma redenção que ambas poderiam alcançar.

ᘡ    ۫    𖨂    𓈒   Querido Texas  ۟    ៹    𓂂Onde histórias criam vida. Descubra agora