James
Eu sempre soube que a vida na clínica seria um turbilhão de rotinas e olhares de curiosidade. Desde que cheguei aqui, as coisas eram simples: os dias se arrastavam, e as noites eram preenchidas por sonhos fragmentados e memórias apagadas. Mas naquela manhã, algo mudou. Uma nova presença estava prestes a entrar na minha vida, e eu não fazia ideia de como isso iria afetar meu mundo.
A primeira vez que vi Lily depois de anos, foi durante uma das visitas de rotina dos médicos. Ela entrou na ala com uma aura de frescor e uma expressão que misturava cautela e curiosidade. Seus olhos observavam tudo com uma intensidade que era difícil de ignorar. Ela estava diferente das outras pessoas que passavam por aqui, como se sua presença fosse uma pequena explosão em um mundo até então estático.
Lily se aproximou com um sorriso nervoso e um olhar preocupado, como se cada passo fosse uma tentativa de descobrir um segredo escondido. As conversas de seu grupo de treinamento eram abafadas pela distância, mas eu podia sentir a tensão em cada palavra que pronunciavam. Havia algo de novo em sua voz, um toque de empatia que era raro entre os profissionais aqui.
Em um de nossos encontros, lembro-me de ter observado Lily tentando se ajustar à rotina. Havia algo sincero em seu comportamento, algo que me fez questionar se ela poderia entender o que se passava em minha mente. Quando ela entrou no meu quarto pela primeira vez para entregar os remédios, senti um desconforto inusitado. O olhar dela era carregado de preocupação, e eu sabia que ela tentava compreender mais do que apenas a minha condição física.
Mas o que realmente me marcou foi a forma como ela reagiu quando me viu adormecido. Eu estava em um estado de sonho fragmentado, uma mistura de imagens e sentimentos que não se encaixavam com a realidade. Eu tinha o dedo na boca, um reflexo inconsciente de minha busca por conforto, algo que a lactofilia fazia com que eu repetisse de forma involuntária.
Escutei o murmúrio de palavras que não consegui compreender completamente, mas que pareciam carregadas de confusão e medo. Ouvi-a chamar o nome de Maggie, buscando respostas. Sua presença trouxe uma sensação de vulnerabilidade que eu não estava acostumado a sentir. Não era apenas a presença dela que me afetava, mas a forma como ela parecia desarmada diante do que via.
Eu sabia que precisava encontrar uma maneira de lidar com isso, de proteger a minha privacidade em meio a uma nova invasão. Meu desejo de esconder a verdade, de manter as paredes erguidas ao redor de minha mente, era mais forte do que nunca. O medo de que alguém pudesse descobrir a profundidade do meu sofrimento e da minha luta interna me fazia querer desaparecer. Mas eu não podia. Não com Lily se aproximando cada vez mais.
O que eu via nela era uma curiosidade que beirava a empatia, algo que eu não tinha encontrado com frequência. Havia um desejo genuíno de entender, de ajudar, e isso era ao mesmo tempo confortante e aterrorizante. A sensação de estar exposto, de ver alguém olhar além das superfícies, fazia com que eu quisesse recuar e me esconder, mas também me fazia desejar um pouco de compreensão, mesmo que não soubesse como aceitá-la.
Naquela noite, enquanto me preparava para mais uma série de sonhos perturbadores, a imagem de Lily permanecia em minha mente. Eu sabia que ela estava tentando fazer a coisa certa, mas a realidade de minha condição e a complexidade das minhas emoções tornavam essa tarefa ainda mais difícil para ambos. A presença dela era uma nova variável em uma equação já complicada, e eu não sabia se isso era um bem ou um mal. Só sabia que, de alguma forma, ela havia se tornado uma parte inesperada de minha jornada, e eu ainda estava tentando descobrir o que isso significava para mim.
SONHO ON
Eu me encontro em uma escola familiar, onde os corredores são longos e silenciosos, e meus próprios passos ecoam de forma inquietante. Minha respiração está ofegante e minhas mãos suadas. Cada vez que dou um passo, o som parece amplificado, como se todo o lugar estivesse aguardando algo.
Entro em uma sala de aula iluminada por uma luz pálida e fria. À primeira vista, parece normal, mas logo percebo que todos os alunos estão em silêncio absoluto, com os olhares fixos em mim. O cheiro de giz e papel é misturado com um odor metálico que não consigo identificar.
Me aproximo da minha carteira, mas algo me chama a atenção: na mesa, há um par de sapatos de bebê e uma mamadeira. Tento me concentrar, mas sou interrompido por um sussurro crescente que rapidamente se transforma em uma risada cruel. Olho em volta e vejo meus colegas e professores rindo de maneira cruel, apontando e murmurando sobre mim. Cada vez que me aproximo dos objetos, uma sombra negra se estende e cobre a mesa, como se tentasse esconder a verdade sobre o que realmente sou.
A sensação de estar exposto é esmagadora. Tento falar, mas minhas palavras são abafadas pela onda de murmúrios e risadas. De repente, me vejo em um palco de teatro, com um holofote brilhante sobre mim, enquanto uma multidão desconhecida assiste com um olhar de julgamento. As paredes ao meu redor se fecham lentamente, apertando-me, e o cheiro de madeira queimada invade o ambiente, misturando-se com o odor ácido das lágrimas e do suor.
Vejo meu próprio reflexo em um espelho quebrado na parede do palco. A imagem distorcida de mim mesmo mostra o dedo na boca, em um gesto infantil e desconfortável. As rachaduras no espelho se espalham, misturando-se com as expressões de desgosto e reprovação dos outros.
As risadas se intensificam, tornando-se um rugido ensurdecedor. Tento correr, mas meus pés parecem estar presos ao chão. Olho para a plateia e vejo meus pais e amigos, todos com expressões de desaprovação e desapontamento. A sensação de traição e vergonha é esmagadora, e eu tento explicar, mas as palavras ficam presas na minha garganta.
A cena se transforma em um pesadelo surreal. Estou em um labirinto, com paredes cobertas de recortes de revistas e fotos que mostram manchetes e artigos negativos sobre mim. Estou preso em uma sala giratória, e a cada volta, os rostos dos julgadores ficam mais distorcidos e cruéis. O cheiro de papel queimado e algo mofado preenche o ar.
Finalmente, encontro-me em um canto escuro e apertado, com as sombras se fechando ao meu redor. Tento me esconder, mas as sombras são implacáveis. O som da risada agora é um eco interminável, e a sensação de vergonha e exposição é esmagadora.
No momento em que estou prestes a ser consumido pelas sombras, um grito agudo me acorda.
Sento-me abruptamente na cama, ofegante, com a sensação de uma profunda angústia. O quarto está silencioso e vazio, mas o peso do sonho permanece comigo, um lembrete sombrio da minha luta interna e dos medos que ainda não consegui enfrentar.
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Amando meu paciente: A Enfermeira e o Paciente
RomanceRecém-formada em enfermagem, Lily inicia sua carreira em uma clínica psiquiátrica onde, durante o estágio, vivenciou os desafios do ambiente. Agora, como profissional, ela é designada para a ala mais complexa, onde os pacientes sofrem com transtorno...