A linha tênue

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Zero e Corvo estavam sentados no carro que haviam pegado emprestado de um contato da ZB. Corvo, como sempre, estava em silêncio, observando as ruas iluminadas pelas luzes amareladas dos postes. Eles haviam seguido Thomas por quase uma hora, rodando por becos, cruzando avenidas e passando por lugares que Zero nunca imaginaria que seu irmão frequentasse. Ele estava começando a se perguntar se Thomas sabia que estava sendo seguido.

- Você acha que ele nos viu? - perguntou Zero, quebrando o silêncio.
- Difícil dizer - Corvo respondeu, ainda sem tirar os olhos da figura que andava mais à frente.

Thomas se movia com uma naturalidade que irritava Zero. Era como se ele não tivesse uma preocupação no mundo, enquanto Zero sentia que estava carregando o peso de algo que ele não conseguia decifrar. Seu irmão sempre fora um mistério, mas agora parecia mais sombrio, como se estivesse envolvido em algo perigoso, algo que Zero não conseguia tocar.

- Por que ele não simplesmente explica o que está fazendo aqui? - Zero murmurou, mais para si mesmo do que para Corvo.

Corvo não respondeu. Ele sabia que qualquer comentário só alimentaria o conflito interno de Zero. Eles continuaram seguindo Thomas até ele entrar em um prédio abandonado, sua fachada coberta de pichações e janelas quebradas.

- Vamos - disse Zero, saindo do carro.

Eles atravessaram a rua, movendo-se em silêncio até a entrada do prédio. As escadas rangiam sob seus pés enquanto subiam até o andar em que Thomas desaparecera. Ao chegarem ao topo, encontraram uma sala aberta, com o teto desmoronando e o cheiro de mofo no ar. Thomas estava lá, parado no meio da sala, de costas para eles.

- Então, você acha que me seguir ia te levar a alguma resposta? - Thomas disse, sem se virar.

Zero congelou por um segundo, mas recuperou a compostura. Ele sempre odiou o jeito presunçoso do irmão, como se soubesse de tudo antes que qualquer um pudesse sequer pensar em uma pergunta.

- O que você está fazendo aqui, Thomas? - Zero perguntou, tentando manter a voz firme. - E não me venha com enigmas. Estou cansado disso.

Thomas virou-se lentamente, um sorriso debochado nos lábios.

- Ah, então o grande Zero está cansado? Pensei que você fosse o mestre de sempre saber o que fazer - ele cruzou os braços. - Eu estou cuidando dos meus assuntos. Você deveria fazer o mesmo.

- Que assuntos? - Zero deu um passo à frente, a frustração crescendo. - Desde que você apareceu, nada do que faz faz sentido. Ghostcity, essa ligação, esse prédio abandonado... O que está acontecendo? Se você está em algum tipo de problema, por que não me diz logo?

Thomas deu uma risada curta, o som ecoando pelas paredes vazias da sala.

- Problemas? Quem aqui acha que está em problemas? Eu estou exatamente onde quero estar, Zero. Diferente de você, que sempre parece estar perdido, correndo atrás de algo que nunca vai alcançar.

Essa última frase foi como um soco no estômago de Zero. Ele sempre odiou quando Thomas o provocava com aquele tom condescendente, como se estivesse acima de tudo. Mas desta vez, a frustração o dominou. Zero deu outro passo em direção ao irmão.

- Você acha que pode simplesmente voltar para a minha vida, aparecer de repente, e agir como se soubesse de tudo? Eu te trouxe para a ZB porque achei que precisava de ajuda, mas talvez eu estivesse errado. Talvez você seja só um covarde que tem medo de confiar em alguém além de si mesmo.

Thomas o encarou, seus olhos ficando sombrios. O sorriso desapareceu de seu rosto, substituído por uma expressão mais fria.

- Eu nunca te pedi para me seguir, Zero. Eu nunca pedi sua ajuda. Você está tão acostumado a ser o "salvador" que nem percebe quando as pessoas podem lidar com as próprias merdas sozinhas.

- Isso aqui - Zero apontou ao redor da sala - não parece algo que você está lidando sozinho! Você está escondendo algo, e isso vai nos morder a qualquer momento, eu sei. E o pior de tudo é que eu me importo com você, e você está se comportando como um idiota egoísta.

Thomas deu um passo à frente, agora a centímetros de Zero, a tensão entre os dois praticamente palpável.

- Sabe o que é egoísta, Zero? - Thomas disse com a voz baixa e perigosa. - Você acha que tudo é sobre você. Que eu estou aqui para complicar a sua vida. Mas talvez, só talvez, eu tenha algo maior acontecendo que você não entende. E, francamente, você nunca entenderia, porque acha que sempre sabe o que é melhor.

- Você... - Zero começou, mas foi interrompido por Corvo.

- Isso não vai levar a lugar nenhum.

Corvo raramente falava em momentos como esse, mas sua voz cortante foi suficiente para trazer ambos de volta à realidade. Thomas olhou para Corvo, depois de volta para Zero.

- Fique fora disso - Thomas resmungou, olhando Corvo de cima a baixo antes de se virar para sair.

Zero deu um passo para segui-lo, mas Corvo segurou seu ombro.

- Deixa ele ir - Corvo disse. - Não vamos conseguir respostas assim.

Zero respirou fundo, ainda com o sangue fervendo. Ele assistiu Thomas desaparecer pelas escadas, o som de seus passos diminuindo até que tudo ficou em silêncio novamente.

- Um dia, ele vai acabar nos arrastando para algo muito maior do que a gente pode controlar - disse Zero, olhando para o lugar onde seu irmão havia estado.

Corvo olhou para ele com seu típico ar de observação silenciosa, mas não disse nada. Talvez ele também estivesse pensando o mesmo.

Enquanto eles desciam as escadas, Zero sentia a frustração crescer ainda mais. Thomas estava brincando com ele, e a falta de controle sobre a situação estava o corroendo por dentro.

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