Capítulo 7 - Cicatrizes Ocultas - Renata Lopes

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9 Anos atrás...




Era uma tarde ensolarada de primavera, e eu tinha acabado de voltar da escola, jogando minha mochila em um canto do quarto assim que entrei. Aos 13 anos, minha vida era tão comum quanto poderia ser para uma adolescente. A escola era um misto de tédio e risadas com as amigas, e as tardes eram geralmente passadas em frente ao computador ou com um livro nas mãos. Naquele dia, depois de passar uma hora assistindo a um programa qualquer na TV, minha mãe chamou para o jantar. A mansão, embora imponente, sempre parecia acolhedora à noite. As luzes suaves dos lustres criavam uma atmosfera aconchegante, e o cheiro da comida fresca se espalhava pelas salas amplas.

Meus pais estavam tranquilos, ou pelo menos pareciam. Conversávamos sobre assuntos banais, como a escola e o próximo feriado que estávamos planejando. Depois do jantar, subi para o meu quarto e mergulhei em um livro que havia pego na biblioteca da mansão. A leitura me transportava para outro mundo, mas, naquela noite, algo me fez descer da cama. Era quase madrugada quando ouvi vozes vindo da biblioteca. Meus pais raramente ficavam acordados até tão tarde, e a curiosidade me empurrou a investigar. Eu desci as escadas devagar, tomando cuidado para não fazer barulho, e me escondi atrás de uma das grandes portas duplas da biblioteca. As vozes estavam mais altas agora, e eu pude ouvir com clareza o tom preocupada da minha mãe.

— Não podemos subestimar os Thauvin, Rodrigo — disse ela, com a voz grave e cheia de tensão.

Meu coração disparou. Nunca tinha ouvido aquele nome antes, e algo na maneira como ela o mencionou me deu um calafrio. Minha mãe continuou falando, mas sua voz abaixou, como se tivesse se dado conta de que poderia ser ouvida. Meu pai respondeu, mas sua voz estava tão baixa que não consegui entender o que ele dizia. O que quer que fosse, parecia grave. Eu sabia que meus pais tinham negócios importantes, mas aquilo era diferente. Havia um tom de urgência na conversa, algo que me fez sentir que aquilo ia além do trabalho comum que eles mencionaram casualmente durante o jantar.

Fiquei ali por mais alguns minutos, tentando ouvir mais, mas, de repente, ouvi passos se aproximando da porta. Meu coração disparou, e eu corri de volta para o meu quarto, me jogando na cama e fingindo estar dormindo quando os passos finalmente pararam do lado de fora da minha porta. Esperei por alguns minutos, até que os passos se afastaram. Naquela noite, deitei na cama, meu coração ainda acelerado e a mente cheia de perguntas. Quem eram os Thauvin? E por que minha mãe parecia tão preocupada com eles? Mesmo sem saber ao certo o que estava acontecendo, eu podia sentir que aquela conversa tinha algo a ver com o que, no futuro, iria mudar nossas vidas para sempre.

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Eu estava sentada na cama do hospital, empurrando a comida de um lado para o outro no prato, sem muita vontade de comer, quando a porta do quarto se abriu rapidamente. Levantei os olhos e vi Sky entrando a passos largos, cruzando os braços e me encarando com aquela expressão típica dela, misto de preocupação e irritação. Senti meu estômago dar um nó, e sem saber muito bem o que dizer, abaixei o olhar, mordendo o lábio. As palavras saíram quase sem som, fracas, como se tivessem sido arrancadas de mim.

— Me desculpa... — murmurei, ainda sem conseguir encará-la diretamente.

Antes que eu pudesse dizer mais alguma coisa, senti o calor dela me envolvendo num abraço apertado. Por um segundo, fiquei completamente surpresa, mas depois me deixei afundar no conforto daquele gesto. Sky sempre tinha essa maneira de me surpreender, de quebrar minhas barreiras sem esforço. Ela me apertou forte, como se quisesse me colocar de volta à realidade, e por um breve instante, senti que estava segura. Só que, logo depois, veio o cascudo no topo da minha cabeça.

— Você quase me matou do coração, sua idiota! — disse ela, o tom meio sério, meio brincalhão, enquanto eu esfregava a cabeça, reclamando baixinho.

Não consegui evitar um sorriso pequeno, ainda que o medo e a culpa tivessem se acumulado nos últimos dias. Olhei para Sky, meio sem jeito, mas ao mesmo tempo grata por ela estar ali, me trazendo de volta para um lugar onde eu não estava sozinha.

— Foi mal... — falei de novo, mas dessa vez havia um pouco mais de leveza na minha voz.

Sky me olhava com aqueles olhos sérios, atravessando cada camada que eu tinha construído para me proteger. Quando ela finalmente se sentou na poltrona ao lado da cama, o silêncio entre nós ficou denso, quase insuportável. E então, com uma voz calma, mas firme, ela fez a pergunta que eu tanto temia.

— Quem era Christian Ferraci?

Meu coração pareceu parar por um instante, e o medo voltou a apertar meu peito com força. A pergunta pairava no ar, pesada, sufocante. Eu sabia que Sky precisava de respostas, que merecia entender tudo, mas será que eu poderia expor ela a isso? Será que valia a pena envolvê-la nesse perigo, nessa escuridão que já havia consumido tanto de mim?

Soltei um suspiro tremido, deixando o garfo de lado, sem qualquer apetite para continuar. Fechei os olhos, tentando manter a calma, mas as lembranças começaram a surgir, trazendo de volta tudo o que eu tentava esquecer. A dor, a raiva, o arrependimento... Ele tinha destruído minha vida de tantas maneiras.

— Ele destruiu minha vida, Sky...ele..- — murmurei, a voz embargada enquanto as lágrimas começavam a cair sem controle. Meu peito doía, como se cada palavra arrancasse um pedaço de mim.

Eu não conseguia mais segurar as emoções. Toda a dor que eu tinha sufocado por tanto tempo transbordou, e antes que eu percebesse, estava chorando, me encolhendo, como se a única coisa que eu pudesse fazer fosse me proteger de novo. Senti os braços de Sky ao meu redor, me envolvendo em um abraço forte e protetor. Ela não disse nada por um momento, apenas me apertou contra ela, me deixando saber que estava ali, que eu não precisava passar por isso sozinha.

— Você pode me contar no seu tempo... — disse ela, sua voz suave, mas cheia de compreensão.

Eu soluçava, sem forças para falar mais, mas naquele abraço, encontrou um pequeno alívio, mesmo que fosse com seus dias contados.

Lights and Secrets +18 | Dark Romance Onde histórias criam vida. Descubra agora