Capítulo VI

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Estela estava em minha mente, sua voz ecoando dentro de mim: "Você pode me levar ao hospital?"

Acelerando pelas ruas quase desertas, meu coração batia tão rápido quanto. Quando cheguei ao prédio dela, não hesitei ao subir as escadas, cada passo ressoando com urgência, até o terceiro andar. Bati na porta e, de dentro, a voz fraca e abafada de Estela respondeu:

— Está aberta.

Fechei os olhos por um breve momento, uma prece silenciosa emergindo em meu peito. "Guia-me, Senhor, para que eu possa ajudá-la." Respirei fundo, ciente de que os próximos minutos exigiriam de mim não apenas uma atenção ao que estava acontecendo fisicamente, mas também uma força espiritual que eu precisaria buscar.

Ao entrar, o cenário que me recebeu era um reflexo de sua juventude. Pequenos detalhes de uma garota que, apesar das batalhas que certamente enfrentava, ainda encontrava espaço para a beleza em meio à dor. A pequena sala, a cozinha arrumada, tudo ali falava de uma vida que ela tentava manter em ordem. Porém o quarto, cuja porta entreaberta parecia chamar minha atenção, era um espaço onde eu não ousava olhar. Senti que ali estava um limite que não poderia ultrapassar.

Era um ambiente que transbordava sua essência, um reflexo de uma intimidade que eu sabia que não deveria invadir. Aquele espaço, tão pessoal, parecia traçar as linhas invisíveis que delimitavam minha conduta. Compreendia que minha presença em seu apartamento, tão próxima de sua vida privada, já ultrapassava os limites habituais que sempre guiaram minha vocação. E, no entanto, lembrei-me de que a urgência do momento é que me trouxera até ali. Era a necessidade, o chamado para ajudar que me mantinha ao seu lado. Jesus, de certa forma, parecia estar sinalizando que ela precisava de mim naquele momento, e era essa missão que eu deveria seguir, com humildade e discernimento.

Logo, a visão de Estela me trouxe de volta ao presente. No banheiro, ela estava ajoelhada ao lado da privada, e minha preocupação se intensificou. Seu rosto, mais pálido do que nunca, os cabelos despenteados, o corpo tão frágil... tudo nela clamava por socorro. Havia uma vulnerabilidade ali que me deixou alarmado, como se ao menor toque ela pudesse quebrar.

— Posso entrar? — perguntei, tentando manter minha voz baixa e respeitosa. Ela não respondeu, apenas assentiu, visivelmente envergonhada. Pobre menina...

Ajoelhei-me ao lado dela, sentindo o peso daquela situação se aprofundar dentro de mim. Ver Estela daquele jeito era insuportável, não apenas pela cena em si, mas pela impotência que me dominava, incapaz de aliviar o que quer que fosse aquele fardo que, agora, tornava-se visceral.

— Você quer que eu te ajude a se levantar? — minha voz saiu mais suave do que esperava, quase um sussurro, pois qualquer som mais alto parecia impróprio para aquele momento tão sensível.

Ela acenou novamente, e eu, tomado por todo cuidado, a envolvi com delicadeza, sentindo a fragilidade de seu corpo enquanto a guiava com o máximo respeito. Entre nós, um silêncio absoluto pairava, carregado pela densidade da situação. Era como se cada gesto que eu fazia fosse uma prece para que agisse da forma correta, sem atravessar os limites tênues que já estavam tão embaralhados em minha mente.

Estela parecia etérea, como se sua presença física estivesse prestes a desaparecer. Meu coração apertava mais a cada passo. Algo estava profundamente errado, e não apenas em seu estado físico. Havia algo mais, algo sombrio e não revelado, algo que eu não conseguia desvendar por completo. Enquanto a levava ao carro, essa percepção crescia em mim. Ela precisava de ajuda, não apenas espiritual. E, naquele momento, a única certeza que tinha era que não a deixaria enfrentar aquilo sozinha.

Ao chegarmos ao hospital, a urgência com que os enfermeiros agiram apenas confirmou o que meu coração já temia. Estela foi imediatamente colocada em uma maca, suas pernas parecendo incapazes de sustentá-la. A fraqueza espalhada por todo seu corpo, como se sua vitalidade estivesse se esvaindo. Enquanto os profissionais cuidavam dela, eu me mantive à distância, observando com a alma apertada.

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