Capítulo XII

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Já se passavam dois meses desde a conversa com o bispo, visíveis em minha barba que havia deixado crescer. O afastamento da paróquia, das missas e das atividades que eu conduzia há tantos anos, me trouxera a um sítio no interior. Aqui ficava um antigo seminário, em um casarão colonial que acolhia jovens para preparação à vida eclesiástica. Minhas tarefas agora eram outras: acompanhava aulas como auxiliar dos professores e ouvia novamente, junto aos jovens seminaristas, os ensinamentos dos teólogos. Por vezes, liderava pequenos grupos de estudo e oração, tentando reacender em mim a fé que um dia me guiara.

Os seminaristas, com seus olhares vibrantes e esperanças ainda intactas, contrastavam com a apatia que eu carregava. Enquanto eu havia sido ordenado sacerdote, eles estavam na fase de formação, liderados por docentes e orientadores espirituais, que os guiavam em suas vocações. Olhar para o brilho nos olhos deles era como revisitar o meu passado. O jovem devoto que um dia eu fora parecia uma figura distante, quase irreal.

As turmas eram pequenas, reflexo de um mundo onde a religião perdia cada vez mais espaço entre a juventude. Mas os poucos que chegavam ao seminário pareciam estar genuinamente determinados a seguir esse caminho. Assim como eu estive, um dia. A lembrança da minha avó sempre surgia nesses momentos, sua fé inabalável, sua voz suave recitando as orações, a devoção que despertara em mim. Agora, havia apenas vazio em meus olhos e em meu coração.

As mensagens de Beatriz chegavam esparsas. Breves, formais, quase protocolares. Ela mencionava o tratamento da filha de modo seco, sem muito detalhe. Senti a frieza de suas palavras, me lembrando de que eu já não tinha mais o direito de me envolver nessa história. Estela se tornara uma lembrança distante, como deveria ser. O tempo parecia estar cumprindo seu papel, apagando nossas vidas mutuamente. Mas esse mesmo tempo, que deveria curar, apenas fazia crescer o vazio dentro de mim.

E então, certo dia, ao retornar da biblioteca após horas de pesquisa teológica, ouvi o toque do celular na mesa do meu dormitório. Fiquei paralisado. O nome que brilhava na tela era o de Beatriz, me ligando. Um calafrio percorreu meu corpo. Não consegui atender. Uma parte de mim já temia o pior. Teria Estela...?


A pergunta inominável surgiu em mim

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A pergunta inominável surgiu em mim. Afastei-a imediatamente, sem ousar admitir a possibilidade. Peguei o celular com mãos trêmulas e vi que havia várias ligações perdidas de Beatriz. O medo foi aumentando, sufocante, enquanto eu tentava encontrar uma forma de reagir. Deveria ligar de volta? O que ela queria? A incerteza era avassaladora.


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