Estrela Guia ✨

Capítulo XV

Brito me encarava com um olhar carregado de ódio. Seus punhos estavam cerrados, as veias das mãos saltando em tensão, e a cada segundo ele parecia lutar contra o impulso de iniciar um confronto físico comigo. A animosidade em seus olhos era quase palpável, e ele deu um passo ameaçador em minha direção, como se qualquer palavra ou gesto a mais de minha parte fosse suficiente para fazê-lo perder o controle. Mantive minha posição, mas meu coração batia forte, pressentindo a intensidade do momento que se formava.

Antes que Brito avançasse mais, Beatriz se posicionou rapidamente entre nós, seu corpo uma barreira de determinação. Ela lançou um olhar de aço para Brito, e a firmeza em sua voz deixou claro que não recuaria. O silêncio do corredor vazio amplificava a tensão entre nós três. Não havia mais ninguém ali, e o ar parecia carregado com as décadas de ressentimento e desentendimentos que permeavam aquela família.

— Você não veio aqui para criar briga com ninguém, Brito. Veio para fazer o teste de medula, para ver sua filha. — As palavras de Beatriz eram duras, carregadas de um julgamento que Brito não podia ignorar. — Será que você poderia pelo menos tentar fingir ser um pai presente dessa vez? Estela está há meses internada. Tudo o que ela menos precisa agora é ver mais uma cena sua.

A expressão de Brito se contorceu, o rosto vermelho de raiva e o orgulho ferido. Suas mãos tremiam ligeiramente, e ele resmungou, com desprezo escorrendo nas palavras.

— Mas que inferno, Bia, você vai fazer vista grossa sobre o que toda cidade está falando?

As palavras ecoaram, cruéis, carregadas de malícia. Beatriz desviou ligeiramente o olhar para mim, desconfortável e visivelmente constrangida. Em sua expressão, eu pude ler a mesma inquietação que transparecera na conversa recente entre nós, quando ela me alertara sobre minha inapropriada relação com Estela: "O senhor está se envolvendo demais."

A confirmação me atingiu como um soco. Os boatos não eram apenas rumores distantes; haviam se espalhado como fogo, chegando não apenas a Beatriz, mas também ao pai de Estela. A ansiedade me tomou por completo, ao imaginar que, a qualquer momento, Estela poderia ouvir aquelas insinuações. Brito, com sua hostilidade, poderia muito bem despejar tudo aquilo para ela, lançando sobre sua filha interpretações mesquinhas sobre o que sentíamos um pelo outro.

Minha repulsa por ele crescia a cada segundo. Não me importava com a minha própria reputação ou dignidade. Ambas estavam desmoronadas, não só pela boca do povo, mas também pela minha consciência. Eu sabia que minha atuação como padre havia se tornado uma farsa; um homem que, apesar das vestes sagradas, já não encontrava sentido real em sua vocação. Ainda assim, permanecia ali, hipocritamente vestindo o hábito, pois era a única maneira que eu tinha para ajudar Estela e garantir o que ela precisava.

Perguntava-me o que deveria fazer. Sabia que o melhor para Estela era protegê-la de qualquer confronto com aquele homem, que parecia ressurgir como um fantasma dos dias de um lar quebrado. Mas minha missão no hospital não estava concluída. O resultado do teste de compatibilidade da minha medula ainda não saíra. Se, por algum milagre, Deus me concedesse a chance de ser o doador, eu faria essa entrega sem hesitar, independentemente do que Brito pensasse a respeito. Estava disposto a doar o que fosse preciso, se isso significasse ver Estela finalmente curada.

Lembrei-me, então, em como ela vinha recuperando lentamente sua vitalidade. A cada visita que eu fazia, percebia uma luz diferente em seu rosto, uma esperança nova, uma aceitação profunda de tudo o que havia passado. Nossos encontros nos traziam paz, como um santuário íntimo que havíamos construído entre nós, livre de expectativas e de julgamentos. Ela confiava em mim novamente, e me sentia tão grato por isso.