Agosto.
Primeiro dia do oitavo mês do ano.
Faltavam somente mais quatro dias.
Era uma segunda-feira e Elise estaria mentindo se dissesse que estava bem. Não estava. Nem um pouquinho.
Acordou tarde e não respondeu mensagem de texto de ninguém, não tinha cabeça para falar com ou ver nenhuma alma viva naquela semana. Enrolou-se ainda mais no lençol, lágrimas silenciosas escorriam de seus tristonhos olhinhos castanhos, o tempo estava acabando, quase podia ver a areia vermelha caindo numa ampulheta de madeira negra.
Ele só tinha mais quatro dias e cada minuto de agosto que se passava sem o retorno dele era insuportavelmente doloroso para Elise. Ela havia esperado tanto e de maneira tão paciente, não havia feito escândalos além da conta, havia sofrido em silêncio, o que mais precisava fazer para ter o seu conto de fadas trevoso de volta? Não saber a resposta lhe causava dor física.
Todo esse tempo em que havia sorrido, sido produtiva, agido como adulta, foi tudo para esconder o grande buraco que agora existia em seu peito, sugando-a devagar, sem pressa, mas causando-lhe um sofrimento sem igual.
Todas as noites, ela morria no momento em que fechava os olhos para dormir. Todos os dias, era obrigada a reviver para continuar sua penitência dolorosa, para ser esmagada pelo peso da vida, de ter um coração que batia, sangue que pulsava contra sua vontade. Deveria estar morta, profanando a terra com sua não-vida ao lado dele, assim como ele prometeu. Morta, presa para sempre aos dezessete anos. Morta, com a ardência deleitosa da primeira paixão queimando em seu peito pela eternidade. Morta, mas viva. Viva como nunca antes. Livre.
Incapaz de continuar sofrendo em silêncio, Elise gritou com toda a força que possuía. Não havia ninguém além dela ali. Estava tudo bem, podia ser fraca, demonstrar o quão quebrada havia se tornado, nada além de uma boneca de lata enferrujada, oca por dentro e carcomida pelo tempo.
Será que ainda haveria conserto para ela?
Tinha vivido os últimos meses anestesiada, fugindo da realidade, temendo encarar o calendário, o passar dos dias, mas agora que a areia da ampulheta estava prestes a acabar, ela não sabia mais o que fazer.
Não queria duvidar dele, porém era difícil, bem difícil.
Ainda bem que não tinha que abrir a Paraíso hoje, porque não tinha a menor condição. Não conseguia nem respirar direito tanto por causa da ansiedade que a esmagava quanto por conta do nariz entupido de tanto chorar.
A cabeça doía, o peito doía, tudo doía, nem se lembrava da última vez que havia comido comida de verdade ou tomado água. Estava vivendo à base de álcool, energético e de vez em quando porcarias industrializadas.
Toda aquela dieta saudável de quando assumiu a Paraíso já havia ido para as cucuias. Seu estômago estava uma merda.
Sua vida estava uma merda.
Estava tudo uma grande merda.
Por mais que tentasse arrumar coisas para preencher o vazio, nunca era o suficiente.
No começo, tinha conseguido enrolar a si mesma, obrigar-se a pensar em outras coisas, porém agora... Agora tudo em que pensava era nele. Nele e nas promessas que não sabia mais se ele seria capaz de cumprir.
Farta disso, Elise pulou da cama, o quarto inteiro rodou numa espiral preta. Caiu no chão, mas agarrou-se aos pés da cama e obrigou-se a se erguer. Foi se arrastando até o MP4 e os fones de ouvido que tinha deixado na penteadeira, colocou o metal mais barulhento que foi capaz de encontrar nas alturas para que tudo o que ouvisse fosse o barulho e não seus pensamentos autodestrutivos. Pensamentos que lhe diziam que ela não valia tanto assim. Que era insuficiente, incapaz de fazê-lo feliz e estar ao lado dele. E por isso ele jamais voltaria.
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Para toda a eternidade
Fiksi RemajaNuma cidadezinha do interior esquecida por Deus, vive uma adolescente esquisita cujo maior sonho é se tornar vampira, só que ela não conhece ninguém que possa ajudá-la com isso. Até que repentinamente surgem boatos sobre um novo morador que promete...