XIII

95 21 10
                                    


Oh gente voltei 🩵

Maraisa

A presença de Maiara era inegável, mesmo antes de eu ter forças para abrir os olhos. Eu podia sentir a angústia dela, um misto de desespero e esperança pairando no ar, como se o próprio ambiente estivesse impregnado da dor que ela tentava, em vão, conter.

Eu não conseguia me lembrar exatamente de quanto tempo havia se passado desde que tomei aquelas pílulas, desde que deixei minha pele aberta e permiti que meu sangue escoasse como uma forma de libertação. Mas, agora, eu entendia que não era libertação alguma. Era uma fuga. Uma fuga covarde e desesperada, que quase me arrancou do mundo antes de eu perceber o que de fato importava.

A luta dentro de mim era constante. Por um lado, o alívio em saber que eu ainda estava ali, que ainda podia sentir, era sufocante. Mas, por outro lado, o arrependimento e a vergonha eram como punhais perfurando meu peito. O que eu havia feito com a minha irmã? Com as pessoas que me amavam? Comigo mesma?

Os médicos murmuravam ao redor, talvez tentando decidir o próximo passo, discutindo sobre minha condição física, sobre o quão crítica ainda era a minha situação. Mas, por mais que seus sussurros parecessem distantes, a única coisa que eu queria ouvir era a voz de Maiara. Eu queria que ela me chamasse, que ela dissesse que estava tudo bem, que tudo ficaria bem.

Com um esforço imenso, tentei abrir os olhos. Eles estavam pesados, como se houvesse um peso invisível sobre minhas pálpebras, mantendo-me presa em uma escuridão sufocante. Mas eu precisava vê-la. Precisava ver com meus próprios olhos que ela estava ali, que eu não havia perdido a única pessoa no mundo que verdadeiramente importava.

Minhas pálpebras se abriram lentamente, o mundo ao meu redor surgindo em formas borradas e luzes ofuscantes. A claridade machucava, cada feixe de luz parecia penetrar minha mente como uma agulha, mas eu me forcei a continuar. As formas começaram a tomar forma, a se definirem. E então, eu a vi.

Maiara estava ali, sentada ao meu lado, com os ombros curvados e as mãos apertando o lençol branco da cama hospitalar. Seu rosto estava manchado de lágrimas, e seus olhos estavam vermelhos, inchados de tanto chorar. Ver aquilo me destruiu mais do que qualquer dor física que eu pudesse sentir. Eu havia feito isso com ela. Eu havia causado essa dor, esse desespero.

— Maraisa... — Ela sussurrou, e sua voz era um misto de alívio e agonia, como se ela estivesse com medo de acreditar que eu realmente estava ali, consciente, viva.

Tentei falar, mas minha garganta estava seca, e as palavras não saíram. Apenas um som rouco, fraco, escapou dos meus lábios. Mas Maiara ouviu. Ela sempre ouvia. Seus olhos se arregalaram, e em um instante ela estava de pé ao meu lado, segurando minha mão com tanta força que eu mal conseguia sentir meus dedos.

— Eu estou aqui... — Ela murmurou, aproximando-se de mim, como se o simples fato de estar mais perto pudesse de alguma forma garantir que eu não desaparecesse de novo. — Você vai ficar bem, eu prometo.

Eu queria responder, queria dizer a ela o quanto eu sentia, o quanto eu me arrependia. Mas meu corpo ainda estava fraco, minha mente ainda estava se adaptando ao fato de estar viva. Tudo o que consegui fazer foi apertar sua mão de volta, com o pouco de força que me restava. Foi um gesto mínimo, quase insignificante, mas para nós duas, naquele momento, era tudo. Era uma promessa silenciosa de que eu estava ali, de que eu não iria a lugar nenhum.

O tempo passou de maneira estranha naquele quarto. Eu perdi a noção de quantas horas se passaram desde que acordei, desde que os médicos entraram e saíram, verificando meus sinais vitais, discutindo sobre tratamentos e recuperações. Mas, em nenhum momento, Maiara soltou minha mão. Ela estava ali, o tempo todo, mesmo quando seus olhos se fechavam por breves momentos de exaustão. Ela não iria embora, e eu sabia que, se dependesse dela, eu também não iria.

Em algum momento, quando o silêncio tomou conta do quarto e as luzes se tornaram mais suaves, eu finalmente consegui reunir forças para falar.

— Me desculpa... — Minha voz saiu fraca, quebrada, mas eu sabia que ela me ouviu.

Maiara olhou para mim, e por um instante, seu olhar foi de pura dor. Não era raiva, não era julgamento, mas a dor de alguém que havia quase perdido tudo. Ela balançou a cabeça, as lágrimas voltando a escorrer por seu rosto.

— Não... — Sua voz estava embargada, e ela respirou fundo antes de continuar. — Não precisa se desculpar, Maraisa. Só... só não faz isso de novo, por favor.

Eu sabia que ela estava tentando ser forte, tentando não me sobrecarregar com o peso de suas próprias emoções. Mas eu via através dela. Via a fragilidade em cada palavra, em cada gesto. E era essa fragilidade que me lembrava do que eu quase perdi.

— Eu prometo... — Murmurei, com mais convicção do que eu pensei que conseguiria. Porque, naquele momento, eu sabia que essa era uma promessa que eu não poderia quebrar. Eu nunca mais colocaria a vida de Maiara em risco. Nunca mais a deixaria sozinha para carregar o peso da minha ausência.

Ela soltou um suspiro trêmulo e, por um momento, ficamos em silêncio. Apenas nós duas, em um espaço que parecia ser só nosso, onde a dor e a cura se entrelaçavam de maneira imperceptível.

Maiara se aproximou ainda mais, e, com a mesma delicadeza de sempre, encostou sua testa na minha.

— Eu estou aqui. Sempre estive. E sempre vou estar.

𝓡𝓮𝓵𝓪𝓬̧𝓸̃𝓮𝓼   𝓠𝓾𝓮𝓫𝓻𝓪𝓭𝓪𝓼Onde histórias criam vida. Descubra agora