𝐑𝐄𝐋𝐈𝐆𝐈𝐎𝐍 ✞

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Lotte's view.

Nublado.

Meu dia havia começado nublado e com uma chuva barulhenta que ecoava por todos os lugares dentro daquela igreja, estava frio e todas as minhas irmãs se encontravam na cozinha; preparando chá e aprontando as coisas para nosso pequeno almoço de sempre. Megan se ajeitava ao meu lado enquanto comia uma cenoura e eu sabia que ela estava me observando no momento em que se sentou na cadeira.

Parecia ansiosa e eu não gostaria de falar sobre assassinatos por hoje.

Meu estômago revirava apenas de lembrar o que havia acontecido há duas noites atrás e a sensação que meu corpo se tomava cada vez mais me fazia sentir ânsia de mim mesma; era confuso acima de tudo.

– Lotte, está quieta desde o incidente com seu joelho.- Escutava a cenoura sendo quebrada com os dentes enquanto mastigava rapidamente.

– Não é nada, apenas estou falando com Deus.- Menti, continuando a cortar os legumes que iriam para a deliciosa sopa que irmã Rosa preparava em todos os dias nublados.

Em um movimento brusco, senti minha saia ser levantada até o joelho, reagi a abaixando com mais rapidez ainda.

– Só queria ver se está melhor.- Megan levantou as mãos em rendimento, ainda segurando a cenoura.

Ela não poderia ver nada debaixo daquela saia, havia marcas em meu corpo que se escondiam debaixo do tecido que ninguém poderia ver, nem imaginava essa situação. Me peguei olhando para o espelho e entre minhas pernas e na barriga haviam marcas roxas e verdes expostas por minha pele, mordidas que marcaram e que ainda estão doloridas; me sinto inteiramente dolorida e nem sei se considero essa dor como física.

Em meio aos meus pensamentos, mal percebi a pequena dor que me tomou quando passei a faca de cozinha entre meus dedos. Os segurei com força e pude observar Megan se levantando com rapidez para agarrar uma toalha. A ardência percorreu todo meu corpo enquanto fechava meus olhos com força para tentar ignorar a dor até sumir.

Até sentir um calafrio percorrer em minha espinha e a ardência piorar.

O cheiro amadeirado tomou conta da cozinha e as irmãs pareciam olhar diretamente para mim, que se encolhia e apertava a toalha entre os dedos de minha amiga com força mas por poucos segundos, consegui perceber que não estavam olhando para mim e sim, atrás de mim.

– Logo cedo se machucando, irmã Charlotte?.- Me virei aos poucos até observar a sombra da figura que estaria me atormentando há dias sem parar, aquele homem.

– Foi um acidente.

Sem perceber ou ter tempo para relutar, meu pulso foi segurado e seus dedos deslizaram pela toalha que agora estava com manchas de sangue. Eu poderia mentir e dizer que foi um movimento cauteloso mas conseguia sentir os ossos do meu pulso serem praticamente esmagados por sua mão naquele momento, ele parecia atormentado, pensativo até demais mas nenhuma palavra saiu de sua boca. As irmãs se aproximavam com certa preocupação, o que era nítido e suas expressões pareciam mais calmas ao observar Charlie, talvez por confiança e eu não confiava em um mísero fio de cabelo do sujeito.

Ele me assombrava, arrepiava cada centímetro do meu corpo e me mantinha como se eu fosse sua presa e todos aqueles sentimentos confusos pareciam borbulhar dentro de mim, previam uma sensação de catástrofe natural que assolava todo meu ser e minha alma que jurei para todo sempre ser dedicada à apenas um homem, o Espírito Santo.

E mesmo que não pudesse escutar sua voz, sabia que estaria lá comigo...certo?

O rosto de Padre Charlie se tornou mais sério, se aproximando para que pudesse enrolar um pequeno pedaço de papel em meu dedo e sem dirigir uma palavra para mim, olhou para as irmãs por um tempo e logo se retirou; o que causou alguns cochichos ao redor da cozinha dizendo que o homem acordara de mau humor.

Observei meu dedo enfaixado por um tempo e logo depois olhei para baixo como se minha grande saia fosse invisível, sentindo meus joelhos arderem.

– Charlotte, vou atrás dele para mostrar minha matéria; tudo bem?.- Irmã Megan encarou o corredor onde Padre Charlie havia sumido com um sorriso lateral e assim desapareceu junto a ele.

O que me causou um peso em meu peito que não compreendia de forma alguma mas sabia que a sensação era sufocante.

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Acho interessante o formato de postar dois capítulos na mesma madrugada, espero que estejam gostando de Devour 🫵🏻

𝐃𝐄𝐕𝐎𝐔𝐑 ✞ 𝐂𝐡𝐚𝐫𝐥𝐢𝐞 𝐌𝐚𝐲𝐡𝐞𝐰 Onde histórias criam vida. Descubra agora