Quatro

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          Olho para todas as direcções à procura de algum esconderijo. Não queria ir embora, uma vez que sinto a necessidade de retirar todos estes pensamentos negativos de cima de mim,  como também libertar algumas lágrimas presas nos meus olhos. Não consigo fazer isso em qualquer outro lugar devido ao barulho intenso dos carros, de pessoas a falar e de obras. Este é o único lugar em que o único barulho é o som dos pássaros e da água da cascata a cair no lago, sons esses relaxantes para mim. Agora, com alguém aqui presente, não sei como irei ter um espaço para mim mesma e para recuperar de situações menos boas da minha vida.

-Hey.- oiço uma voz e olho para o local onde vi aquela pessoa e um rapaz, por volta dos seus dezoito anos de idade, a olhar para mim com um sorriso na cara.

         Recuo um pouco, embora a minha verdadeira vontade seja correr para fora dali. Até poderia correr, se não fosse as dores que ainda sinto nas minhas pernas depois de tantos pontapés daquelas raparigas. Eu sinto medo. Medo que este espaço seja ocupado por este rapaz e pelos seus amigos. Medo de perder para sempre esta clareira e que tenha de aguentar esta dor interior até ao fim da minha vida. Afinal, o que serei eu sem este meu refúgio onde passei metade do tempo em que estive nesta cidade?

-Não precisas de ter medo, eu não te vou fazer mal.- diz e solta uma pequena gargalhada.

          Aproximo-me um pouco mais dele. Eu tenho de ultrapassar este medo. Ele não irá fazer nada de mal comigo, apenas aquelas raparigas o fazem. Preciso apenas de respirar fundo e acalmar um pouco a minha pulsação.

-O-olá.- digo, engasgando-me um pouco na minha própria saliva.

          Sento-me no sítio onde me encontrava em pé e retiro a mochila das minhas costas. Observo a cascata e para o pequeno lago, onde a água cai com enorme força. Poderei não estar sozinha, mas pelo menos poderei tentar com que esta dor acabe com apenas esta imagem tão simples, mas tão importante para mim. É algo que acalma o meu interior e faz com que alguns dos meus problemas desapareçam da minha cabeça como por magia. Mas, hoje, essa imagem não está a resultar. Talvez por ter este rapaz aqui presente ou talvez por não conseguir parar de sentir a dor espalhada pelo meu corpo. Hoje, sem dúvida, foi o dia em que a dor apoderou-se do meu corpo por completo.

-O que é que te aconteceu?- oiço uma voz vinda da minha esquerda e olho nessa direcção, reparando que aquele rapaz mudou de lugar para ficar a meu lado.

-Porque perguntas?- pergunto, olhando de novo para aquela magnífica imagem à minha frente.

-Tens a cara cheia de nódoas negras, para não falar das feridas que tens na sobrancelha e no lábio.

          Inspiro e expiro profundamente. Nunca contei a ninguém sobre aquelas raparigas. Inventava sempre algo, como ir contra uma porta ou cair. Mas tenho impressão que este rapaz não irá acreditar em nenhuma desculpa que tenho na cabeça. Estas desculpas seriam aceitáveis se não fossem as nódoas negras. Elas dão a ideia de socos e não de uma queda ou de uma ida contra uma porta. Mas eu não quero contar a verdade para um completo desconhecido. Nem à minha própria mãe eu disse, quanto mais a este rapaz que nem eu sei o nome.

-Bullying? – oiço-o a perguntar e coloco a minha cabeça por entre as minhas mãos, numa tentativa de esconder a minha cara onde algumas lágrimas já se encontram a escorrer pelas minhas bochechas.

          Não aguento esconder as minhas emoções para sempre. A guerra entre a dor e a minha força interior acabou, ganhando uma dor vitoriosa. E com essa vitória as lágrimas presas nos meus olhos foram soltas e a dor do meu corpo aumenta imenso. Apetece-me gritar, mas a minha boca apenas abre para deixar passar alguns soluços. Esta sensação é nova para mim, como também dolorosa. E eu apenas quero que esta acabe para eu me ir embora para casa onde poderei chorar sem estar alguém a olhar para mim.

-Tu estás bem?- diz e sinto a sua mão sobre o meu ombro esquerdo. Eu assinto, numa tentativa de ele me deixar em paz. -Não me parece que o estejas. Tu estás a chorar.

-Eu estou óptima.- digo por entre soluços ao mesmo tempo que limpo as lágrimas que ainda saem dos meus olhos como também aquelas que tenho a escorrer pelas bochechas.

-Não vale a pena mentires. Uma pessoa não chora por nada.

    Ignoro aquilo que ele disse. Eu não quero a sua atenção. Eu quero estar sozinha e neste momento esse desejo parece impossível. Desde a minha mudança para esta cidade que fiquei sozinha e, agora, quando preciso urgentemente disso, isso não acontece. Quando cheguei eu precisava de ajuda sem ser vinda da minha mãe e, quando aprendo a viver sem ela, este rapaz aparece de lado nenhum e tenta perceber o que está a acontecer comigo. Se calhar ele pensa que está a ajudar, mas na verdade ele apenas está a piorar a situação em que me encontro.

    O som de um toque de telemóvel estraga o momento de silêncio que estava haver. Olho para a minha mochila e retiro de lá o meu telemóvel onde o nome "Mãe" se encontrava em letras grandes. Eu desligo a chamada e levanto-me rapidamente. Ela já deve saber que eu não estou na escola, talvez seja por isso que tenha ligado. Mas se eu aparecer assim à sua frente vou ter de lhe contar tudo o que aconteceu e se eu o fizer poderei sair daquela escola e desta cidade, coisa que não quero fazer devido a este meu refúgio que me ajuda nos meus maus momentos.

-Eu tenho de ir.- digo num sussurro ao mesmo tempo que coloco a mochila nas minhas costas.

-Oh, ok.- diz e eu olho para ele vendo-o a olhar para mim confuso.- Já agora, sou o Harry.

-Elisabeth.- digo antes de desaparecer por entre as árvores a passo apressado, numa tentativa de chegar o mais cedo possível à escola onde poderei levar um sermão vindo da minha mãe.

Waterfall |h.s|Onde histórias criam vida. Descubra agora