Parando para refletir.

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Sara se levantou da cama e caminhou até o guarda-roupa, abrindo as portas com um suspiro. Enquanto seus olhos percorriam cada peça, nada parecia adequado. O que antes adorava, agora parecia sem graça, apagado. No final, decidiu optar pelo clássico: um vestido preto justo, básico e infalível.

Ela colocou o vestido sobre a cama e foi direto para o banheiro, pronta para um banho relaxante. A água quente deslizava pela sua pele, dissipando o estresse do dia. Depois de se sentir renovada, saiu do chuveiro envolta em um roupão macio, com os cabelos ainda úmidos. Ao abrir a gaveta de lingerie, hesitou por um momento ao pegar uma peça azul-marinho, mas logo mudou de ideia. “Por que não?” pensou. Pegou um conjunto de lingerie rendada preta, que combinava perfeitamente com o visual que estava planejando.

Depois de se vestir, arrumar o cabelo e fazer a maquiagem, Sara se olhou no espelho. O vestido justo abraçava suas curvas de maneira impecável, com o tecido brilhante capturando cada reflexo de luz, conferindo-lhe um ar sofisticado. As mangas longas adicionavam uma elegância sutil, enquanto o decote discreto equilibrava o glamour do conjunto. Cada detalhe parecia feito sob medida para noites especiais, como essa.

Sua maquiagem estava suave, realçando suas feições de forma natural, mas suficiente para que não passasse despercebida. Com o look completo, pegou sua bolsa sobre o sofá, verificando se os documentos, a carteira, o telefone e o dinheiro estavam dentro. Pegou as chaves do carro e desceu as escadas.

Ao entrar na sala, encontrou seu pai sentado no sofá, com um olhar curioso.

— Vai sair? — perguntou ele, levantando os olhos do jornal.

— Sim, só vou dar uma volta, respirar novos ares — respondeu Sara com um sorriso tranquilo.

— Tenha juízo — disse ele, lançando um olhar protetor. — Não faça nada que eu não faria.

— Claro — respondeu ela, com um aceno despreocupado antes de sair.




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Sara destrancou o carro, jogou a bolsa no banco do passageiro e ligou o motor. Enquanto dirigia pelas ruas do asfalto bem pavimentado, as luzes da cidade brilhavam ao seu redor, refletindo o conforto de uma realidade que ela sempre conheceu. O som suave do rádio tocava uma música familiar, e tudo parecia em ordem, organizado. A vida no asfalto era previsível. As ruas limpas, os edifícios bem cuidados, as lojas com vitrines iluminadas.

Mas à medida que se aproximava do Dendê, tudo começava a mudar. As ruas se tornavam mais estreitas, e o asfalto bem cuidado dava lugar a becos mal iluminados e calçadas esburacadas. O contraste entre os dois mundos era gritante, quase como atravessar uma fronteira invisível. As casas simples, muitas delas inacabadas, se empilhavam colina acima, formando um mosaico de concreto que, de certa forma, refletia a luta diária das pessoas que ali viviam.

Sara parou o carro em um terreno improvisado para estacionamento, com algumas pedras espalhadas pelo chão, e desligou o motor. Enquanto esperava por Wilbert, ela olhou ao redor e percebeu o barulho de risos e conversas, o som da música alta vindo de várias direções, misturando-se ao ambiente. Havia uma energia vibrante ali, algo que contrastava com a frieza organizada de sua própria vida.

Ela se encostou no carro, pegou o celular para ligar para Wilbert e o avisar que já tinha chegado. por um momento, observou as pessoas ao redor. Crianças brincavam nas ruas tarde da noite, e um grupo de jovens ria alto perto de uma lanchonete improvisada. Mesmo em meio à simplicidade, havia um senso de comunidade, uma força que Sara raramente via nas festas e encontros da alta sociedade que costumava frequentar. Lá, tudo era sobre aparências, sobre quem tinha mais e quem poderia exibir melhor. Aqui, as pessoas não tinham muito, mas compartilhavam o que tinham. Sara sentiu algo quase desconfortável ao perceber como sua vida parecia distante daquele mundo, como se ela fosse apenas uma visitante temporária em um universo que sempre foi deixado de lado pela sociedade.

Ela pensou em como, durante sua infância, raramente ouviu falar sobre lugares como o Dendê. Sua escola, seu círculo social, seus pais — todos viviam num isolamento confortável, ignorando o que acontecia nas periferias. Aqueles que moravam ali pareciam esquecidos, invisíveis, exceto quando viravam manchete em noticiários sensacionalistas. Agora, estando ali, Sara não pôde evitar se perguntar como era viver assim todos os dias. Como era ser ignorado, deixado à margem, enquanto o restante da cidade seguia sua rotina luxuosa e indiferente.

"Como eles conseguem sorrir assim?", pensou, ao observar um grupo rindo enquanto dividia uma cerveja. O sorriso em seus rostos parecia sincero, real, uma felicidade nascida de pequenas alegrias. Sara percebeu que, apesar das dificuldades, havia uma riqueza naquela realidade que o dinheiro não podia comprar: a autenticidade.

Enquanto refletia, o telefone vibrou em sua mão. Wilbert estava ligando novamente.

— Já tô descendo, princesa. Dois minutos — disse ele, sua voz carregada pela batida da música ao fundo.

Sara desligou, ainda imersa em seus pensamentos. Ela percebeu que a diferença entre sua vida e a das pessoas que viviam ali não era só material, mas também emocional. O que era realmente importante? O que a sociedade valorizava? Ela própria fazia parte desse ciclo de indiferença? Essas perguntas começaram a ecoar em sua mente, junto com a batida distante da música que agora preenchia o ar à sua volta.








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Oi pessoal, autora aqui.
Como vocês estão?
Passando aqui só pra avisar que o primeiro capítulo da fanfic do radinho já foi postado. Ficaria muito grata se vocês dessem uma olhadinha lá também, se chama: O outro lado da fé.


Obrigado pelo apoio, beijos da autora.

Impuros - Nossa Liberdade.Onde histórias criam vida. Descubra agora