XVII - Taça quebrada

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JOHNY



Uma luz fraca para uma lamparina, os móveis eram poucos e escassos: uma mesa pequena com uma cadeira solitária ao lado, uma prateleira pendente na parede, e, no centro do cômodo, uma única cama de madeira rústica com um colchão. A visão solitária me fez erguer uma sobrancelha. Taehyung entrou logo atrás de mim, os passos cuidadosos no chão rangendo sob o peso.

Senti seu olhar seguir o meu até a cama, e depois voltar para mim, quase com uma pontada de diversão. Ele se recostou casualmente contra a parede, os braços cruzados, observando-me em silêncio.

- Só tem uma cama. Se importa de dividirmos essa noite?

Por um segundo, hesito, como se considerasse outra opção. Mas, por fim, encolho os ombros assentindo,

- Cada um no seu lado. - completei, deixando clara a minha posição enquanto apontava para a metade do colchão.

- Não vejo nada mais justo do que isso. - Ele abriu um sorriso.

Quando finalmente se deitou no lado oposto, pude manter uma distância cuidadosa. Ouço sua respiração ritmada, como se a proximidade entre nós fosse o menor dos seus problemas, enquanto o mesmo ruído não me parecia tão simples de ignorar.

Eu não quero sair por aí julgando ninguém mas o Taehyung tem muita bagagem emocional. Deveria ser diagnosticado com ETGRP - Estresse pós-Traumático de Gente Rica e Privilegiada. Esses 10 ou 20% parte da sociedade que não tem que se preocupar com coisas básicas, como comida, roupas, transporte, ser baleado pela polícia após ter arremessado uma pedra no carro soando o alarme pela madrugada.

Todos temos problemas, mas ninguém se importa. Não passamos de meros narcisistas chatos que se preocupam com o próprio umbigo.

Com tudo o que aconteceu na vida dele, quero dizer, a situação toda deixaria qualquer pessoa fora dos trilhos. Não tá bonito para o lado de cá.

É natural da natureza humana achar dor em qualquer situação relativamente ruim.

Minha mãe também se separou, mas não houve traição com meu pai em vida. Bom, teve aquela vez que ela apareceu dobrando a esquina com o dono do lava-rápido, mas nada aconteceu. Eu nem posso dizer que foi uma traição, afinal, eu não vi nada. Taehyung deve ter remorso até hoje... Foram oito andares, pode-se ter uma morte instantânea desse jeito, não do tipo bonito, uma morte glamourosa, não. Depende do prédio. De outro ponto de vista poderia ser interessante. Por que minhas mãos não param de tremer?

O sol da manhã estava começando a aquecer o campo aberto, mas o ar ainda carregava uma leve brisa fria. O perfume da terra úmida e das vinhas começava a se misturar com o cheiro suave de vinho que pairava pelo lugar. Observando o horizonte, vi uma fileira de parreiras bem organizadas e, mais adiante, uma casa rústica, daquelas que parecem ter absorvido décadas de histórias em suas paredes desgastadas. Tudo parecia ser uma pintura bucólica, uma calmaria quase incômoda em contraste com o ritmo de vida que conheço.

Taehyung estava ao meu lado, parecendo mais atento à conversa de sua família do que ao próprio ambiente. Sua expressão era distante. Os Kims discutiam intensamente sobre qual seria o vinho perfeito para a cerimônia de casamento de Hyuna. Cada um defendia um sabor, uma safra, uma memória particular ligada ao vinho ideal. Para eles, escolher o vinho parecia ser a decisão mais importante do dia - ou talvez da vida.

- Como alguém consegue tomar vinho a essas horas da manhã? - murmurei baixo.

- Estamos em uma vinícola, Johny. Nunca recebeu um carro de luxo às onze da manhã? - ele respondeu, com um sarcasmo que parecia ainda mais denso naquele ar matinal.

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⏰ Última atualização: Nov 03 ⏰

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