AS TOCHAS DO ACAMPAMENTO cintilam como se também lutassem para permanecer acesas sob o vento cortante. Suas chamas lançam sombras inquietas, dançando de forma irregular pelas tendas e barricadas improvisadas. O cheiro de madeira queimada mistura-se ao aroma metálico do frio, enquanto a neve soprada pelas rajadas teima em invadir os espaços abertos. O tecido das barracas estala como açoites, cada som ecoando como um grito abafado de guerra.
Eu estou sentada à cabeceira da mesa principal, envolta em um casaco pesado que pouco faz contra o gelo que parece nascer dentro de mim. Ao meu redor, os lordes vociferam em discussões acaloradas, suas vozes fundindo-se em uma cacofonia que, para mim, não passa de um ruído distante. Falam de estratégias, mapas e alianças, mas cada palavra parece tão distante quanto o calor de uma fogueira esquecida.
Minhas costas estão eretas, minhas mãos pousam sobre a mesa com a calma que se espera de uma rainha. Mas por dentro, eu sou uma tempestade de gelo capaz de matar qualquer um. A cada frase lançada, a cada olhar que busca aprovação, o peso das decisões que precisa tomar aperta como uma corrente invisível ao redor do meu pescoço. Eu sou o eixo de tudo, e, ao mesmo tempo, uma engrenagem à beira de quebrar.
Por um instante, o mundo parece prender a respiração. O tempo para, suspenso em uma tensão palpável. Então, rompe-se o silêncio. Um rugido. Ele não é humano, nem deste mundo. Thalindra. O gelo nas montanhas ao redor responde com um estalo profundo, como se a terra tivesse medo de contradizê-la. Fecho os olhos, sentindo o chamado dela, o elo entre nós vibrando em meu peito como um fio de seda tensionado ao limite. Thalindra não é apenas uma Glacithor, ela é parte de mim. E, ultimamente, eu sinto que ela duvida de minha força, como se estivesse à espera de algo que nem eu sei se poderei oferecer.
O silêncio que segue o rugido é quebrado apenas pelo barulho de uma garganta sendo limpa. Um dos lordes, o mais ousado – ou talvez o mais tolo – inclina-se para frente, forçando um tom que oscila entre respeito e insolência.
— Majestade, a vossa graça parece... ausente esta noite.
A lâmina afiada do meu autocontrole reluz, brilhando como aço prestes a ser desembainhado. Não respondo de imediato. Deixo que o peso do silêncio se arraste entre nós, tão cortante quanto o frio lá fora. Quando finalmente abro os olhos, o gesto é calculado – lento, deliberado. Meu olhar encontra o dele com uma precisão gélida, como uma flecha atingindo o alvo.
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Hydrazar
FantasyEm Thalador, um reino que ainda lambe as feridas da devastadora Batalha dos Syndarion, ocorrida há mais de 300 anos, os vestígios de destruição são onipresentes. Os mestres da água e seus temíveis dragões de gelo, os Glacithor, foram supostamente ex...