Epílogo.

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Epílogo: A Sombra que Permanece

O céu acima de Ravka estava limpo pela primeira vez em séculos. Onde antes a Dobra se estendia como uma ferida aberta na terra, agora havia apenas um vazio imenso, como um campo devastado após uma grande tempestade. Os volcras haviam desaparecido com a queda da escuridão, e o silêncio que restava era tão profundo quanto inquietante.

Benjamin Starkov permanecia no limite daquele espaço vazio, olhando para o horizonte como se buscasse algo que não sabia se queria encontrar. Ao seu lado, Zoya estava em silêncio, os braços cruzados enquanto observava os primeiros sinais de reconstrução no oeste de Ravka. Trabalhadores já começavam a atravessar o antigo território da Dobra, limpando os escombros e reconstruindo pontes destruídas há gerações.

— Você deveria voltar ao Pequeno Palácio. O Rei está esperando — disse Zoya, finalmente quebrando o silêncio.

Benjamin não respondeu imediatamente. Sua mente estava longe, perdida em pensamentos sobre o sacrifício de Evie e o vazio que sentia desde então.

— Parece errado — ele disse finalmente, a voz baixa.

Zoya arqueou uma sobrancelha.
— O quê? O silêncio?

Benjamin assentiu, seus olhos fixos no horizonte.
— Não deveria ser assim. A Dobra caiu, mas algo ainda está errado. Posso sentir.

Zoya suspirou, balançando a cabeça.
— Talvez seja a culpa, Benjamin. Você fez o que precisava ser feito. Nós todos fizemos. Mas nada disso é fácil de aceitar.

Ele não respondeu. O peso das palavras dela era verdadeiro, mas havia algo mais. Algo que ele não conseguia colocar em palavras.

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Naquela noite, o Pequeno Palácio estava mais calmo do que nunca. A festa organizada pelo Rei havia terminado horas antes, mas as memórias ainda pesavam no ar. Benjamin estava sentado sozinho na biblioteca, cercado pelos livros antigos que antes haviam sido sua única fonte de esperança. Agora, eles pareciam vazios.

Ele abriu um dos manuscritos, um que continha detalhes sobre os amplificadores de Morozova. A imagem do Pássaro de Fogo, desenhada com precisão, parecia observá-lo. Ele passou os dedos sobre o desenho, pensando em Evie e no sacrifício que ela havia feito.

Uma página estava rasgada, como se alguém tivesse removido uma informação crucial. Isso o fez franzir a testa.

Foi quando ele sentiu algo. Uma presença.

A luz na sala pareceu vacilar por um momento, e o ar ficou frio. Benjamin olhou ao redor, mas não viu nada. Ainda assim, havia algo ali. Ele podia sentir.

Então, uma voz ecoou na escuridão, baixa e quase inaudível:
— Você realmente acha que acabou?

Benjamin se levantou, sua magia instintivamente brilhando em suas mãos.
— Quem está aí?

A voz não respondeu, mas ele sabia exatamente de quem era. Kirigan.

As sombras na sala pareciam se mover, dançando na periferia de sua visão. Mas, quando ele piscou, tudo voltou ao normal. O silêncio retornou, mas o arrepio na espinha de Benjamin permaneceu.

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Dias Depois

Os rumores começaram a circular por Ravka. Vilas ao norte do antigo território da Dobra relataram o desaparecimento de pessoas e estranhas figuras nas sombras. Alguns acreditavam que eram apenas superstições, medos antigos que se recusavam a desaparecer mesmo após a queda da Dobra. Mas outros sabiam que havia algo mais.

Benjamin recebeu a notícia diretamente de Nikolai, que havia retornado de uma patrulha no norte.
— Você viu os relatórios? — perguntou Nikolai, jogando um pergaminho sobre a mesa diante de Benjamin.

Ele o abriu, lendo rapidamente. Desaparecimentos em vilas próximas. Sinais de criaturas de sombras. Relatos de um homem com olhos escuros comandando figuras misteriosas.

— Não pode ser verdade. — Benjamin disse, mas sua voz estava hesitante.

— Você sabe que é. — Nikolai cruzou os braços, inclinando-se sobre a mesa. — Kirigan sobreviveu. Ele está se reagrupando.

Benjamin fechou os olhos, sentindo o peso daquelas palavras. Ele sabia que Nikolai estava certo. A batalha contra Kirigan não havia terminado. E, desta vez, Ravka poderia não estar preparada.

— Ele está ferido. Vulnerável. Mas isso não vai durar muito. — disse Nikolai, sua voz grave. — Nós precisamos nos preparar, Benjamin. Você precisa se preparar.

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O Último Vestígio de Esperança

Mais tarde naquela noite, enquanto Benjamin caminhava pelos corredores do Pequeno Palácio, ele parou na entrada do quarto de Evie. A porta estava entreaberta, e o quarto permanecia intocado, como se ela ainda estivesse lá. Ele entrou, passando os olhos pelas lembranças de sua amiga: pequenos objetos, cadernos e roupas dobradas com cuidado.

Sobre a mesa, havia um pedaço de papel dobrado, que ele nunca tinha visto antes. Ele o pegou, reconhecendo a caligrafia de Evie.

*"Benjamin,
Se você está lendo isto, significa que eu não estou mais aqui. Quero que saiba que fiz minha escolha, e que ela foi minha. Não carregue isso como uma culpa — carregue como um lembrete de que você é mais forte do que pensa. E que Ravka é mais forte com você como seu protetor.

Quando as sombras voltarem — e elas voltarão —, lembre-se: a luz que você carrega não é apenas sua. É de todos nós. Você nunca estará sozinho.

Evie."*

As lágrimas que Benjamin tentou segurar durante toda a semana finalmente caíram. Ele guardou o bilhete com cuidado, fechando os olhos e respirando fundo.

O sacrifício de Evie era o motivo pelo qual ele continuaria. E, enquanto as sombras cresciam novamente em Ravka, Benjamin sabia que teria que lutar mais uma vez.

A guerra não havia terminado. Ela estava apenas começando.

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Fim.

Eᥴᥣιρ᥉ᥱ • Grι᥉hᥲ᥎ᥱr᥉ᥱOnde histórias criam vida. Descubra agora