Dois Corações, Uma Válvula

33. Decreto

Aviso: Conteúdo gatilho. Violência.

Linguagem inapropriada.

Leia por sua conta e risco.

Alerta Vermelho: Violência Infantil.

Ellie Bridge

Ainda estamos em Winter Nights. O Canto de Lyra parece hesitar em prosseguir viagem, já que na noite passada, uma onda poderosa, impulsionada pela fúria do mar, atingiu o timão do navio, danificando-o. Esse contratempo deixou o Capitão Fletcher ainda mais furioso ao amanhecer, intensificando ainda mais seu já sombrio humor após minha invasão em sua privacidade, na minha tentativa de desvendar a origem de sua sede de vingança. A tripulação, inquieta, percorria o convés de um lado para o outro, sentindo o peso de uma irritação ainda mais intensa do capitão.

Eu buscava uma maneira de ajudá-los, mas me sentia completamente perdida sobre o que fazer ou por onde começar. A noite anterior havia sido um tormento, e eu mal consegui dormir, passando horas chorando em silêncio. Pela manhã, Thomas percebeu meus olhos inchados e perguntou se algo havia acontecido. Tentei disfarçar, inventando que a bebida da noite passada não tinha me feito bem, mas ele não pareceu acreditar. Pierre, por sua vez, captou de imediato a falsidade em minha desculpa, pela forma que me olhou quando tentava descobrir o que eu escondia.

Não quero que ninguém saiba que estive na cabine do Capitão, xeretando ainda o que não devia. Pois só de pensar nisso, sinto raiva de mim mesma. Eu não deveria ter entrado na cabine, mesmo sentindo aquela sensação estranha que me atrai como a força de uma onda que se choca contra as rochas, eu deveria ter voltado ao dormitório quando percebi que ele não estava em seu quarto. Ou melhor, não deveria nem ter cogitado em pedir desculpas sendo que foi ele que começou a briga em Nightclub, quando lançou o machado contra o retrato do meu pai com a intenção de me assustar.

Meus dedos apertam com força sobre a borda do navio encarando o imenso azul do mar, percebendo o quanto fui ingênua em acreditar que finalmente poderia resolver as coisas com ele. No entanto, vejo que isso está bem longe disso acontecer.

Eu detesto cada sensação que ele desperta em mim quando estamos próximos, quando nossa respiração parece se alinhar, e a cada passo que ele dá, eu tento desviar o olhar para não me deixar levar por esses sentimentos confusos, que estão se tornando, aos poucos, a minha agonia. Pois percebo agora que Fletcher não era o tipo de cara que uma garota deveria se apaixonar. Ele é um babaca.

- O que quebrou? - Ouço Liam perguntar para Jason, que verificava o timão do navio bastante nervoso.

Jason parece descobrir o problema, quando xinga um palavrão, fazendo meus olhos se arregalar. Se eu dissesse algo assim, principalmente na frente da Sra. Pulmann, ficaria de castigo o dia inteiro, tendo que recitar um poema, feita pela mesma, de como se deve ter boas maneiras.

- Os cabos de aço. - Jason diz por fim, irritado, dando um chute na ferramenta do chão, me fazendo estremecer com o impacto quando a mesma voa para perto do corrimão de Canto de Lyra.

Aquela cena me fez lembrar da noite passada, quando Jason chutou a garrafa do chão, arremessando contra o baú, antes de me colocar para fora aos gritos da sua cabine.

Meu corpo estremece, mas o que me faz fraquejar é quando sinto seu olhar queimar sobre mim, ainda parecendo bravo sobre o que aconteceu. A ideia era ignorar ele, entretanto não quero que ele pense que sou uma garotinha indefesa que pode me assustar facilmente. Em vez disso, devolvo um olhar firme, a mesma expressão desafiadora que aprendi observando o meu pai durante anos.