Aquela semana passou tranquila e rapidamente, exceto pela chuva incessante e os trovões constantes. A rotina de Maeve estava estranhamente tranquila, deixando de lado a parte em que ela ainda não descobrira de onde Ioome, o pequeno cachorrinho que ela adotara, fora chegar até ela.
Quando ela voltou da escola naquele dia, o pequeno cachorro de pêlo felpudo e marrom estava dentro da caixa de papelão onde Maeve o deixara antes de ir para a escola, esperando-a obedientemente.
- Quem é você, hein? - ela perguntara, assim que chegara da escola. O pai ainda trabalhava. - Como veio parar até aqui?
Ioome apenas lambeu o rosto dela.
- O que eu faço com você?
Por um momento, ela cogitou largar o pequeno cachorro de íris vermelhas em um abrigo para animais abandonados, mas assim que teve esse pensamento, algo acendeu em seu interior, algo que dizia para que ela não tentasse se livrar do animal.
Quem sabe, talvez, ele fosse um presente de seu pai?
Ela não sabia. Resolveu então esperar o pai chegar em casa para perguntar ela mesma.
O resto da tarde fora bastante divertido.
Ela brincara por horas com Ioome sem nem parar para descansar por um só segundo.
Eles correram em círculos pelo quintal, jogaram frisbee e outros diversos jogos.
Por volta das 19:00, Richard finalmente chegou do trabalho.
O pai de Maeve parecia exausto, assim que chegou em casa tirou o jaleco e se jogou no sofá, para relaxar.
Maeve estava no quarto e desceu as escadas rapidamente, com Ioome em seus braços.
- Pai? - ela chamou, sem rodeios. - Encontrei esse cachorro na rua hoje, e ele tem uma coleira com meu nome nela. Você que o adotou para mim?
Richard levantou os olhos cansados e olhou para a filha, confuso. O cabelo loiro estava bagunçado, como se não tivesse sido penteado há semanas.
- Não - ele disse. - Nunca vi este cachorro na vida.
- Estranho - Maeve disse, acariciando o pêlo marrom e felpudo de Ioome. - Então por que ele tem uma coleira com meu nome escrito nela?
- Não faço a mínima ideia.
Ela balançou a cabeça e ficou de pé por alguns instantes, esperando que Richard dissesse algo a mais.
Depois que ela percebeu que o pai não falaria mais nada, ela tomou a dianteira:
- Então, será que eu...
- Sim, você pode ficar com ele - Richard dissera, como se não quisesse estar tendo aquela conversa com a filha.
Maeve ficou feliz pelo pai ter dado permissão, mas ao mesmo tempo se sentiu desconfortável e magoada ao ouvir o tom de voz, uma mescla de distância, frieza e negligência, era quase como se ele não se importasse com nada que acontecia ao seu redor.
- Obrigada - Maeve disse secamente e virou as costas para ir para o quarto novamente, mas quando ela estava prestes a subir as escadas em direção ao segundo andar, o pai a chamou.
- Maeve, volte aqui - ele falou, a voz cansada. Richard se inclinou para a frente no sofá e pôs o rosto entre as mãos.
Maeve sentou no sofá ao lado do pai, e ela virou no assento para que pudesse ficar de frente para ele.
- O que foi? - ela perguntou, sem emoção.
- Me desculpe - Richard disse, olhando para a tapeçaria, a lareira, a mesinha de centro, para todos os lugares, menos para Maeve. - Me desculpe se não estou sendo o pai que você merece ter. As coisas não estão fáceis para mim. Estou sentindo tanta falta da sua mãe... Não sei o que fazer.
- Está tudo bem, pai - Maeve disse, e foi sincera. Ela não podia culpar o pai por estar tão estressado. - Você está se esforçando para que fique tudo bem, é isso que importa.
- Não, não - Richard balançou a cabeça, negando. - Não, está tudo errado. Nossa vida não é mais a mesma. Tanto eu quanto você não estamos mais aguentando a ausência de Katrina. Ela é a alegria das nossas vidas, e ela não está mais aqui. Já fazem 6 meses - ele fez uma pausa. - Seis meses e não temos nenhuma pista sobre onde ela pode estar. Algumas pessoas nos fazem felizes simplesmente por estarem ao nosso lado. Mas elas também nos entristecem só por não estarem mais aqui conosco.
Maeve não sabia o que dizer, porque ela própria se sentia destruída e vazia. Seis meses eram pouco para que ela pudesse superar o que tinha acontecido com a mãe, mas agora ela entendia toda a história, ou pelo menos parte dela, e ela precisava ser forte. Não por ela, mas sim pelo pai.
- Vai ficar tudo bem. Nenhum tormento dura para sempre. Até mesmo as piores tempestades têm um fim. Eu vou cuidar de você, pai. Daqui a pouco, mamãe estará de volta.
- Isso está errado - Richard lamentou. - Eu é que deveria estar cuidando de você. - Ele olhou para Maeve agora, e colocou as mãos de cada lado do rosto da filha. - Minha menina, você cresceu tanto - Richard chorava, as lágrimas escorriam pelo seu rosto, a linda evacuação de meses de tristeza e dor. - E não estou me referindo à altura e nem nada, mas sim à sua maturidade. Você está se tornando uma grande mulher. Assim como sua mãe, você será uma heroína para alguém um dia. - Ele deu um sorriso trêmulo. - Pelo menos no momento, você já é minha heroína.
Ioome estava quieto no colo de Maeve, analisando o pai e a filha com aqueles esquisitos e charmosos olhos vermelhos.
Maeve envolveu as mãos quentes do pai, que ainda estavam ao redor do seu rosto.
- Pai, não se culpe. Eu sou testemunha de que você está enfrentando mil desafios todos os dias por minha causa, para garantir minha felicidade. Como sua filha, eu não poderia pedir mais do que isso.
- E você, meu anjo, têm se mostrado cada dia mais uma filha atenciosa, gentil, amorosa e compreensiva. Sinto muito se deixei você de lado alguma vez. Certas dores devem ser suportadas sozinhas, e eu não quis te impor mais problemas. Sei que está tão abalada quanto eu.
- Somos iguais nisso - ela assentiu.
- Não - Richard balançou a cabeça e ainda sorria, mas as lágrimas ainda escorriam pelas maçãs do seu rosto. - Você é mais forte do que eu, mais determinada. Você tem a garra de Katrina, e só agora eu posso ver a semelhança entre vocês duas: assim como sua mãe, você está disposta a abrir mão da sua própria felicidade em nome da felicidade dos outros. Você é a bondade que o mundo precisa. Como seu pai, eu não poderia estar mais orgulhoso.
Maeve apenas sorriu e aproveitou aquele momento precioso e belo ao lado do pai.
Mesmo que às vezes ele parecesse distante, ele continuava sempre presente para o que Maeve precisasse. Ele era sua única família agora, e ela iria protegê-lo de qualquer mal, angústia ou sofrimento, e o sentimento fraternal, a necessidade de proteger, era mútuo; a recíproca era verdadeira. De uma maneira ou de outra, Richard estava protegendo Maeve também.
Ele era um dos motivos por ela não ter desistido, uma das principais razões por ela estar afunilando cada vez mais nessa missão: resgatar a mãe significava trazer a alegria de volta para aquela casa.
Por ele, ela faria de tudo, qualquer coisa que fosse necessária. Ela já havia perdido a mãe, e agora tudo o que restava a garota era a proteção e o apoio que o pai lhe dava.
- Vamos deixar esses pensamentos de lado, está bem? - ela disse. - Você têm sido um pai maravilhoso, isso já basta para mim. Não precisa se sentir mal. Eu sei o que está sentindo.
Richard passou a mão pela cabeça peluda de Ioome, e o cachorrinho fez um ruído de satisfação com a garganta ao receber o carinho.
- Você está certa, como sempre - ele disse. - Se cometi erros no passado ou tratei determinados assuntos com trivialidade, tudo o que posso fazer é tentar ser alguém melhor para poder me redimir. - Maeve abriu a boca para protestar, para dizer que não era verdade, que o pai era um homem bondoso e honrado, mas ele a calou antes que ela pudesse falar. - Como pedido de desculpas e primeiro passo de reconciliação, vamos jantar fora no próximo sábado no seu restaurante favorito. Vou pedir uma folga no hospital e então iremos. Se quiser, pode chamar Joan e Brenda para nos acompanharem.
Maeve teve que conter as lágrimas de emoção que se acumulavam na sua garganta ao olhar o rosto cheio de expectativa do seu pai. Ele parecia tão determinado em se aproximar de Mave que a menina não conseguiu esconder um sorriso.
- Seria maravilhoso.
Richard sorriu aliviado e Maeve percebeu que ele estivera segurando a respiração.
- Está marcado então.
E foi assim que Maeve por fim adotou Ioome de vez e conseguiu finalmente se reconciliar com seu pai.
Eles realmente estavam precisando firmar mais um pouco a relação e se reaproximar um do outro.
Agora, deitada na cama do seu quarto ouvindo música e com Ioome deitado ao seu lado, quase dormindo, Maeve notou que a lâmpada fosforescente branca estava começando a piscar insistentemente.
Havia alguma coisa no interior da lâmpada, e o interior do objeto começou a ficar preto, como se houvesse algo vivo pulsando dentro da lâmpada.
A lâmpada não quebrou, mas ela se dividiu ao meio, quase como se estivesse engasgando com alguma coisa, até que por fim a lâmpada cuspiu de seu interior um pequeno pedaço de papel, que flutuou calmamente por uns instantes antes de cair no colo de Maeve.
Ela ficou sentada na cama e leu o papel:
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Escolhidos - Entre os Hereges e Amantes [Livro 1]
FantasyTudo o que você mais ama pode sumir em um piscar de olhos. Maeve LeBlanc levava uma vida tranquila ao lado dos pais, até que um dia a garota sofre um ataque que resulta no sumiço repentino e misterioso de Katrina, sua mãe. Depois de meses tentando d...