Capítulo 7

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Capítulo 7; Fá-lo ver

No dia seguinte, não deixei que os nossos caminhos se cruzassem. Não era, exatamente, evitá-la, mas não queria falar com ela. Durante a última noite, conseguira, finalmente, dormir mais que quatro horas, e não queria admitir que tinha a ver com ela. Não entendia bem como, mas algo no facto de ela aparentar gostar, (um pouco), de mim, fazia-me querer dormir e, de alguma forma, continuar aquela espécie de sonho. Quando acordei, pela primeira vez, de bom humor – até a minha mãe notou -, soube automaticamente que ela era a culpada. Apesar de eu dizer que ela não iria conseguir ajudar-me, fê-lo sem eu sequer me aperceber.

Quando a via a aproximar-se de onde eu estava, mesmo que a mais de vinte metros, entrava na minha sala ou fugia para a sala de convívio, para comprar outro pacote de pastilhas. Com o nervosismo dentro de mim, já tinha esvaziado um pacote de quase vinte, e eu sabia que isso não era saudável, mas não conseguia evitar. O mentol funcionava como uma maneira de me refrescar – não só o hálito, como também a mente -, como se fosse, magicamente, dizer-me o que fazer, quando ela finalmente notasse em mim e se aproximasse.

Durante o dia, tive a desculpa de ter um teste, para passar o meu bloco livre na biblioteca. Quando a vi aparecer, para requisitar um livro para a sua aula, escondi-me entre prateleiras de livros sobre História e esperei que ela se fosse embora. Percebi que ela olhou para a mesa onde eu estava e que percebeu que era eu que ali estava a estudar, mas não deu muita importância, pois tinha que voltar para a sua aula. Quando ela saiu da biblioteca, suspirei e voltei à minha mochila, com um desejo idiota de não ter sido estúpido e ter ido falar com ela, enquanto ela estava livre.

No bloco seguinte, tive o meu teste. Pensei que fosse correr pior, mas correu bastante bem. Quando acabei, apressei-me para a cantina – fiquei contente por ter forças para me apressar – e sentei-me na minha mesa habitual. A comida era tolerável, o que me facilitava a vida, tendo em conta que eu tinha sempre a vontade de ir a algum sítio qualquer comprar outra comida, ou viver das sandes das máquinas da escola. Com os fones nos ouvidos, continuei a comer – ao som de Jimi Hendrix, daquela vez -, olhando em redor, para ver se encontrava a Lucinda.

Tentei não pensar muito no facto de ela estar a usar um vestido florido que, de alguma forma, combinava com os seus olhos e o seu cabelo. Ela estava ainda mais bonita que o costume e estava a ser difícil saber se a minha mente mudara com o bom humor, ou se tinha sido mesmo ela que tinha decidido tornar-se o centro das minhas atenções, para o dia. Ao contrário das suas amigas, ela estava a usar umas sabrinas e eu não devia ter notado naquilo mas, honestamente, notei em tudo o que ela fazia. Eu não queria que ela me visse, mas eu certamente estava a vê-la.

Ela não pertencia com aquele grupo de pessoas. Pertencia junto a pessoas com mentes abertas, artísticas e livres, tal como ela. O grupo de pessoas com quem ela estava – falso, rude e demasiado focado na sua aparência – não lhe fazia jus. Não era como se eu lhe fosse fazer jus, mas sentia-me desconfortável por ela não perceber que aquelas pessoas só se preocupavam em ocultar o seu brilho natural. Enquanto comia, tudo o que conseguia pensar era em como iria falar com ela, se alguma vez ela conseguisse aproximar-se de mim. Eu iria tentar com que ela não o conseguisse, mas sabia que seria impossível aguentar mais que um dia – era a Lucinda, aquela que não desistia de mim.

- Estás sozinho? – Dei um pequeno pulo, no banco, quando a vi à minha frente.

- Foda-se, Lucinda. – Ouvi-a rir, com a mão a tapar os seus lábios. – E não acho que estejam fantasmas ao meu lado. Desculpa a desilusão.

A rapariga revirou os olhos para o meu constante sarcasmo e sentou-se à minha frente, pousando a sua mala castanha ao seu lado. Perguntei-me se ela tinha notado que eu estava, para não dizer outra coisa, especado, a olhar para ela. Talvez tenha sido por isso que ela se aproximou de mim, e eu quis bater em mim mesmo por ter denunciado o meu disfarce. Só tinha conseguido aguentar pouco mais de três horas, eu era inútil. Não estava a evitá-la, mas queria um dia só para mim, para poder observá-la sem ter a frustração dentro de mim. Estava de bom humor e não queria que uma possível discussão entre nós estragasse isso.

Como Amar um InsoneOnde histórias criam vida. Descubra agora