Capítulo Sete - Ameaças e Propostas

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   Todas aquelas últimas palavras, ditas por Serena, ocasionaram arrepios horripilantes e gélidos, que subiram por todo o meu braço.

   "O meu mundo e o seu está prestes a ruir em sangue e morte.". O que aquilo queria dizer? E por que ela se referira a si própria como "o meu mundo"? Está certo que sua espécie não era igual à minha, mas a forma como ela dissera colocava em pauta a sua tese de nós dois sermos como água e óleo: completamente diferentes, pertencentes a universos e galáxias de distância.

   Ele queria enchê-la de perguntas, mas a surpresa - e espanto - diante daquelas palavras que ela dissera por último foi tão grande que lhe tirou a voz, como se fosse dedos ágeis e fortes se fechando em volta de sua traquéia.

   -Por acaso perdeu a voz, mero humano? - perguntou Serena, com uma voz ao mesmo tempo doce e rígida, como se quisesse zombar de mim, mas não tivesse tempo para efetuá-lo.

    Olhei para ela, tentando aparentar o máximo de naturalidade.

   -Você vai me contar por que você disse que o meu mundo e o seu está prestes a ruir em sangue e morte. - digo, cruzando os braços para aparentar autoridade. Mas no fundo, tudo o que eu estava sentindo era uma vontade crescente de correr para longe de tudo isso.

   Acabo de descobrir que sereias existem, assim como acabo de descobrir que meu mundo pode acabar. Será que devia confiar em cada palavra dita por ela, ou simplesmente rotulo tudo como mentira?

   -Já vou avisando antecipadamente que não vai gostar da resposta. - disse ela, chegando mais perto e cruzando os braços sob a borda da passarela. A forma como ela me olhava transmitia uma certa curiosidade, como se fosse eu a criatura estranha entre nós. - Além do mais, não é da sua conta.

   -Se não é da minha conta... - repeti o que ela dissera por último com uma voz fina, tentando imitá-la, mas soando tão infantil quanto as ações de Clear. -... então pode esquecer a minha ajuda.

   A forma como ela fechara a cara já dizia que não gostara da forma como ele a tratou. De repente senti medo daquelas presas voltarem a crescer, como se fosse dentes de vampiro. Mas felizmente ela continuou com sua aparência mortal.

   -A história do meu povo não recai à você. Não pense que eu vá abrir minha boca e começar a lançar jatos de informações para um mero humano.

   -Eu não pedi para você falar sobre o seu... povo. - fraquejei na última palavra, sentindo algo parecido com pânico crescendo em meu peito. "Povo" era uma das palavras que definiam um conjunto de espécies. Se Serena disse que há um povo, então... - Eu só pedi para me explicar por que você disse que meu mundo vai acabar.

   Os olhos de Serena baixaram até meus pés. Ela poderia tentar uma investida contra mim; ou poderia mergulhar na água e nadar para o fundo do lago - lugar onde eu achava que ela morava -. Mas em vez de efetuar qualquer uma dessas opções, ela pareceu emergir nas ondas de sua mente, organizando seus pensamentos e tentando definir o que fazer a seguir.

   -Acho justo dizer para você apenas o necessário. - disse ela, com a voz controlada. A forma como suas emoções pareciam mudar momentaneamente me deixaram fascinado. - Até porque eu não sei de muita coisa. - ela disse a última frase em tom sussurrante. Mas eu estava excessivamente perto para ouví-la.

   -O que você disse? - perguntei, mesmo tendo entendido o que ela tinha dito inicialmente.

   -Nada que lhe interesse. - a forma rude dela parecia não entrar em contraste com sua doce beleza. - Agora, voltando ao assunto de antes... Eu aceito contar-lhe o que deseja saber, em troca de você me ajudar com o ferimento em meu braço.

Sereia - A Prisioneira Da ÁguaOnde histórias criam vida. Descubra agora